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Cardeal Müller: “Suspender as Missas é abdicar de nosso dever”

“É escandaloso que haja Bispos que digam que a Eucaristia está sobrevalorizada”, afirmou o Cardeal prefeito emérito da Doutrina da Fé em entrevista para ‘La Nuova Bussola Quotidiana’.

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Itália – Roma (08/05/2020 09:00, Gaudium Press) “Este vírus tem significado uma tragédia para muita gente. Precisamente por isto a Igreja tem o dever de oferecer uma visão do sofrimento e da existência humanas em uma perspectiva de vida eterna, à luz da Fé. Suspender as Missas com o povo é abdicar de nosso dever, é reduzir a Igreja às dependências do Estado. É inaceitável”, assim inicia a entrevista do Cardeal Gerhard Müller, prefeito emérito da Congregação da Doutrina da Fé em entrevista publicada em ‘La Nuova Bussola Quotidiana’. “É escandaloso que haja Bispos que digam que a Eucaristia está sobrevalorizada”, afirma o purpurado com muita franqueza, ‘sem pelos na língua’, poderíamos dizer.

A gravidade do pensamento laicista que entrou na Igreja

Perguntado sobre o sofrimento que implica para muitos fiéis no mundo inteiro o não poder ir à Missa, o Cardeal alemão ‘dispara’ contra aqueles que dentro da Igreja, ao invés de buscar medidas para minimizar os riscos de contágio, simplesmente determinam “proibir a liturgia”. “A Igreja não é cliente do Estado, e nenhum Bispo tem direito de proibir a Eucaristia deste modo. Inclusive temos visto sacerdotes castigados por seus Bispos por terem celebrado a missa com poucas pessoas: tudo isto significa se ver como funcionários do Estado. Mas nosso pastor supremo é Jesus Cristo, não Giuseppe Conte [ndr. Primeiro ministro da Itália]. O Estado tem sua tarefa e a Igreja a sua”.

“Somos chamados a carregar sobre nossos ombros, a cada dia, a nossa cruz, mas também temos que explicar aos fiéis seus sofrimentos com os conceitos do Evangelho. Proibir a participação à liturgia vai em direção oposta. Tomar determinadas medidas externas é tarefa do Estado; a nossa é defender a liberdade e independência da Igreja e sua superioridade na dimensão espiritual. Não somos uma agência subordinada ao Estado”, insiste o Cardeal em seu desejo de afirmar os direitos da Igreja, Igreja que inclui os leigos, é claro.

A liturgia ‘virtual’ não pode ser considerada substituta da Missa

Para o Cardeal Müller a assistência virtual à liturgia, que é uma assistência espiritual, se entende em circunstâncias excepcionais, que ele exemplifica como quando alguém se encontra em um cárcere, ou em um campo de concentração.

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“Pode-se participar espiritualmente da Eucaristia, mas não é uma situação normal -diz o Cardeal. Deus nos criou alma e corpo. Deus tem acompanhado ao seu povo na história, o libertou realmente da escravidão do Egito, não foi uma libertação virtual. Jesus, filho de Deus, se fez carne, e nós cremos na ressurreição da carne. Por isso, a presença corporal é totalmente necessária para nós. Para nós, não para Deus. Deus não necessita dos sacramentos, somos nós que necessitamos. Deus instituiu os sacramentos para nós. O matrimônio não funciona somente espiritualmente, é necessária a união do corpo e da alma. Não somos idealistas platônicos, não se pode acompanhar a missa a partir de casa, salvo em situações particulares. Não, temos que ir à igreja, reunir-se com os demais, comunicar a Palavra de Deus”.

O Cardeal Müller se referiu a alguns católicos que tem afirmado que a missa estaria “sobrevalorizada”, ou que alguns fiéis teriam “obsessão” com a eucaristia. Para o purpurado dizer isso é algo “absurdo. A Eucaristia é a única verdadeira adoração de Deus por meio de Jesus Cristo. Não é uma entre as muitas formas de liturgia; e, em troca, todas as formas da liturgia tem na Eucaristia a razão de sua existência. Tudo recebe força e consistência da Eucaristia”.

Há um ataque à Eucaristia?

“Sim”, responde claramente o Cardeal Müller. E afirma que há pessoas dentro da Igreja que “argumentam como protestantes, ignorando que desde o princípio da Reforma Protestante a Eucaristia foi, precisamente, o ponto central da controvérsia”. Há católicos que “não compreendem o valor central da Eucaristia”. A estes os qualifica como “os verdadeiros rígidos, os verdadeiros clericais, os que não levam a sério a palavra de Jesus e a doutrina da Igreja”. E clama para que apareçam figuras à altura de um São Carlos Borromeu ou São Roberto Belarmino, que afirmam a doutrina da Igreja nesses assuntos.

Fortes afirmações, contra uma “Igreja burguesa, secularizada”

Ao ser inquirido sobre católicos que colocam como principal objetivo nestes dias a preservação da saúde física, o Cardeal ex-prefeito do Santo Ofício fala da primazia dos bens espirituais sobre os materiais:

“É uma igreja burguesa e secularizada, não uma igreja que vive da palavra de Jesus Cristo. Jesus disse: “buscai primeiro o Reino de Deus”. De que vale a vida, todos os bens do mundo, incluindo a saúde, se a alma for perdida posteriormente? Esta crise colocou em evidência que muitos de nossos pastores pensam como o mundo, se vêem mais como funcionários de um sistema social religioso do que como pastores de uma Igreja que tem íntima comunhão com Deus e com os homens”.

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Não é que a Igreja não esteja preocupada com a saúde física dos homens, expressa o purpurado alemão. “Nos encomendar a Deus não contradiz que valorizemos todas as possibilidades que nos oferece a medicina moderna. Mas a medicina moderna não substitui a oração: são duas dimensões que não devem ser separadas, mas também não devem se sobrepor”.

Aos que afirmam que propiciar as missas responsabilizaria seus promotores pelos contágios que daí resultem, o Cardeal Müller responde que “os médicos também correm este risco; há um risco em toda atividade humana. É certo que devemos ter cuidado e não pôr em risco a vida e a saúde dos outros, mas este não é o valor supremo”.

A terrível epidemia do naturalismo

Em relação ao menosprezo aos valores da Fé, que se evidencia em muitos ambientes, o Cardeal Müller atribui a uma concepção naturalista da realidade: “Estamos imersos na concepção naturalista que vem do Iluminismo. Não se pode explicar a Igreja, a Graça e os sacramentos de acordo com a dimensão natural. O coração da nossa religião cristã é o Deus transcendente que se torna imanência em nossa vida, é Cristo verdadeiro homem e verdadeiro Deus através da Encarnação”.

Explanando ainda mais seu pensamento, o Cardeal alemão deplora uma “ideologia do pragmatismo” fartamente difundida, sendo que não se devem considerar somente as questões práticas, mas “um bom professor de Fé deve ser capaz de explicar uma situação como a atual partindo da Fé, em seu sentido sobrenatural, não com o naturalismo. Novamente, as duas dimensões devem ser mantidas juntas: não podemos reduzir a existência humana à mera natureza e, ao mesmo tempo, não devemos pensar -como sustentam os marxistas- que o cristianismo tem a ver apenas com o futuro. Em Jesus Cristo, temos a unidade entre o futuro e a imanência da vida. Um bom cristão deve saber ser um médico e cientista ótimo, mas isto não contradiz a confiança em Deus”. (EPC)

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