Na despedida, o convívio mais sublime
Nossa Senhora por sua fidelidade Se constituiria de forma eminentíssima, enquanto associada em plenitude à Paixão de seu Filho, na Corredentora do gênero humano.
Redação (06/04/2023 16:48, Gaudium Press) Pelo amor infinito que devotava à sua Santíssima Mãe, Nosso Senhor não quis privá-La da participação naqueles momentos memoráveis, e A convidou para passar a Páscoa com Ele em Jerusalém.
Todos os Apóstolos se reuniram no Cenáculo para a ceia. Maria estava numa sala anexa com algumas das Santas Mulheres, acompanhando em seu Imaculado Coração tudo o que ocorria no recinto principal com seu Filho. O auge da comemoração seria a instituição da Sagrada Eucaristia, mistério revelado a Ela e a São José por seu Filho durante os colóquios nos anos da infância. Desde então Maria ansiava por receber esse Sacramento e para ele Se preparou mediante inúmeras Comunhões espirituais.
Que gáudio experimentou quando Nosso Senhor, depois de ter comungado a Si próprio, dirigiu-Se à sala da qual Ela acompanhava discretamente o sublime desenrolar daquele convívio e deu-Lhe o pedaço de Pão transubstanciado em seu Corpo, Sangue, Alma e Divindade… Na Última Ceia, Maria foi a primeira a comungar das mãos de Jesus! E a partir daquele instante as Sagradas Espécies nunca se consumiriam em seu interior, permitindo que Ela participasse, de maneira mística e muito particular, da Paixão de seu Divino Filho.
“É chegada a hora”
Bem se compreende a dor que acometeu Maria quando, a certa altura da ceia, Judas levantou-se para consumar a traição entregando o Divino Filho d’Ela ao Sinédrio. Nossa Senhora rezou para que aquele infeliz se arrependesse do mal que estava para praticar, mas ele não correspondeu à voz da graça e submergiu nas trevas que dominavam Jerusalém.
Tendo o traidor se retirado, Nosso Senhor proferiu o sublime discurso de despedida recolhido pelo Discípulo Amado em seu Evangelho (cf. Jo 14–17), ao término do qual todos se levantaram a fim de tomar o caminho rumo ao Horto das Oliveiras. O Divino Mestre dirigiu-Se até Nossa Senhora e, fitando-A com extrema doçura, disse-Lhe parafraseando as palavras que pronunciara ante seus prediletos: “Mãe, é chegada a hora” (cf. Jo 17, 1), hora temida de Ele sofrer sua dolorosa Paixão. Antes de partir, perguntou-Lhe se consentia naquela imolação.
Maria conhecia perfeitamente o plano de Deus a respeito da Redenção, mas o imolado seria seu próprio Filho… Quanto Ela desejaria estar em seu lugar, para poupar-Lhe aqueles horrores. Entretanto, uma vez mais pronunciou decidida seu “fiat”, sentindo a espada de dor se aproximar para perfurar sem clemência seu Coração Imaculado, conforme Simeão profetizara no dia da Apresentação no Templo (cf. Lc 2, 35).
A Virgem Puríssima permaneceu no Cenáculo. Retirada em uma das dependências do prédio, começou a acompanhar misticamente o Salvador, pois tudo o que Lhe sucedia repercutia n’Ela de maneira inefável, em função da Presença Eucarística que palpitava no seu sagrado peito. Soara o momento marcado pelo Pai para que Ela iniciasse sua participação efetiva na Redenção.
O mais “doloroso” ministério angélico
Quando a Paixão estava prestes a se iniciar, o Altíssimo chamou São Gabriel à sua presença. Além de ordenar-lhe que impedisse o demônio de aproveitar as circunstâncias para atentar contra a integridade física de Nossa Senhora, mostrou-lhe os tormentos que Jesus sofreria, incumbindo-lhe, enquanto guardião e representante divino junto a Maria, de obter para cada um deles seu consentimento. O Arcanjo achou-se, pois, na contraditória contingência de, sem abandonar a missão de defendê-La, ser ao mesmo tempo o portador da espada destinada a atravessar seu dulcíssimo Coração!
Iniciou-se então um duríssimo diálogo interior, que duraria toda a Paixão. Ao ser-Lhe apresentado por São Gabriel cada sorvo do cálice, Nossa Senhora o analisava, aceitando o padecimento que Lhe causaria e oferecendo-o a Deus, e prestava sua profunda e puríssima anuência a fim de que aquele tormento se efetivasse em Jesus. Nenhuma gota de sangue, nenhuma ferida, nenhum impropério escapou a essa suprema regra imposta pelo Padre Eterno para o desenvolvimento do martírio do Homem-Deus. Pode-se dizer que Maria padeceu duplamente – primeiro, no campo místico; depois, no físico – para que, de alguma forma, seu Filho sofresse um pouco menos…
Da modorra à fuga
Enquanto esse sublime e doloroso diálogo se iniciava, o Divino Redentor chegou com seus discípulos ao Horto das Oliveiras. Ali convidou São Pedro, São João e São Tiago a acompanhá-Lo e Se afastou para rezar, tomado por “uma tristeza mortal” (Mc 14, 34).
Prosternado com o rosto em terra, teve conhecimento experimental dos sofrimentos pelos quais deveria passar, padecendo por antecipação na Alma as dores que se dariam em sua carne santíssima. A isso se acrescentou a visão da ingratidão dos homens ao longo da História. Eles pisariam com desprezo o Preciosíssimo Sangue prestes a ser derramado com loucura de amor. Jesus media a aparente inutilidade desse sacrifício e sua angústia aumentava, agravada pelo desinteresse daqueles três prediletos que haviam caído num pesado sono, fruto do egoísmo ainda inviscerado em suas almas.
Nossa Senhora sentia grande aflição por perceber que Jesus sabia do consentimento d’Ela a tais tormentos, o que causava à sua natureza humana, dotada de perfeitíssimo espírito filial, a sensação de ter sido abandonado por sua Mãe. Essa tentação persistiria de diversos modos durante a Paixão como uma de suas maiores dores.
Amargurado em extremo, Nosso Senhor suplicou: “Pai, se é de teu agrado, afasta de Mim este cálice! Não se faça, todavia, a minha vontade, mas sim a tua” (Lc 22, 42). Vendo Maria os sofrimentos que seu Filho padeceria, associou-Se a esse pedido. E seu clamor foi atendido: um Anjo entregou a Jesus um cálice, cujo misterioso líquido deu-Lhe forças para continuar.
“Levantai-vos, vamos! Aquele que Me trai está perto daqui” (Mt 26, 46), exclamou aos três escolhidos submersos num sono de torpor e tristeza. Ao aviso do Mestre eles acordaram sobressaltados, pois já se escutava o forte rumor da multidão que se acercava para prendê-Lo. Os Apóstolos e discípulos fugiram, opressos pelo medo. Apenas São João não abandonaria Jesus, mas cumpriria eximiamente sua missão de acompanhar Maria Santíssima durante a Paixão.
Emitida a sentença, o Sinédrio devia ratificar a condenação junto ao poder romano, pois não possuía direito à execução dos réus. Despontava o Sol no horizonte e era preciso levar Jesus ao Pretório.
Mons. João Sconamiglio Clá Dias, EP
Texto extraído, com adaptações, de: Maria Santíssima! O Paraíso de Deus revelado aos homens.
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