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“A louca do sacramento”

Teresa Enríquez de Alvarado ficou conhecida como “a louca do Sacramento” por seu amor à Eucaristia e seu exemplo de fervor.

Teresa Enriquez de Alvarado

Redação (01/02/2022 15:40, Gaudium Press) Ao longo da história, Deus suscita almas especialmente amantes da Eucaristia que enriquecem a Igreja com seu testemunho. A enriquecem, sim, porque a Igreja não é como um museu que conserva apenas a excelência em que foi constituída por seu divino Fundador, é uma sociedade viva que cresce constantemente produzindo novos frutos

Por certo, esse crescimento não dispensa dificuldades e tropeços. Nos dias que correm, uma grave crise corrói os meios católicos com inevitáveis repercussões como o desamor à Sagrada Eucaristia. Mas não nos iludamos; na desafeição ao culto eucarístico, os fiéis normalmente são mais vítimas que culpados, vítimas de uma sociedade pagã. Vítimas também da escassez de exemplos e de guias. Se fala de “crise de vocações”, deveria dizer-se com mais propriedade “crise de respostas”, porque Deus não cessa de chamar.

Em todo caso, as pessoas corajosas que respondem ao chamado sempre brilham no firmamento da Igreja. Trata-se de procurá-las, conhecê-las, admirá-las e imitá-las.

Há pouco mais de quinhentos anos, uma dessas almas resplandeceu, não precisamente no interior de um convento ou no exercício de um ministério eclesiástico. Das fileiras do laicato, e sem que as pesadas cargas temporais impedissem a sua dedicação à Igreja, destacou-se uma dama da nobreza castelhana: Teresa Enríquez de Alvarado (1450-1529). Quem foi este personagem?

Prima irmã do rei Fernando, o Católico, e amiga íntima da rainha Isabel de Castela; tia de São Francisco de Borja, Duque de Gandía, que foi o terceiro General da Companhia de Jesus, e intimamente relacionada com os notáveis ​​de seu tempo, Dona Teresa honrou eximiamente seus deveres de Estado. Foi esposa do Contador-Chefe do Reino e prefeito de Toledo, Don Gurierre de Cárdenas, de quem teve descendentes. Com seu dinheiro, ordenou a construção de templos, hospitais e claustros, além de muitas outras obras de caridade, ajudando prodigamente aos pobres e enfermos.

Mas foi a Presença Real do Senhor que mais cativou o seu coração. Comungava regularmente, em uma época em que não era costume fazê-lo, e encontrava tempo, no meio de suas obrigações da corte ou de caridade, para passar longas horas diante do tabernáculo. Ela mesma moía o trigo e amassava a farinha para a confecção das hóstias que mais tarde seriam consagradas no altar.

Em Torrijos, cidade da província de Toledo onde se instalou, sendo viúva, fundou algumas Confrarias Sacramentais que se espalharam por muitos lugares, promovendo notadamente a adoração eucarística. Por Bula Papal, Júlio II aprovou e promoveu a instituição das “Arquiconfrarias do Santíssimo Corpo de Cristo”, tanto em Roma como na Espanha. Posteriormente, este trabalho se difundiu em outros países da Europa e da América.

A finalidade das Confrarias era promover o maior esplendor no culto ao Senhor Sacramentado: cuidado dos tabernáculos, custódias e vasos sagrados, das vestes sacerdotais, do que concerne ao mobiliário do altar, e da organização no translado processional do Viático levado aos enfermos (ministro, dossel, velas, sino, etc.). As confrarias contavam com pessoas que verificavam e informavam à autoridade competente como era venerada a Eucaristia nos diversos lugares, para posteriormente corrigir as deficiências. Porque o decoro e a dignidade nas atitudes e nos gestos não são ninharias quando se trata de honrar o Pão do Céu.

Abrasada no amor da Eucaristia, dava a todos um exemplo de fervor. Ela estava tão apaixonada neste empenho, que o Papa Júlio II a chamava de “a louca do Sacramento”; assim que ainda é popularmente conhecida na Espanha.

Com suas confrarias – que hoje diríamos de “direito pontifício” -, pelo papel dado aos leigos para organizar e participar nelas e pela pompa com que se procurava aproximar ao Senhor Sacramentado até em áreas profanas como a via pública, Teresa contribuiu para que o culto eucarístico não fosse apenas um privilégio dos espaços sagrados, mas também tivesse influência na vida civil e cotidiana. Foi uma nova tendência que ganhava forças ao sopro da contrarreforma. Assim, enquanto havia quem se dedicasse a justificar o dogma eucarístico refutando doutrinariamente os erros, ela o afirmava no campo das tendências, pondo uma nota de esplendor, beleza e bom gosto em tudo que se relacionasse com o Santíssimo.

Como não podia deixar de ser, nossa dama era uma grande devota da Virgem Maria. Em seu testamento escreveu: “(…) a Santíssima Virgem Gloriosa Santa Maria, sua mãe, a quem tenho por Senhora e Advogada em todas as minhas ações e agora, com devoto coração, me ofereço como sua escrava e serva”. Ordenou que os atos fúnebres de seu sepultamento fossem simples, proibiu qualquer pessoa de falar sobre ela, e que o sermão fosse em honra do Santíssimo Sacramento.

Recentemente, foi concluído seu processo diocesano de beatificação na Arquidiocese de Toledo, em cujo território se encontra Torrijos, onde viveu os últimos anos de vida. Seu corpo se conserva incorrupto e descansa no Mosteiro das Monjas Concepcionistas daquela cidade.

Acostumada à solenidade e pompa que rodeava aos grandes de sua época, Teresa a queria para o Grande entre os grandes, o humilde Prisioneiro que se oculta sob as espécies do pão e do vinho.

Haverá quem pense: “É muito fácil fazer grandiosas coisas quando se tem prestígio social, boas relações e uma fortuna considerável”. Essa consideração não é exata. O que estabelece uma obra válida é a intenção e o brio do empreendimento, não o ambiente ou os meios disponíveis; estes contribuem, e quanto, mas não são determinantes. Nas coisas de Deus, a graça divina é o que mais conta, os fatores humanos são secundários.

Atualmente, há muitas pessoas com poder, influência e dinheiro… e quão pouco de todo esse capital é aplicado para a glória de Deus e o bem do próximo! Ao contrário, das altas instâncias sociais, políticas e econômicas o mal costuma ser favorecido e, o pior de tudo, impunemente.

Teresa Enríquez foi ótima porque era humilde. E a nobreza de sua alma superava em muito a do sangue que corria por suas veias.

Mairiporã, São Paulo, fevereiro de 2022

Por Padre Rafael Ibarguren EP – Assistente Eclesiástico das Obras Eucarísticas da Igreja.

Traduzido por Emílio Portugal Coutinho.

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