Não sejas incrédulo, mas fiel
“Sem ter visto o Senhor, vós O amais. Sem O ver ainda, n’Ele acreditais. Isso será para vós fonte de alegria indizível e gloriosa, pois obtereis aquilo em que acreditais: a vossa salvação” (1 Pd 1,8-9).
Redação (16/04/2023 15:14, Gaudium Press) A Santa Igreja Católica, nascida do divino costado de Nosso Senhor Jesus Cristo, conserva sua existência até hoje graças ao poder infinito desse sangue derramado com tanta abundância sobre nós. Foram os méritos deste mesmo sangue precioso que restaurou e robusteceu a fé dos Apóstolos, quando eles, ao duvidarem e se esquecerem dos insondáveis ensinamentos de Cristo e de suas manifestações divinas, abandonaram-No em sua dolorosa Paixão: de incrédulos e medrosos, passaram a inflamados propagadores do Evangelho.
E é desta mesma fé apostólica que nós cristãos vivemos até hoje.
A cena descrita no Evangelho deste 2º Domingo da Páscoa mostra-nos o desvelo e o grande anseio de Nosso Senhor em incendiar os corações de seus seguidores na crença de sua Ressurreição.
Acreditaste por que me viste?
Com efeito, após a morte de Nosso Senhor, o terror se apoderou dos discípulos, dado que o fator de união e coesão dos discípulos viu-se extinto: a razão de suas vidas passava a jazer num sepulcro. Destarte, nada mais os motivava a anunciarem os feitos grandiosos daquele Jesus, pois tudo havia se desfeito diante de seus olhos. Somava-se a isso o receio de que os judeus viessem a persegui-los, infligindo-lhes um fim semelhante ao de seu Divino Mestre. Por este motivo, mantinham-se reclusos e escondidos em uma casa.
Era noite. Jesus apareceu em plena escuridão e, pondo-se no meio deles, disse-lhes:
“A paz esteja convosco”. (Jo 20,21)
E mostrando-lhes as mãos e o lado abertos pelos cravos, repetiu: “A paz esteja convosco”. Os discípulos exultaram de alegria e a chama da fé voltou a arder em seus corações.
Tomé, porém, não estava presente naquela ocasião e, por isso, duvidou da aparição de Jesus. Tendo-se passado oito dias, os discípulos ainda se encontravam reunidos na mesma casa, mas desta vez com Tomé. O Senhor apareceu novamente e disse:
“‘A paz esteja convosco’. Depois disse a Tomé: ‘Põe o teu dedo aqui e olha as minhas mãos. Estende a tua mão e coloca-a no meu lado. E não sejas incrédulo, mas fiel’”. (Jo 20,26-27)
Tomé, então, reconhecendo verdadeiramente a Jesus, exclamou:
“Meu Senhor e meu Deus”. (Jo 20,28)
E Jesus respondeu:
“Acreditaste porque me viste? Bem-aventurados os que creram sem terem visto”. (Jo 20,29)
Para curar a incredulidade de São Tomé, Jesus utilizou-se da clarividência da Ressurreição, embora não manifestasse totalmente o esplendor de Seu Corpo glorioso. Mas, em consequência, ele curou “as chagas de nossa incredulidade. De maneira que a incredulidade de Tomé foi mais proveitosa para nossa fé do que a fé dos discípulos que acreditaram, porque, decidindo aquele apalpar para crer, nossa alma se afirma na fé, descartando toda dúvida”.[1]
Uma chama que arde há mais dois mil anos
Este fato descrito na liturgia deste domingo traz-nos um importante ensinamento: há mais de dois mil anos a Igreja carrega esta chama de fé que vem sendo transmitida desde os tempos Apostólicos, mesmo quando, ao longo da História, a barca de Pedro pareça soçobrar. Ainda que o medo e o temor se apoderassem de muitos de seus filhos; que as circunstâncias calamitosas e desastrosas se abatessem sobre esta barca – quais ondas de perseguição e de heresia –, cobrindo-a com suas águas imundas, em todas as dificuldades e provas, Ela emergirá com mais esplendor e fulgor. Deus sempre intervém em seu auxílio, dizendo-Lhe: “A paz esteja convosco”.
Deste modo, ainda que, por agora, não vejamos o triunfo da Igreja com nossos olhos carnais – como ocorreu com os Apóstolos em relação a Nosso Senhor, ao longo da sua Paixão –, lembremo-nos de que Deus reserva aos crentes uma grande recompensa, como exclama São Pedro:
“Sem ter visto o Senhor, vós O amais. Sem O ver ainda, n’Ele acreditais. Isso será para vós fonte de alegria indizível e gloriosa, pois obtereis aquilo em que acreditais: a vossa salvação” (1 Pd 1,8-9).
Portanto, não sejamos incrédulos, mas fiéis!
Por Guilherme Motta
[1] SÃO GREGÓRIO MAGNO. Homiliæ in Evangelia. L. II, hom. 6 [XXVI], n. 4. In: Obras. Madrid: BAC, 1958, p. 665.
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