São Geraldo Majella
Hoje, dia 16 de outubro, memória de São Geraldo Majella que, em sua curta existência de apenas 29 anos, legou à Igreja um exemplo vivo de pureza de coração.
Redação (16/10/2023 08:32, Gaudium Press) Último filho de uma piedosa família, Geraldo nasceu na pequena cidade de Muro Lucano, próxima de Nápoles, em abril de 1726. Desde muito jovem deu manifestações de ser uma alma predileta da Providência: nunca pedia alimento e, em alguns dias da semana, chegava a rejeitá-lo, prenunciando os jejuns que haveria de praticar mais tarde e sua célebre máxima: “O amor a Deus não entra na alma se o estômago está cheio”.
Seu principal passatempo consistia em erigir pequenos altares, adornando-os com velas e flores; mas seu local preferido era a capela de Capodigiano, dedicada à Santíssima Virgem, distante de Muro cerca de 2 km. Dali voltou, certa vez, trazendo um pequeno pão branco. Indagado pela mãe acerca de quem lhe havia dado o alimento, respondeu: “O filho de uma bela senhora com o qual brinquei”.
Como o fato se repetisse diariamente durante vários meses, uma de suas irmãs o seguiu um dia, sem ele perceber, e pôde testemunhar o seguinte espetáculo: apenas Geraldo se ajoelhou aos pés da imagem de Maria, o Menino Jesus desceu dos braços de sua Mãe para brincar com ele e, ao despedir-Se, entregou-lhe um pãozinho.
Sua Primeira Comunhão não foi menos extraordinária: tendo recebido do pároco uma categórica resposta negativa, por ser ainda muito novo para receber o Pão dos fortes, o pequeno Geraldo pôs-se a soluçar no fundo da igreja. Na mesma noite apareceu-lhe São Miguel Arcanjo e lhe administrou a Sagrada Eucaristia!
Já na adolescência, sinal de contradição
À semelhança de Nosso Senhor Jesus Cristo, Geraldo foi, desde os primeiros anos, um sinal de contradição (cf. Lc 2, 34) nos ambientes que frequentava. Devido ao falecimento de seu pai, viu-se obrigado a trabalhar como aprendiz de alfaiate. O dono do estabelecimento se afeiçoou a ele; mas o chefe dos empregados, pelo contrário, tomou-se de aversão pelo jovenzinho, justamente por vê-lo tão piedoso. Acusava-o de vagabundo, cobria-o de bofetadas, a ponto de, em uma ocasião, fazê-lo perder os sentidos. Geraldo jamais se queixava com o patrão; antes, alegrava-se em padecer por Jesus e repetia a seu carrasco: “Batei, batei mais, eu mereço este castigo”!
Algum tempo depois, pôs-se a serviço de Dom Albini, Bispo de Lacedonia, conhecido por seu caráter irascível. Durante três anos Geraldo suportou humilhações, reprimendas, maus-tratos…
Numa ocasião, deixou cair na cisterna o molho de chaves da residência episcopal. Em meio a uma terrível aflição, só encontrou uma saída: fez descer até o fundo do poço, amarrada na corda, uma imagem do Menino Jesus, enquanto suplicava: “Só Vós podeis ajudar-me… Se não vierdes em meu socorro, Monsenhor ralhará comigo. Por favor, devolvei-me a chave!”
Puxou a corda e — oh, maravilha! — a imagem trazia as chaves na mão. Este prodígio e sua heroica paciência valeram-lhe a admiração de toda a cidade, exceção feita do próprio prelado.
Tendo retornado a Muro, Geraldo abriu uma alfaiataria. Enquanto a agulha corria entre seus dedos ágeis, sua alma elevava-se às alturas da contemplação. Nutria filial devoção por Maria Santíssima, a quem consagrara sua virgindade, e bastava-lhe pronunciar seu nome para experimentar transportes de amor.
Inebriado pela “loucura” da Cruz (cf. I Cor 1, 18), em tudo buscava imitar os sofrimentos do Salvador: flagelava-se até o sangue, fazia-se de louco para atrair o desprezo de seus concidadãos, passava dias inteiros sem comer e, às noites, escalava a torre da catedral para introduzir-se pelas arcadas dos sinos e ir rezar aos pés do Santíssimo Sacramento. Se, de um lado, o demônio lhe armava ciladas, aparecendo como um cão furioso ou provocando acidentes, de outro, o Senhor o recompensava com inúmeras consolações.
