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São Charbel Makhlouf: um glorioso exemplo de santidade, desconhecido e solitário nesta terra

 Órfão de pai aos 3 anos, nascido em terras regadas por sangue de mártires, forjou sua alma à imagem de Cristo, seguindo a via do Calvário. No crisol do sofrimento interior por amor a Deus, viveu o sacerdócio dando-nos exemplo de entrega nas mãos da Providência na busca dos bens espirituais, em pleno século XIX.

Sao Charbel Makhlouf

Redação (24/07/2024 08:21, Gaudium Press). Abdullah Youssef Makhlouf nasceu no dia 8 de maio de 1828, numa pequena aldeia montanhesa do Líbano chamada Beqa-Kafra. Era o mais novo de cinco filhos de uma modesta família católica, dedicada à agricultura, e que educara seus filhos com fé sólida e ardente devoção à Mãe de Deus. Este Catolicismo arraigado é uma característica própria dos libaneses, pelas diversas perseguições de que foram vítimas, entre as quais a de 1860, onde os drusos (um ramo dos muçulmanos) martirizaram mais de 22.000 católicos, sem contar os órfãos e mulheres vendidas aos haréns turcos.

 Infância impregnada de oração

Youssef cursou seus primeiros estudos na escola da aldeia, que era orientada e sustentada pela igreja paroquial, pertencente ao rito maronita. Quando contava com apenas três anos, seu pai foi convocado pelo exército para uma guerra, depois da qual caiu gravemente enfermo e faleceu. Em todo o povoado, o jovem Youssef era conhecido por sua retidão e simplicidade, assim como por sua piedade sincera. A oração era um ponto principal em sua vida, ele dedicava grande parte de seu tempo para rezar. Conta-se que quando pelas tardes cuidava do rebanho, como era comum entre os meninos da região, ordenava aos animais que não o interrompessem enquanto rezava…

Religioso exemplar

Em determinado momento, tendo alcançado a juventude, começou a pedir o auxílio de Maria Santíssima para ser monge e entrar na vida religiosa.

Quando, manifestou seu grande desejo de ser religioso aos seus familiares, estes mudaram de tema ou não lhe deram atenção. Sua família aspirava por sua via matrimonial com uma jovem da aldeia chamada Mariam, e isto de tal forma que, sem aviso prévio, ele abandonou sua casa em 1851, aos 23 anos, e se retirou ao mosteiro de Nossa Senhora de Mayfoug, dos monges da Ordem Maronita Libanesa. Ao entrar no noviciado, escolheu o nome de Charbel[1], em honra a um mártir da igreja de Antioquia.

 De compleição robusta, Charbel era conhecido por sua disposição para servir, oferecendo-se frequentemente para realizar as tarefas mais árduas e até humilhantes. No segundo ano como noviço, foi enviado ao mosteiro de São Maron, na cidade de Annaya, onde solenemente realizou a profissão monástica, fazendo os votos de pobreza, castidade e obediência em 1853, contando 25 anos.

Certo tempo depois, Charbel foi enviado ao mosteiro de São Cipriano, em Kiffane, onde concluiu seus estudos para o sacerdócio. Com muito empenho e dedicação, Charbel era um bom estudante, encontrando-se sempre entre os melhores da sala. No dia 23 de julho de 1858, foi realizada a ordenação sacerdotal em Bkerke, na residência Patriarcal, depois da qual retornou para o mosteiro de São Maron, onde passou dezesseis anos de vida monástica.

Quando Charbel chegou ao mosteiro, já era conhecido como um homem de oração e muito maduro para sua idade. Dentro da vida monástica a prática da virtude continuou seu caminho ascensional: neste período, sua devoção ao Santíssimo Sacramento se manifestou notavelmente nas várias horas que passava de joelhos adorando a Jesus Sacramentado.

Dentro da comunidade, era costume vê-lo realizando os labores mais humildes e difíceis. Seus irmãos de hábito lembravam o respeito exímio que Charbel tinha para com todos, os frequentes jejuns e atos de mortificação, assim como sua obediência incólume, fazendo dele um modelo de vida religiosa, de tal forma que para os que o circundavam, era visível sua crescente união com Deus.

Um milagre comprova a vocação ao eremitério

Com o passar do tempo, o padre Charbel sentiu-se chamado por Deus para o eremitério. Segundo a tradição monástica do Oriente, a plenitude da contemplação alcança-se pelas vias da vida solitária. Inicialmente sua solicitude não encontrou resposta devido à falta de lugar nos eremitérios que a Ordem possuía nas montanhas. Mas certo dia, o superior percebeu que a altas horas da noite havia luz em uma das janelas do mosteiro. Coisa muito rara, pois nenhum monge tinha suficiente óleo para as lâmpadas ficarem acessas por tanto tempo. Querendo verificar o que estava acontecendo, e vendo que era a cela do padre Charbel, foi até ela e o encontrou rezando. Para surpresa dele, de fato o padre não tinha óleo, senão que o combustível de sua lâmpada era água, pois era noite e precisava terminar suas orações. Diante de tal milagre, consentiram em deixar o padre Charbel retirar-se à vida monástica, em 1875

O santo passou os seguintes vinte e três anos de sua vida da forma mais austera possível. Praticava severas mortificações e se alimentava de maneira frugal somente uma vez por dia. Apesar de viver de forma tão pobre, sempre se caracterizou pela limpeza pessoal e a ordem próprias a uma pessoa virtuosa. Geralmente celebrava suas Santas Missas ao meio-dia, a fim de passar toda a manhã em preparação e o resto do dia em ação de graças. Neste período, ele operou inúmeros milagres de curas em pessoas que recorriam a ele pedindo orações.

