O indispensável papel do sofrimento
Dos que lhe são mais próximos Jesus espera uma intimidade completa que os leve a uma radical disposição de tudo padecer com Ele.
Redação (01/08/2022 09:53, Gaudium Press) “Se alguém quiser vir comigo, renuncie-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-Me. Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas aquele que tiver sacrificado a sua vida por minha causa, recobrá-la-á” (Mt 16, 24-25).
Nesta passagem da Escritura, Nosso Senhor estabelece o sofrimento como elemento necessário para acompanhá-Lo e alcançar sua amizade. Carregar a cruz significa não apenas estar disposto a aceitar a dor e a contrariedade, mas fazê-lo por amor.
Dos que lhe são mais próximos Jesus espera uma intimidade completa, que os leve a discernir seus divinos anseios e desígnios, e a tudo padecer com Ele, por Ele e para Ele.
No entanto, já entre os Apóstolos encontramos diferentes graus de correspondência a esse convite. Ao ouvir o primeiro anúncio da Paixão, São Pedro repreendeu o Mestre, merecendo receber d’Ele esta grave censura: “Vai para longe de mim, satanás! Tu não pensas como Deus, e sim como os homens” (Mc 8, 33).
São João, pelo contrário, teve uma atitude perfeita quando, reclinando-se sobre o peito de Jesus durante a Última Ceia, perguntou-Lhe quem O haveria de trair (cf. Jo 13, 23-25). Mais do que escutar a resposta vinda dos lábios do Redentor, ele procurou auscultar os anseios do Sagrado Coração e amou os insondáveis desígnios de Deus, sem pôr obstáculos a que se consumassem todos os sofrimentos de seu Senhor. O amor incondicional deste Apóstolo levou-o a, unido a Maria Santíssima, dizer fiat à vontade do Padre Eterno e à obra da Redenção, tornando-o digno de estar junto à Cruz de Cristo (cf. Jo 19, 26).
Diversidade de reações em face do sofrimento
Ora, não só os Apóstolos, mas todos os homens, bons e maus, passam inevitavelmente por esse “divino desafio” de dizer fiat aos sofrimentos que ante eles se apresentam neste vale de lágrimas.
E também entre nós há diversos modos de reagir em face dessa realidade. Algumas pessoas, acomodadas à situação em que se encontram, fazem de tudo para evitar qualquer moléstia ou preocupação, preferindo acreditar na triste ilusão de um mundo “perfeito”, sem dificuldades nem angústias. Elas se assemelham a São Pedro quando atraiu sobre si a reprovação do Salvador: “Vai para longe de mim, satanás! Tu não pensas como Deus, e sim como os homens”.
Outras, sedentas de vantagens, gozos medíocres e alegrias passageiras, podem ser contadas entre o grande número dos egoístas que, mesmo sabendo não ser possível desterrar por completo o sofrimento de suas vidas, “se portam como inimigos da Cruz de Cristo, cujo destino é a perdição, cujo deus é o ventre, para quem a própria ignomínia é causa de envaidecimento, e só têm prazer no que é terreno” (Fl 3, 18-19).
Poucos são, infelizmente, os que, diante das inevitáveis aflições desta terra, as enfrentam com serenidade, resignação e alegria.
Homens e mulheres configurados com Cristo
Deus, porém, não abandona o mundo aos desvarios do pecado, nem deixa de suscitar almas que indiquem à humanidade o caminho da retidão, do desprendimento e da verdadeira caridade. Essas almas são chamadas a, juntamente com Cristo, serem pregadas na Cruz (cf. Gal 2, 19) e abraçarem a dor da forma como a Providência queira enviá-la, pois o sofrimento as configura com Nosso Senhor de uma maneira perfeitíssima.
Na vida dos Santos encontramos inúmeros fatos que ilustram essa sublime realidade, tantas vezes manifestada no próprio corpo pela presença dos sagrados estigmas e por outros fenômenos sobrenaturais.
Grande exemplo de amor à cruz deu-nos São Francisco de Assis. Varão cheio de Deus, alcançou tão alto grau de união com Cristo que, após um êxtase, mereceu tornar-se fisicamente semelhante ao Crucificado, trazendo em sua carne as chagas de Jesus.
Como explica São Boaventura, seu biógrafo e filho espiritual, “assim como ele havia imitado a Cristo nas ações de sua vida, do mesmo modo devia se conformar a Ele nas aflições e dores da Paixão, antes de partir deste mundo”.
O que dizer, então, de Santa Teresa de Jesus, cujo coração era frequentemente transpassado por um Anjo com uma seta incandescente, que a deixava abrasada de amor a Deus? A dor causada pela transverberação arrancava-lhe sonoros gemidos e lamentos! No entanto, a paz e consolo por ela sentidos naqueles instantes eram tais que de modo algum desejava evitar ou diminuir esse sofrimento.
Cabe ainda lembrar Santa Gema Galgani, escolhida pela Providência para viver intensamente a glória da cruz. Essa jovem eleita teve também a imensa graça de portar em seu corpo os sagrados estigmas, como prova do grande amor e predileção que o Redentor e sua Mãe Santíssima nutriam por ela.
Sigamos o seu exemplo!
Todos nós, batizados, somos chamados à santidade e, portanto, a padecer por amor a Deus os sofrimentos que Ele queira nos enviar, tendo a certeza de que as forças para enfrentá-los nos virão d’Ele mesmo.
Assim, quando abraçarmos nossa cruz e sentirmos nossa fraqueza clamar dentro de nós, olhemos para além da dureza e negrume do simples lenho. Fixemos nossas vistas em quem nela está pregado e lancemo-nos em seus braços, que nos convidam a conviver com Jesus nesta hora suprema!
E, a seu exemplo, nos momentos mais terríveis busquemos auxílio n’Aquela que não só sofreu e enfrentou com Ele toda a Paixão, mas foi também, por seu amor e fidelidade adamantina, seu máximo consolo, ornando com lágrimas de brilhante o Sacrifício Redentor.
Texto extraído da Revista Arautos do Evangelho n. 212, Agosto 2019. Por Carolina Amorim Zandoná.
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