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O que Bento XVI pensava sobre a sua própria morte?

Dom Piergiorgio Bertoldi, Núncio Apostólico da Santa Sé em Moçambique revela a resposta de Bento XVI àqueles que lhe perguntaram se ele tinha medo da morte e como estava se preparando para ela: “Não estou me preparando para um fim, mas para um encontro”.

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Redação (04/01/2023 13:30, Gaudium Press) Muitas coisas foram ditas sobre o Papa Emérito Bento XVI, nestes dias que se seguiram ao seu falecimento. Entre elas, merece destaque a forma branda e profunda com que se pronunciou o Núncio Apostólico da Santa Sé em Moçambique, , em sua mensagem de condolências, proferida na homilia da Missa que celebrou na Catedral de Maputo, no dia 1º de janeiro. Palavras que expressam o respeito de um filho e a saudade de um amigo.

Dom Bertoldi iniciou o seu sermão com a expressão “Queridos amigos!”, em seguida, explicou tratar-se da expressão comumente usada pelo Papa Bento XVI na abertura de suas homilias: “Uma expressão simples, quotidiana, um convite a partilhar com ele o pão da Eucaristia e a escutar juntos a Palavra de Deus. Uma expressão que nos fazia sentir acolhidos pela sua maneira calma e afetuosa de falar, ao estilo, diria o Papa Francisco, do sábio avô que mostra aos seus netos o precioso tesouro da sua experiência e da sua vida: a sua fé.”

Logo depois, discorreu sobre a importância dessa saudação, aparentemente, tão simples: “Ao mesmo tempo, ‘queridos amigos’ é uma expressão sublime, porque são as palavras de Jesus aos seus discípulos, um sinal do profundo respeito e estima que o Papa Bento XVI tinha por todos aqueles que o escutavam.”

Palavras de Bento XVI nas Missas de Ano Novo

O Nuncio deixou claro que, para preparar a sua homilia para a Missa de Ano Novo, fez uma espécie de “colcha de retalhos”, uma antologia, com trechos de vários sermões do Papa Emérito Bento XVI pronunciados nas Missas de Primeiro de Ano. Para se referir à morte do papa, lembrou as palavras dele a respeito da bênção a Aarão:

 “No primeiro dia do ano, a liturgia faz ressoar em toda a Igreja estendida pelo mundo inteiro a antiga bênção sacerdotal, que ouvimos na primeira leitura: ‘O Senhor te abençoe e te guarde! O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face, e se compadeça de ti! O Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz!’ (Nm 6, 24-26). Esta bênção foi dada por Deus através de Moisés, a Aarão e aos seus filhos, ou seja, aos sacerdotes do povo de Israel. É um tríplice voto cheio de luz que brota da repetição do nome de Deus, o Senhor, e da imagem de seu rosto. Na verdade, para ser abençoado é necessário estar na presença de Deus, receber sobre si o Nome d’Ele e permanecer no feixe de luz que parte do seu rosto, no espaço iluminado pelo seu olhar, que difunde a graça e a paz”.

 Nesse momento, Dom Bertoldi revelou o que Bento XVI pensava a respeito de sua própria morte: “O Papa Bento XVI respondeu àqueles que lhe perguntaram se ele tinha medo da morte e como se estava a preparar para ela, numa frase: Não me estou a preparar para um fim, mas para um encontro. A luz do seu olhar confirmava as suas palavras, os seus olhos brilhavam de alegria. Já entre nós, dava a impressão de estar no feixe de luz do Senhor e por isso, tal como Moisés e Aarão, as suas palavras foram sempre uma expressão de bênção.”

Agora ele vê o rosto do Senhor

Em outro momento, lembrou as palavras do Papa Bento, quando ainda era apenas o Cardeal Ratzinger, por ocasião do funeral de seu antecessor, São João Paulo II, e propôs tomá-las e dedicá-las a ele, que “agora vê o rosto do Senhor e a sua luz de perto”:

“Podemos ter a certeza de que o nosso amado Papa agora está na janela da casa do Pai, vê-nos e abençoa-nos. Sim, abençoe-nos, Santo Padre. Nós confiamos a tua amada alma à Mãe de Deus, tua Mãe, que te guiou todos os dias e te guiará agora à glória eterna do Seu Filho, Jesus Cristo nosso Senhor.”