Numa dessas longas vigílias, uma voz suave, vinda do sacrário, rasgou o silêncio noturno: “Pazzerello! — Louquinho!”. A resposta brotou rápida em seus lábios ardorosos: “Mais louco sois Vós, Senhor, que por amor estais aqui, prisioneiro no tabernáculo!”
Na Congregação do Santíssimo Redentor
Ser religioso sempre fora o sonho de Geraldo; contudo, aprouve à Providência provar-lhe a perseverança antes de aceitar sua entrega. Fracassou em duas tentativas de ingresso nos capuchinhos e numa curta experiência como anacoreta. Isto desanimaria qualquer outro, não o jovem Majela!
Alguns padres da Congregação Redentorista, recém-fundada por Santo Afonso de Ligório, chegaram a Muro para pregar uma missão. Logo ao vê-los, Geraldo compreendeu ser esta sua vocação, e solicitou entrada na ordem.
O superior, padre Paulo Cafaro, recusou-se rotundamente, alegando não possuir ele forças para suportar os rigores da vida religiosa. Como teimasse em sua resolução e o importunasse sem cessar, o padre Cafaro pediu que sua mãe o trancasse no quarto, no dia da partida dos missionários. O jovem, porém, usando uma corda fabricada com lençóis, escapou pela janela e correu atrás dos redentoristas, deixando um bilhete para a família: “Vou tornar-me santo. Esquecei-me”.
Alcançou-os na estrada e os acompanhou até a cidade vizinha, recebendo sempre a mesma negativa. Por fim, sua santa e serena tenacidade pôde mais que a determinação férrea do superior: em maio de 1749, aos 23 anos, foi acolhido, a título de prova, no convento de Deliceto.
Incansável apóstolo, grande taumaturgo
Começava para Geraldo a última etapa de sua vida: apenas seis anos o separavam de sua partida para a eternidade… seis anos fecundos em méritos, ricos de fatos miraculosos e arroubamentos celestes, entremeados de provações e sofrimentos quase sobre-humanos.
Considerado inútil para qualquer trabalho devido à sua extrema magreza, não tardou a desmentir esta fama. O fogo interior que o consumia supria a falta de robustez, a ponto de os religiosos afirmarem que rendia por quatro pessoas. Desdobrava-se em atenções para com os demais e assumia os encargos mais humildes: jardineiro, sacristão, coletor de esmolas, porteiro…
Secundado pelo dom de milagres concedido pela Providência, produzia abundantes frutos de apostolado. Os elementos, as doenças e os demônios obedeciam à sua palavra. Curou um número incontável de enfermos, dentre os quais uma menina paralítica de nascença. Em várias ocasiões, multiplicou os alimentos e chegou a abrir as águas de um rio que lhe impedia a passagem.
Um dos seus mais retumbantes prodígios foi o realizado em Nápoles. Uma multidão reunida à beira-mar afligia-se ante o espetáculo de uma embarcação cheia de passageiros que se debatia nas ondas, em meio a uma furiosa tempestade.
Passando por ali, Geraldo lançou-se à água e ordenou ao navio, em nome da Santíssima Trindade, que se detivesse. Depois o arrastou até a terra, como se fosse uma palha, e saiu da água com a roupa inteiramente seca. Todo o povo o aclamava, querendo prestar-lhe homenagens, mas ele fugiu correndo pelas ruas da cidade.
Um serafim de carne e osso
Todavia, onde mais se fazia sentir o aroma de sua santidade era no recinto sagrado do convento. De tal maneira neste religioso exemplar se rivalizavam as virtudes, que seria difícil apontar uma como a principal.
Visões, êxtases, levitações, dom de profecia, ciência infusa, discernimento dos espíritos, conhecimento à distância, resplendores, bilocações, invisibilidade… Impossível descrever no exíguo espaço de um artigo cada uma destas maravilhas!
Citemos apenas dois exemplos. Em visita ao Carmelo de Ripacandida, entrou subitamente em êxtase e seu corpo tornou-se incandescente a ponto de derreter a grade de ferro que ele tocava com as mãos. Também aconteceu-lhe de, ao contemplar uma bela pintura da Santíssima Virgem, erguer-se do solo até a altura do quadro e, beijando-o com inefável carinho, exclamar: “Como Ela é bela! Vede como é bela!”.