Os milagres não tardaram a aparecer

CharbelNo dia 16 de dezembro de 1898, durante a elevação da Eucaristia na Santa Missa, o padre Charbel sofreu um ataque de paralisia. Depois de uma agonia de oito dias, entregou sua alma a Deus. O superior do mosteiro de São Maron, conhecendo a santidade e milagres que operaria no futuro, escreveu no diário da comunidade: “No 24 de dezembro de 1898, o padre Charbel de Beka-Kafra, ermitão, faleceu em consequência de uma paralisia, provido dos santos sacramentos, aos 70 anos. […] O que fará depois dispensa-me de dar mais detalhes sobre sua vida. Fiel a seus desejos de obediência exemplar, sua vida foi mais angélica do que humana”.[2]

Os milagres não tardaram a aparecer. Na noite seguinte à sua morte, os habitantes das casas vizinhas testemunharam luzes subindo e descendo da tumba do padre Charbel, fenômeno que durou 45 dias. Depois de quatro meses, os monges pediram autorização para exumar o corpo, encontrando-o totalmente incorrupto e com os membros inteiramente flexíveis, exsudando líquido dos lugares onde utilizava os cilícios. O corpo do santo foi limpo e colocado em um novo féretro, sendo levado para o mosteiro, onde permaneceu numa sala fechada ao público, onde ninguém podia entrar. Certo tempo depois, perceberam que o líquido começava a escorrer pela escada que dava acesso à sala. Tentaram secar o corpo colocando-o no terraço do mosteiro durante cinco meses, mas não obtiveram resultado. Finalmente, fizeram um escrínio na frente do prédio, e depositaram nele o santo, para ser venerado pelos peregrinos. Centenas de pessoas passaram a rezar diante dele obtendo um pouco do miraculoso bálsamo que o corpo exsudava, assim como pedacinhos do hábito, com os quais Deus operou curas físicas e espirituais em quantidade.

Médicos de lugares diferentes examinaram o corpo e não conseguiram explicar o fenômeno. Depois de quase trinta anos fora do túmulo, foi transladado a sua segunda sepultura em 1927 na capela do convento, em um féretro selado pela comissão encarregada de sua investigação. Do lado de fora da parede, havia uma inscrição na pedra que dizia “túmulo do padre Charbel de Beka-Kafra, ermitão”

Em 1950, um peregrino percebeu que a pedra sobre a qual se via a inscrição estava molhada, e o líquido era a transudação já característica do padre Charbel. Vale a pena mencionar que a distância entre a inscrição e o corpo era de mais de trinta centímetros, e de pedra maciça. A Ordem decidiu fazer uma segunda exumação, encontrando as relíquias no mesmo estado de conservação. O corpo foi sepultado na mesma cripta, e consta que permaneceu incorrupto até sua beatificação, em 1965.

Em 1950, o mosteiro de São Charbel começou o registro de milagres ocorridos junto ao túmulo. Em apenas dois anos, foram coletados mais de mil e duzentos aportes. Muitos dos milagres citados envolvem recuperações miraculosas de doenças e deformidades. Um relato excepcional é o de uma costureira que sofria de corcunda, assim como outras deformidades, desde a infância. Ela visitou o túmulo para rezar pelos seus familiares, e ficou curada. O médico que a tratava testificou sua miraculosa cura: ela tornara-se uma mulher normal sem deformação alguma. As curas aceitas para a beatificação de São Charbel incluem a cura de uma úlcera severa de estômago; a restauração da vista de um homem com a retina rasgada, e a cura de um câncer de garganta.

São Charbel foi canonizado no dia 8 de outubro de 1977. O Papa Paulo VI afirmou a respeito dele: “Ele ajudou-nos a entender, em um mundo frequentemente fascinado pelas riquezas e o conforto, o insubstituível valor da pobreza, da penitência e do ascetismo em libertar a alma em sua ascensão a Deus”.[3]

Por Rafael Ramírez


[1] Nome composto em aramaico que significa “Deus é Rei”.

[2] MAHFOUZ, Joseph. Saint Charbel Makhlouf. Paris: Jounieh. 2008. p.3 (Tradução pessoal)

[3] Cf.BALL, Anne. Modern Saints: Their lives and faces. Illinois: Tan Books and Publishers Inc. 1983. (tradução pessoal).

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