Por que alguns evangélicos odeiam Nossa Senhora?

Numa atitude de afronta, desrespeito e intolerância religiosa, um pastor evangélico do interior de São Paulo se referiu a Nossa Senhora como “Satanás fantasiado de Azul”. Como fica o ecumenismo proposto pelo Papa Francisco diante desse ódio declarado a um dos principais ícones da fé católica?

Redação (12/10/2023 10:25, Gaudium Press) Uns mais, outros menos; uns de forma velada, outros de forma mais aberta; uns sussurrando, outros berrando, a verdade é que um bom número de evangélicos demonstra grande incômodo diante da devoção católica à Virgem Maria, e a fala agressiva do pastor de Bastos é uma demonstração disso.

Sabemos que o erro de alguns não pode condenar a todos, mas tratar este episódio como exagero ou caso isolado contribui para legitimar o preconceito e intolerância religiosa.

Alguns dias depois do ocorrido, o pastor postou uma carta de retratação no site da igreja que representa, pedindo desculpas “aos católicos que se sentiram ofendidos” e justificando que, “pela liberdade de crença, de pensamento e de expressão”, garantidos pela Constituição, não transgrediu nenhuma lei”. E que a sua intenção era “mostrar o descontentamento com uso do dinheiro público em um símbolo restrito a apenas uma religião”. No entanto, não foi o que demonstrou com suas palavras.

Não nos cabe julgar, mas a impressão é de que a retratação se deve mais à intenção de evitar um processo por intolerância religiosa do que ao arrependimento pela blasfêmia cometida contra a Mãe de Deus.

Ignorância, ódio e preconceito

Há alguns anos, um advogado que trabalhava comigo foi de cordeiro a lobo num instante ao me ouvir dizer “Nossa Senhora”. Antes gentil e prestativo, o homem vociferou: “Nossa Senhora, não! Sua senhora!” E, como se não bastasse o discurso em que acusava a minha “idolatria”, a partir daquele dia, o sujeito passou a fazer de tudo para “me converter” à sua denominação religiosa “para aprender que Maria era uma mulher como uma outra qualquer”.

Em outra ocasião, às vésperas do dia 12 de outubro, festividade da Padroeira do Brasil, ouvi, de uma autointitulada pastora, designação comum a esposas de pastores evangélicos: “Isso só pode ser coisa do demônio que cega esses católicos! Imagine que Jesus, nosso Salvador, é filho dessa negra!”

O advogado era de uma igreja tradicional; a pastora, de uma das milhares de pequenas igrejas independentes que existem no Brasil, criada por ela e pelo marido, e que, como muitas outras, anunciava que “naquele ministério estava a salvação”.

Nossa Senhora Aparecida não é negra, mas, e se fosse?

Quando uma pessoa se presta a fazer uma crítica, ela deve, no mínimo, se preocupar em ter conhecimentos sobre a causa que vai tratar. Nossa Senhora Aparecida não é negra, trata-se de uma imagem de Nossa Senhora da Conceição que escureceu por ter ficado durante muito tempo sob as águas do Rio Paraíba. Mas, e se fosse negra, que mal teria isso?

Dentro do contexto histórico do momento em que a Imagem foi encontrada, em outubro de 1717, ainda havia escravos no Brasil, uma vez que a escravidão no país só foi abolida em maio de 1888. Logo, podemos concluir que a Sabedoria Divina assim o permitiu para demonstrar o seu imenso amor para com todos e a sua sensibilidade ao sofrimento de cada povo, em cada época. Prova disso é que um dos primeiros milagres registrados em Aparecida foi concedido a um escravo, cujos elos da corrente que o prendiam se romperam na frente de várias testemunhas.

Dessa forma, mesmo sabendo que a Imagem encontrada pelos pescadores é a representação de Nossa Senhora da Conceição, tornou-se comum vermos Nossa Senhora Aparecida como uma mulher negra. Mas, infelizmente, contra o preconceito racista, argumentos são inúteis, porque é algo que as pessoas carregam dentro de si.

