Gaudium news > Um missionário nas reduções do Paraguai do século XVII

Um missionário nas reduções do Paraguai do século XVII

Muitos se esquecem de como eram as culturas, os costumes e os cultos dos povos latino-americanos na época dos descobrimentos, e, em consequência, do papel crucial dos primeiros evangelizadores.

Missão Jesuíta de Jesús de Tavarengüe, Paraguai. Foto: Wikipedia

Missão Jesuíta de Jesús de Tavarengüe, Paraguai. Foto: Wikipedia

Redação (22/03/2023 09:32, Gaudium Press) O mandato “ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,15) não foi dirigido somente aos Apóstolos dos primeiros tempos do cristianismo. Ele também se estende àqueles que, nos séculos posteriores, têm a missão de evangelizar até os mais inóspitos lugares.

Dentre os primeiros valentes que adentraram nas florestas sul-americanas dos séculos XVI e XVII, destacou-se um sacerdote jesuíta nascido no Peru, em 1585: Pe. Antônio Ruiz de Montoya.

Ainda criança, Antônio ficou órfão. O desejo de seu falecido pai era que ele estudasse no seminário de San Martin e posteriormente se transladasse à Espanha. Entretanto, o jovem acabou ingressando na Companhia de Jesus, no ano de 1602, onde fez seus estudos e depois foi ordenado sacerdote.

Sua missão apostólica com os índios durou mais de 25 anos, nas chamadas “reduções”, em regiões que compreendem, sobretudo, às do atual Paraguai.[1] As aldeias se chamavam “reduções” porque um dos principais trabalhos dos missionários era o de “reduzir” os índios que andavam vagueando pelas rudes matas, conduzindo-os à vida social e civilizada de um pequeno povoado, onde os indígenas tinham valiosas oportunidades de formação moral, humana e religiosa.

Em virtude de seu zelo, o Pe. Ruiz de Montoya passou a ser Superior Geral das reduções da América do Sul a partir do ano 1620.

Costumes macabros

Em seu livro “Conquista Espiritual”, o sacerdote narra os diversos costumes dos índios que viviam nas terras do Paraguai, e como desenvolvia seu trabalho de evangelização e civilização, para transformar os maus hábitos dos indígenas em vivências mais humanas, de acordo com doutrina da Igreja e a própria lei natural.

Por exemplo, quando nasciam novos rebentos na tribo, os índios observavam um ritual propriamente assustador: tomavam um dos seus prisioneiros de guerra e faziam-no engordar. Quando já estava bem nutrido, este era cruelmente assassinado. Depois, todos os membros da família se aproximavam do corpo, e tocavam-no como numa espécie de oração. Terminada a “celebração”, repartiam os membros dele, distribuindo as partes entre outras famílias. Elas cozinhavam a macabra refeição com muita água, fazendo uma espécie de mingau ou papa, a qual davam de comer às suas crianças recém-nascidas, impondo-lhes com isso um nome.[2]

Dá para imaginar bem o desafio que os missionários tinham diante de si!

Para ir à Missa dominical…

Mas Deus, que jamais abandona seus filhos, também operava prodígios em auxílio de seus missionários.

Os sacerdotes das reduções ensinavam aos índios a doutrina católica. Após algum tempo, mostrava-se a necessidade da frequência às Missas dominicais. Entretanto, alguns se obstinavam em não cumprir o preceito.

Pe. Antônio conta-nos o caso de um índio que não participava das missas aos domingos, mas ficava em sua granja, enquanto todos os outros cumpriam com seus deveres de cristãos.

Estando em sua granja, como de costume, no domingo, o mencionado indígena começou a ouvir sons aterrorizantes. Eram demônios que imitavam mugidos de vacas, bois e cabras. Amedrontado, o homem correu para sua choça. Apesar de tal ocorrido, no domingo seguinte ele persistiu em suas faltas culposas à missa. E o fenômeno assustador se repetiu.

Avisado do ocorrido, o Pe. Antônio recomendou aspergir o local com água benta e colocar cruzes para expulsar os espíritos maus. Mas foi em vão, pois a causa mais profunda não havia sido acusada… Por fim, o próprio sacerdote dirigiu-se até o local onde residia o índio, e deu ordem em nome de Jesus e pelos méritos de Santo Inácio para que aqueles maus espíritos fossem embora e nunca mais voltassem àquela região. Com isso, o até então impenitente converteu-se e confessou sua falta, sendo daí em diante um cristão exemplar.[3]

Estes são alguns dos fatos presenciados pelo Pe. Antônio Ruiz de Montoya nos mais de 25 anos passados nas reduções da América do Sul. Eles nos fazem pensar na coragem e valentia destes heróis que, desprezando as comodidades de uma vida tranquila, se lançaram na perigosa empresa de formar e converter os povos originários de nosso continente.

Há quem, apesar de todos os benefícios feitos aos índios, ainda hoje acuse os missionários de violarem a liberdade deles, indígenas, e oprimirem sua cultura. Um estudo mais detido das verdades históricas que cercam os fatos da era dos descobrimentos comprova, todavia, como a verdade é bem diferente.

Por Denis Sant’ana


[1] Cf. MONTOYA, Antônio Ruiz de. Conquista Espiritual feita pelos religiosos da Companhia de Jesus nas províncias do Paraguai, Paraná, Uruguai e Tape. Porto Alegre: Martins Livreiro, 1985, p. 13-14.

[2] Cf. ibid., p. 53.

[3] Ibid.. p. 102, 103.

Deixe seu comentário

Notícias Relacionadas