Excelências do Tesouro Eucarístico
A presença eucarística de Cristo é mais vantajosa para nós hoje do que a sua presença sensível foi para as pessoas de seu tempo.
Redação (04/10/2023 10:08, Gaudium Press) Certa vez, instruindo seus discípulos, Jesus disse: “Um escriba que se tornou discípulo do reino dos céus é como um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas” (Mt 13,52).
Vinte séculos de vida da Igreja nos trouxeram inúmeras bênçãos e benefícios, um verdadeiro tesouro. Hoje é oportuno redescobri-lo, como pai da família do Evangelho, para nos nutrirmos da permanente fecundidade daquele depósito onde o novo e o antigo andam de mãos dadas. Se não fosse assim, o novo seria um salto temerário no vazio; e o antigo, algo como uma peça de museu sem vida ou projeção de futuro.
Com esse pressuposto, vamos ao século XVII para nos encontrarmos com o jesuíta francês Padre Luis Lallemant (1588 – 1635) cuja doutrina e espiritualidade sempre foram apreciadas na Companhia de Jesus e em toda a Igreja. É claro que certos “teólogos” de hoje não o acompanham, mas isso é problema deles… e daqueles que sofrem a sua influência nociva.
Este autor faz algumas reflexões sobre a Eucaristia onde explica, com a lógica inaciana, que a presença eucarística de Cristo é mais vantajosa para nós hoje do que a sua presença sensível foi para as pessoas de seu tempo. É uma ideia que à primeira vista é desconcertante e quão verdadeira é!
Como a Eucaristia nos beneficia em relação a Jesus em pessoa de 2.000 anos atrás? Lallemant apresenta sete razões:
1.- Nosso Senhor está na Eucaristia dia e noite como Hóstia viva e misericordiosa diante dos olhos do Pai, desagravando sua honra, satisfazendo sua justiça, comunicando a vida da graça e a semente da glória aos que dele se aproximam dignamente. Podemos colher muitos frutos desta presença misteriosa, que pouco parece ter valido aos contemporâneos de Jesus, aquela convivência que eles não souberam apreciar.
2.- Eles o tinham somente em um lugar. Se Ele estava em Nazaré, não estava em Jerusalém, se estava no Mar de Tiberíades, não estava na montanha. Aqui temos isso ao mesmo tempo em todos os lugares, em todas as igrejas do mundo.
3.- Eles o desfrutaram apenas por um certo tempo, por dias, algumas poucas horas. No total, sua permanência na terra durou trinta e três anos e, da mesma forma, ele era desconhecido pela maioria de sua época. Aqui o temos em todos os momentos, depois de tantos séculos e será assim até o fim do mundo.
4.- Eles viram sua aparência exterior com os olhos do corpo e, na maioria das vezes, sem muitos frutos; Eles não valorizaram nem aproveitaram. Aqui vemos isso com os olhos do espírito e com o mérito da Fé.
5.- Eles nada mais viram do que o seu estado de natureza, tal como lhes foi manifestado. Nós temos aqui, em estado de pura graça, para operar todos os efeitos prodigiosos da graça, em número e em qualidade.
6.- Eles se beneficiaram dessa presença através dos seus sentidos naturais. Nós, de uma maneira muito mais íntima que ultrapassa os sentidos. Os anjos e santos do céu também não gozam de sua presença através dos sentidos, no que nos assemelhamos a eles e, de certa forma, lhes superamos pelo dom da esperança que eles não possuem pois já alcançaram a meta.
7.- De todos os homens e mulheres de seu tempo que o viram e ouviram, quantos o seguiram e se uniram à sua causa? Um número muito pequeno; antes da sua Ascensão não eram mais de quinhentos discípulos. Comparemos essa pequena multidão com a multidão incontável de povos e raças que o adoram em toda a terra, encontrando não só o seu aspecto sensível, mas o seu corpo e o seu sangue realmente presentes sob as espécies do pão e do vinho e, como dizem os teólogos, concomitantemente também sua alma e sua divindade. E essa maravilha feita alimento sanador, sempre ao nosso alcance.
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Porém, algo óbvio deve ser dito: o fato de ter visto Jesus e ter estado com Ele é uma graça extraordinária e um privilégio invejável!
Em todo caso, a instituição eucarística parece dar sentido às palavras de São João no seu Evangelho ao narrar o que aconteceu na Última Ceia: “Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim” (Jo 13, 1). Esta afirmação equivale a dizer que o amor com que distinguiu os seus discípulos ao instituir o Santíssimo Sacramento supera aquele que lhes testemunhou reunindo-os junto a Ele durante a sua vida pública. Quanto amor e quanta bondade!
Para concluir, vejamos em rápida série algumas etapas, por assim dizer, dessa bondade. Para Deus tudo é um eterno presente, mas vale a pena distinguir suas ações no tempo, onde as suas alianças com os homens são renovadas e superadas:
Desde sempre Deus nos imaginou e nos amou! Ele nos criou à sua imagem e semelhança e colocou em nós seus prazeres. Após a queda, ele nos perdoou e nos redimiu do pecado ao morrer na Cruz. Ele nos adotou como filhos, nos deixou sua Mãe e nos reuniu na Igreja para que fôssemos santificados, instruídos e governados. Permaneceu na Eucaristia, alimento, remédio e semente de glória. Ao concluir sua estadia na terra, foi aos céus para nos preparar um lugar, interceder por nós junto ao Pai e nos enviar um Defensor, o Espírito Santo. E quando acabar a história, por ocasião do juízo final, ele dirá àqueles que pela sua misericórdia conservaram a sua graça: “Vinde abençoados por meu Pai”.
Nessa maravilhosa sucessão de munificências, o tesouro eucarístico, em sua tripla dimensão de sacrifício redentor, presença real e alimento terapêutico, parece ser o fulgor mais excelente da Bondade divina.
Reprovamos os contemporâneos de Jesus por não tê-lo visto em toda a sua estatura, mas… e o nosso desprezo ao deixá-lo sozinho nos altares e nos tabernáculos? Ele nos ama muito, e nós nem sequer nos deixamos amar.
Mairiporã, São Paulo, outubro de 2023.
Por Padre Rafael Ibarguren EP – Conselheiro de Honra da Federação Mundial das Obras Eucarísticas da Igreja.
Traduzido por Emílio Portugal Coutinho
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