Católicos, basta de tanta hipocrisia!

Estes são apenas dois exemplos de que me sirvo para ilustrar que esse ódio e profunda rejeição a Nossa Senhora por parte de pessoas que professam outros credos não é um fato isolado. Há evangélicos que aparentam respeito à Virgem Maria como “a Mãe de Jesus”, mas não admitem que nos refiramos a Ela como a “Mãe de Deus”. E tem até pregador famoso na internet que faz piadinha sobre isso, dizendo que “Maria não pode ser mãe de Deus porque Deus é mais velho que ela”. E um pastor chegou a postar que “não existe diferença entre Maria e o porteiro do seu prédio”.

O que acontece é que nós vivemos um momento de hipocrisia em que todo mundo quer aparecer e ser politicamente correto, incluindo muitos católicos. Então, fazem desfile de carnaval colocando Jesus Cristo e representações do demônio numa mesma alegoria. Há gente que protesta um pouquinho, mas acaba deixando pra lá, afinal, “é preciso respeitar a liberdade de expressão”. Tomamos conhecimento de cultos de cunho satanista, de profanação de hóstias consagradas e depredação de igrejas, mas “melhor não falar nada, afinal, católico precisa ser tolerante”.

Há alguns anos, numa atitude grotesca e violenta, um representante de uma das maiores igrejas evangélicas do país chutou uma imagem de Nossa Senhora num programa de TV e foi aceita a explicação de que ele agiu por si mesmo, que aquilo não representava o pensamento da igreja, que era algo fora do contexto.

Satanás fantasiado de azul

O Papa Francisco propõe um movimento ecumênico para que haja harmonia entre os diferentes cultos religiosos, e as pessoas fazem a interpretação equivocada de que devemos aceitar tudo o que nos seja imposto e tirar o nosso catolicismo da frente para não ofender as outras religiões.

Por isso, rezamos o terço, mas o fazemos escondido, muitas vezes passando as contas com a mão dentro do bolso, para que o terço não seja visto, “porque precisamos respeitar as pessoas que pensam diferente, e rezar na rua ou no transporte público pode ofender os irmãos de outras denominações” …

Nós veneramos Nossa Senhora, a Cheia de Graça, a Bendita entre todas as mulheres, mas evitamos ter imagens ou estampas dela em lugares que possam ser vistas, até mesmo nas salas de nossas casas, porque as pessoas podem ficar ofendidas e nos chamar de idólatras…

Como disse o pregador da cidade de Bastos a respeito da imagem de Nossa Senhora Aparecida: “Põe ovo, põe galinha, põe o que quiser, mas não vem pôr o Satanás fantasiado de azul na entrada da cidade!”. O culto que ele presidia estava sendo transmitido pela internet e logo viralizou, atraindo muitas críticas e chamando a atenção da imprensa.

Esperamos que a bonita escultura não venha a sofrer vandalismo, pois, se até no interior das igrejas isto está acontecendo, imaginem num lugar público, depois de uma fala dessas!

O que disse o prefeito de Bastos

O prefeito de Bastos se manifestou sobre o caso, dizendo que “não precisava polêmica nenhuma, uma vez que muitos municípios brasileiros têm homenagens aos santos, a Jesus Cristo e ao Espírito Santo” e que, para agradar também aos evangélicos, resolveu atender ao pedido deles, colocando na entrada da cidade, além da imagem de Nossa senhora, a escultura de uma Bíblia e de uma pomba branca, em representação ao Espírito Santo.

“Tentamos fazer o melhor possível num espaço ecumênico por entendermos que as religiões devem conviver pacificamente” – falou o prefeito, declarando que chegou a receber ameaças devido à imagem de Nossa Senhora Aparecida.