Explicou que, com essa saudação a São João Paulo II, tão cheia de sincero afeto e aparentemente tão simples, o Papa Bento XVI estava, na realidade, citando a Palavra de Deus, contida no Salmo 112: “O Senhor, nosso Deus, que tem o seu trono nas alturas, Se inclina lá do alto, a olhar o céu e a terra”.

O Núncio lembrou o insistente apelo do Papa Bento XVI para que os homens trilhassem a via da paz, palavras que repetia, de modo especial, a cada início de ano e que continuam tão necessárias e atuais. “Para nós, muitas vezes paralisados perante a dor e a violência, o Papa Bento XVI hoje lembra que, como crentes, podemos oferecer uma ajuda inesperada, podemos com a nossa oração, ajudar todos os homens e povos.”

Referindo-se à citação das Sagradas Escrituras, feita por Bento XVI ao dizer: “O Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz!” (Nm 6, 26) ele lembra as palavras do pontífice a respeito de como Deus valoriza todas as pessoas, o que deve ser imitado por nós:

“Meditar sobre o mistério do rosto de Deus e do homem é uma vereda privilegiada que leva à paz. Com efeito, ela começa a partir de um olhar respeitador, que reconhece, no rosto do outro, uma pessoa, independentemente da cor da sua pele, da sua nacionalidade, da sua língua e da sua religião. Mas quem, senão Deus, pode garantir, por assim dizer, a “profundidade” do rosto do homem? Na realidade, só se tivermos Deus no coração, somos capazes de ver no rosto do outro um irmão em humanidade, não um meio mas um fim, não um rival nem um inimigo, mas outro eu, uma multiplicação do mistério infinito do ser humano.”

Não um fim, mas um encontro desejado

Dom Bertoldi destacou ainda que “pode ter sido na escola de Maria que o Papa Bento XVI tenha aprendido a conservar, a ponderar no seu coração, a colocar juntas coisas aparentemente tão distantes entre si. Ao explicar-nos a Palavra de Deus e o mistério da fé, ele dava a impressão de colocar juntos os elementos da humanidade e da fé de uma forma harmoniosa, fazendo-nos compreender e viver até as realidades mais complexas em palavras simples, sempre abertas ao mistério de Deus. “Na escola de Maria podemos captar com o coração aquilo que os olhos e a mente não conseguem compreender sozinhos, nem podem conter. De fato, trata-se de um dom tão grande que só na fé nos é dado acolher mesmo sem compreender tudo. E, precisamente neste caminho de fé, Maria vem ao nosso encontro, é para nós amparo e guia.”

Entre várias outras citações das homilias de Ano Novo do Papa Bento XVI, destacou o quanto ele era um homem nobre e gentil, o que foi bem pontuado pelo Papa Francisco, que externou a sua gratidão pela vida de Bento XVI: “gratidão a Deus por tê-lo dado à Igreja e ao mundo; gratidão a ele, por todo o bem que realizou, pelo seu testemunho de fé e oração, especialmente nestes últimos anos da sua vida de aposentado. Só Deus conhece o valor e a força da sua intercessão, dos seus sacrifícios oferecidos para o bem da Igreja”.

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Emocionado, Dom Bertoldi terminou a sua homilia justificando que “dizer adeus a um amigo, mesmo que este amigo seja avançado em anos, confiando-o nas mãos do Senhor, deixa-nos sempre um pouco tristes. Não neste caso, ou pelo menos não para mim. Na verdade, o seu não é um fim, é um encontro desejado e preparado, e nós não nos sentimos órfãos, pelo contrário, sentimo-lo ainda mais próximo agora que ele é com o Senhor e continua a abençoar-nos e a rezar por nós.”

 

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