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Heroica firmeza de São João Nepomuceno

No século XIV, houve um varão íntegro e destemido que foi martirizado por defender o sigilo da Confissão: São João Nepomuceno.

Foto: Francisco Lecaros

Foto: Francisco Lecaros

Redação (21/03/2024 09:40, Gaudium Press) Filho de pastores, nasceu na Boêmia – atual Checoslováquia – em 1340. No dia em que veio ao mundo, luzes extraordinárias se espargiam sobre sua casa. Ainda criança, foi acometido de grave doença da qual a Santíssima Virgem o curou.

Ordenado sacerdote, tornou-se vigário geral da Catedral de Praga. Pelas suas altas virtudes e seus sermões, atraía multidões e a capital do país regenerou-se.

O Rei da Boêmia Venceslau IV ofereceu-lhe o prestigioso título de Chanceler do reino, mas ele não aceitou, preferindo continuar como cônego da Catedral.

Tendo a rainha o escolhido como seu confessor, Venceslau, que entre outros vícios era dominado pelo alcoolismo, ordenou que o Santo lhe narrasse as confissões de sua esposa.

São João, com firmeza, recusou-se a cometer esse crime e o rei mandou jogá-lo na prisão e que fosse torturado.  Temendo a revolta popular, Venceslau libertou-o. Isso repetiu-se várias vezes.

Labaredas circundam seu corpo

Foto: Francisco Lecaros

Foto: Francisco Lecaros

O ímpio Venceslau o ameaçou de morte. O varão de Deus, compreendendo que seu fim se aproximava, afirmou num sermão, em 20 de março de 1393: “Ainda um pouco de tempo e já não mais me vereis” (cf. Jo 7, 33-34). E predisse claramente as devastações que a heresia de João Huss faria na Boêmia.

Depois foi rezar aos pés de uma imagem de Nossa Senhora, trazida para a região por São Cirilo e São Metódio, no século IX.

Nesse mesmo dia, Venceslau o prendeu e ameaçou. Diante da heroica firmeza de São João Nepomuceno, o rei esperou o cair da noite e mandou que o lançassem no Rio Moldava.

Imediatamente, labaredas apareceram sobre o rio e rodearam seu corpo. O povo acorreu para ver a maravilha e a rainha chamou Venceslau que, apavorado, fechou-se em seus aposentos e ali ficou por vários dias.

Em 1719, seu corpo foi encontrado intacto, como se tivesse sido lançado às águas naquela hora. Sua língua, sem corrupção alguma, era como de um homem vivo, atestando seu martírio como defensor do sigilo sacramental.

Heresia e ambiente

Dr. Plinio Corrêa de Oliveira apresentou uma visão geral sobre esses acontecimentos que sintetizamos.

Nessa época, em que a Idade Média já iniciara seu declínio, surgiram os heresiarcas João Huss e Wyclif, cujas doutrinas são semelhantes às de Lutero.

Uma doutrina herética nunca é a pura criação do cérebro de um indivíduo. Mas sim, em grande parte — ao menos as heresias que alcançam êxito —, produto da elaboração de um ambiente.

O herege tonto elabora uma doutrina que o próprio ambiente não aceita; naturalmente é rejeitado, e ele não faz parte da História. Porém o esperto, pretendendo levar muitas almas para o Inferno, prepara uma doutrina que ele percebe corresponder às más inclinações do ambiente onde vive; ao menos das pessoas péssimas desse ambiente. Então, essa doutrina tem possibilidade de se propagar.

João Huss percebeu que o orgulho e a sensualidade inclinavam as almas naquelas regiões da Europa central para uma determinada doutrina.

Lutero, mais tarde, retomou as doutrinas de Huss pois a situação de deterioração que se tinha produzido na Boêmia repetiu-se na Alemanha.

A maior tragédia na História da Igreja

Se compararmos a história de São João Nepomuceno com a do protestantismo, veremos como as coisas se passaram de modo diferente.

Na Boêmia, há um santo que resiste à deterioração; o povo se entusiasma tanto por ele que, durante muito tempo, o soberano não pôde assassiná-lo com medo da revolta popular. Então, manda atirá-lo no rio durante a noite, temendo que o povo evitasse o crime. Surge o milagre, e o rei se recolhe no seu quarto durante alguns dias, abalado com a orientação má que vinha seguindo.

Na época do protestantismo não aparece o grande santo, a indignação popular não se produz, os mártires que a certa altura surgem não efetuam milagres dessa natureza. Tudo ocorre de um modo menos brilhante.

A heresia de Lutero tinha uma capacidade de expansão muito maior do que a de João Huss; esta foi esmagada enquanto aquela continuou. Dessa forma, iniciou-se a maior tragédia na História da Igreja: a expansão da Revolução religiosa pelo mundo.

Se os católicos fossem verdadeiramente fiéis…

Por que, a partir do momento em que a Revolução eclodiu, faltaram homens providenciais, e os milagres e as manifestações do sobrenatural foram diminuindo?

Para quem considera os fatos à luz da Teologia da História, a explicação é: Se os católicos daquele tempo fossem verdadeiramente fiéis e amassem a Igreja como deveriam, essas coisas não aconteceriam.

Dois terços da Europa continuaram católicos, um terço ficou protestante. Se esses dois terços fossem constituídos de católicos fervorosos, o terço que ficou protestante não teria alcançado as vitórias que obteve. E o protestantismo não poderia depois ter irradiado, se não os seus erros teológicos, pelo menos o seu espírito, sobre dois terços da Europa católica.

E como os católicos não reagiram contra as heresias como deveriam, houve uma retração de graças da parte da Providência. E chegamos a esse paradoxo de que um erro parece tão forte e uma verdade parece tão débil.

A tibieza é execrada por Deus

Mas é só isso?

A maldade dos inimigos da Igreja tem nexo com a tibieza dos filhos dela. Quando os católicos são muito tíbios diante de um erro, os líderes deste em geral são péssimos. Por isso, naquela época, a heresia protestante obteve uma adesão horrorosa.

Nós também nos encontramos numa situação em que o mal toma uma pujança extraordinária. E a Providência não opera milagres, em parte para não jogar pérolas aos porcos, mas também porque o milagre não adiantaria.

Há muita gente que diante de um milagre não se converteria.

Consideremos uma grande cidade de nossos dias em cuja população a Fé perdeu de tal maneira o terreno que as pessoas verdadeiramente católicas constituem uma minoria.

Se todos os seus habitantes vissem o cadáver de um santo flutuando sobre as águas, das quais saíssem chamas, será que mandariam fechar os lugares de perdição existentes na cidade e fariam penitência? Eu não acredito.

No dia seguinte, por meio de um comunicado, os cientistas dizem que, devido a tal substância jogada no rio, formou-se um bolsão, etc. Quando querem negar o milagre, há explicação para tudo.[1]

Roguemos a São João Nepomuceno, cuja memória é celebrada em 20 de março, que nos obtenha de Nossa Senhora a graça de execrar a tibieza, pois está consignado no Apocalipse: “Oxalá fosses frio ou quente!  Mas como és morno, nem frio nem quente, vou vomitar-te.” (3, 15-16).

Por Paulo Francisco Martos

Noções de História da Igreja


[1] Cf. CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. São João Nepomuceno, mártir do sigilo sacramental. In Dr. Plinio. São Paulo. Ano 17, n. 192 (março 2014), p. 30-33.

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