Ecumenismo não é religião

É preciso compreender que ecumenismo não é religião, mas um movimento que busca a unidade e o diálogo entre os diferentes credos. Antes de ser ecumênicos, precisamos nos lembrar que somos católicos e não permitir o desrespeito à nossa fé.

Existe um ódio incompreensível pela devoção mariana, que constitui agressão não apenas à fé católica, mas ao próprio Deus, uma vez que Ele escolheu o ventre sagrado da Virgem Maria para se fazer homem e nascer entre nós. Nem mesmo Martinho Lutero, cuja Reforma Protestante deu ensejo a essa profusão de igrejas, jamais se referiu à Maria Santíssima com atitude desrespeitosa.

É pouco provável que este artigo seja lido pelo público evangélico, então, eu sugiro aos católicos que me leem, sobretudo os que respeitam o ecumenismo defendido pelo Santo Padre, que salvem as palavras abaixo e as ofereçam aos detratores da doutrina católica sempre que os encontrarem dispostos a ofender e achincalhar a nossa Igreja e a nossa fé:

Mãe de Deus e mulher mais sublime da Terra

“Ser Mãe de Deus é uma prerrogativa tão alta, coisa tão imensa, que supera todo e qualquer intelecto. Daí lhe advém toda a honra e a alegria e isso faz com que Ela seja uma única pessoa em todo o mundo, superior a quantas existiam e que não tem igual na excelência de ter com o Pai Celeste um filhinho comum. Nestas palavras, portanto, está contida toda a honra de Maria. Ninguém poderia pregar em seu louvor coisas mais magníficas, mesmo que possuísse tantas línguas quantas são na terra as flores e folhas nos campos, nos céus as estrelas e no mar os grãos de areia. […] Quem são todas as mulheres, servos, senhores, príncipes, reis, monarcas da Terra comparados com a Virgem Maria que, nascida de descendência real (descendente do rei Davi) é, além disso, Mãe de Deus, a mulher mais sublime da Terra? Ela é, na cristandade inteira, o mais nobre tesouro depois de Cristo, a quem nunca poderemos exaltar o suficiente, a mais nobre imperatriz e rainha, exaltada e bendita acima de toda a nobreza, com sabedoria e santidade”.

Embora possam parecer palavras proferidas por um papa ou por um teólogo católico, elas foram escritas por Martinho Lutero e constam do Manifesto de Dresden, um pronunciamento de teólogos luteranos da Alemanha Oriental, publicado na Revista luterana Spiritus Domini, nº 5, em maio de 1982.

Nesse mesmo documento, referindo-se aos milagres de Lourdes, os teólogos luteranos assim se posicionam: “Seria o cúmulo da tolice ignorarmos a voz de Deus que fala ao mundo pela mediação de Maria, e dar-lhe as costas, unicamente, porque Ele faz ouvir sua voz através da Igreja Católica. Pode acontecer que, rejeitando ou ignorando a mensagem que Deus nos faz chegar através de Maria, estejamos recusando a última graça que Ele nos oferece para a nossa salvação.”

É difícil chamar de irmão a quem ofende nossa Mãe!

Nosso Senhor Jesus Cristo nos ensina a não julgar e, como já foi dito, não podemos, por causa da atitude preconceituosa de alguns, generalizar o pensamento de todos, mas, confesso que, dentro da minha pequenez, acho muito difícil passar por um episódio como esse sem nos indignarmos. Afinal, é difícil chamar de irmão a quem ofende assim a nossa querida Mãe.

Diante do desacato desse pastor, é difícil repetir as palavras que Cristo pronunciou no alto da cruz: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem!” (Lc 23,34), visto que, infelizmente, acredito que saibam. É lamentável que haja tantas pessoas que se deixem levar por blasfemadores. Destas, sim, devemos ter dó, porque ser levado ao erro e ludibriado na fé é uma das piores tragédias que pode acontecer na vida de um cristão.

Por Afonso Pessoa