Sob o signo da dor
Faria, no entanto, uma imagem equivocada a respeito de Geraldo, quem julgasse ter ele sido um homem meio mágico, imune às tentações e aos sofrimentos.
Nada de mais contrário à realidade! Desde sua entrada na Congregação, padeceu terríveis provações espirituais, nas quais se julgava abandonado por Deus, prestes a sucumbir ao desespero.
Fato curioso: à medida que Geraldo progredia em virtude, as angústias se faziam mais frequentes e intensas. Em 1754, um ano antes da morte, sobreveio a grande prova, terrível e espantosa.
De improviso, foi chamado a Pagani, onde então residia Santo Afonso de Ligório. Era o primeiro encontro do humilde irmão com o fundador… e quão doloroso! Após cumprimentá-lo, Santo Afonso leu em voz alta duas cartas nas quais alguém acusava o jovem religioso de um crime cometido precisamente contra a virtude que ele mais amava: a castidade!
Não obstante, sem deixar transparecer qualquer emoção, Geraldo permaneceu em silêncio. Tal atitude equivalia a um assentimento… Surpreso, o fundador resolveu não expulsá-lo, mas lhe impôs duríssima penitência: privação da Eucaristia e proibição de tratar com pessoas externas à Congregação.
Por mais de dois meses suportou ele esta situação vexatória, vigiado pelos superiores, objeto de suspeita de quantos o conheciam. O que mais lhe doía, porém, era a falta da Comunhão. Custava-lhe conter os ardores do desejo de receber tão augusto Sacramento.
Afinal, a verdade brilhou: outras duas cartas, desmentindo a calúnia das anteriores, revelaram a Santo Afonso a falsidade da acusação à qual seu coração de pai se recusava a dar inteiro crédito…
Convidado, uma vez mais, a apresentar-se ao fundador, Geraldo foi recebido com estas palavras: “Meu filho, por que não falaste? Por que não pronunciaste sequer uma palavra para defender tua inocência?”.
Ao que ele replicou: “Meu pai, como poderia fazê-lo, se nossa regra não admite escusar-se ante as repreensões dos superiores?”.
“A vontade divina e eu somos uma coisa só”
Geraldo já não era deste mundo. Aliás, nunca o fora! Contudo, aquela tribulação apartara-o ainda mais das coisas terrenas. Em agosto de 1755, durante uma missão, teve a primeira hemoptise. Seu superior o encaminhou ao convento de Materdomini, para ali se restabelecer.
Longe de regredir, a enfermidade progrediu rapidamente: sangue, febre, mal-estares sem conta. Nada, todavia, logrou arrancar-lhe sequer uma queixa: “A vontade divina e eu somos uma coisa só”, dizia com alegria.
À custa de muito esforço deixava o leito para passar algumas horas de joelhos diante do Crucifixo de sua cela.
Também este período foi marcado por fatos extraordinários: de seu corpo minado pela tuberculose emanava um perfume tão penetrante que os visitantes identificavam seu quarto com facilidade. Mais edificante ainda foi sua obediência: tendo recebido a ordem de ficar curado, levantou-se logo e retomou a vida comunitária por várias semanas.
Sem embargo, a vontade de Deus era outra, e em outubro a doença o atacou com maior rigor. Nos poucos dias que lhe restavam, padeceu, por especial favor do Céu, os tormentos da Paixão de Cristo.
Chegado o dia 15, anunciou que morreria naquela mesma noite. Recebeu de manhã o Viático e, à tarde, recitou o Salmo Miserere. Duas horas antes de falecer, vendo aproximar-Se a Rainha dos Céus, ajoelhou-se sobre a cama e entrou em êxtase. Era cerca de meia-noite quando sua alma abandonou o corpo.
Imediatamente sua fisionomia inerte transfigurou-se, adquirindo uma formosura angélica. E quando o sineiro do convento quis fazer soar o toque dos defuntos, sentiu uma força irresistível que o obrigou a ressoar o carrilhão das grandes festas!
Em 1893, Leão XIII elevou Geraldo Majella à honra dos altares, como Beato. Onze anos depois, São Pio X inscreveu no Catálogo dos Santos este exemplar religioso que manteve sempre intacta sua pureza de coração.
Texto extraído, com adaptações, da Revista Arautos do Evangelho n.154, outubro 2014.
Deixe seu comentário