Santa Maria Egipcíaca: um Anjo do deserto
Após levar uma vida pecaminosa, Santa Maria Egipcíaca foi tocada pela graça de um modo inusitado, converteu-se e viveu no isolamento, sujeitando-se à mais austera penitência.
Redação (01/07/2021 11:56, Gaudium Press) Na época em que Santo Agostinho iluminava a humanidade com sua sabedoria, houve uma pecadora arrependida que, por suas enormes penitências, marcou profundamente a História da Igreja: Santa Maria Egipcíaca.
47 anos no deserto
Nasceu ela numa localidade do Egito e, aos 12 anos de idade, mudou-se para Alexandria onde levou uma vida de pecados, durante 17 anos.
Certo dia, ela conseguiu embarcar gratuitamente num navio que partiu com destino a Jerusalém. Lá chegando, dirigiu-se à Igreja do Santo Sepulcro, mas não conseguiu entrar porque foi repelida por uma força misteriosa. Por vinte vezes ela fez a tentativa, porém era impedida enquanto todas as pessoas entravam tranquilamente no templo.
Compreendendo que aquilo era uma consequência de sua vida pecaminosa, ela regressou à hospedaria e, diante de uma imagem de Nossa Senhora, ajoelhou-se, derramou abundantes lágrimas e prometeu renunciar ao mundo e viver na castidade.
No dia seguinte, ela entrou na igreja sem nenhum impedimento, confessou-se e comungou. E enquanto adorava a Santa Cruz, ela ouviu uma voz que lhe recomendava atravessar o Rio Jordão e ir para o deserto, a fim de levar uma vida de oração e penitência.
Maria transpôs esse rio e se estabeleceu no deserto, onde viveu durante 47 anos. Nos primeiros 17 anos foi assaltada por terríveis tentações, às quais ela resistiu valorosamente, fortalecida pelas graças obtidas através da Santíssima Virgem. Por fim, essas tentações violentas cessaram.
Encontro com um monge ancião e santo
Passados 30 anos, certo dia um velho e santo monge, chamado Zózimo, caminhando por aquelas regiões, deparou-se com uma mulher emagrecida, curtida pelo sol, e perguntou-lhe quem era e de onde vinha. Ela respondeu:
“Pai, perdoai-me, mas se vos revelar quem sou fugireis como à vista de uma serpente, vossos ouvidos serão manchados por minhas palavras e vós sereis empestado por minha impureza. Eu me chamo Maria e nasci no Egito.”
Em seguida, contou sua história. Ao final da narrativa, o ancião prosternou-se e bendisse a Deus. Ela, então, lhe disse:
“Ouvi o que vou pedir-vos: no dia da Páscoa, atravessai novamente o Jordão, trazendo convosco uma Hóstia consagrada. Eu esperarei na margem e receberei de vossas mãos o Corpo do Senhor, porque não mais comunguei, desde que aqui cheguei.”
Ela andou sobre as águas do Rio Jordão
O ancião regressou ao seu mosteiro e, na solenidade da Páscoa, foi até ao Jordão levando consigo a Sagrada Eucaristia.
Ao chegar ao rio, viu a penitente na outra margem e fez o Sinal da Cruz sobre as águas. Milagrosamente, ela andou sobre as mesmas e chegou até o monge. Este, maravilhado, quis se prosternar a seus pés, porém Maria disse-lhe:
“Meu pai, guardai-vos de vos prosternar diante de mim, sobretudo agora que trazeis o Corpo de Cristo! Mas dignai-vos voltar ainda o ano que vem.”
No ano seguinte, ele foi até o Jordão, porém não a encontrou na outra margem. Atravessou o rio e se dirigiu ao local onde a vira pela primeira vez. E lá a encontrou morta, estendida sobre a areia. Então, ele chorou amargamente e não ousava tocar em seus restos.
E enquanto pensava como enterrá-la, leu esta inscrição sobre a areia:
“Zózimo, enterrai meu corpo, dê minhas cinzas à terra e pedi por mim ao Senhor, pois fui liberta do mundo no segundo dia de abril.” Era o ano de 421.
Assim, o ancião abriu-lhe uma cova, sendo para isso milagrosamente auxiliado por um leão que ali apareceu. Sepultou-a e voltou ao mosteiro glorificando a Deus. [1]
Pulcritude do contraste entre o pecado e a penitência
A respeito desses fatos maravilhosos, comenta Dr. Plinio Corrêa de Oliveira:
“Consideremos a pulcritude do contraste aqui estabelecido entre o pecado e a penitência. Ela era uma pecadora péssima, uma mulher que durante 17 anos tinha vivido na pior das situações. […]
“Sabendo que haveria uma festa em Jerusalém, ela viaja por curiosidade e chega até à igreja; então à noção do pecado — do pecado escancarado e com sua hediondez — opõe-se a visão de um Deus três vezes santo e que tem horror ao pecado.
“Por vinte vezes, ela procura entrar na igreja, mas uma força invisível a impede: é Deus, infinitamente puro, infinitamente santo que, tendo horror ao pecado, não quer a presença do pecador maculado em seu santuário.
“Entretanto, há ao mesmo tempo a graça e a misericórdia de Deus. Ela volta para a hospedaria e começa então a cair em si, na solidão de seu quarto. […]
“Providencialmente há uma efígie de Nossa Senhora em seu quarto; Maria Egipcíaca encontra então a Mãe de Misericórdia e a Porta do Céu, reza para obter o perdão e é convidada para uma penitência extraordinária: ela se afasta completamente dos homens e vai fazer uma dessas penitências de assustar. […] Ela atravessa o Rio Jordão e se coloca num deserto, onde passa 47 anos sem ver ninguém.
“Então sua beleza de pecadora se esfuma no sol; ela está torrada, preta, causticada, endurecida, os seus trajes caem como andrajos. Ela está continuamente a rezar, numa solidão cheia de amor de Deus.
“Numa primeira fase Maria teve tentações, mas depois as tentações se retiram e ela fica fazendo uma penitência que é mais a penitência da inocência do que a do pecado. […] E Deus queria que, antes de morrer, ela recebesse essa suprema prova da reconciliação: a Comunhão.
Um leão ajuda a cavar a sepultura
“Então acontece que um santo varão — varão como era comum naquele tempo: de barba branca, todo vestido de preto, com um capuz comprido e pontudo, usando um bordão — vai andando pelo deserto […] e a vê. […]
“Santa Maria Egipcíaca está de tal maneira elevada no amor de Deus que, para receber a Comunhão, ela caminha sobre as águas. Deus perdoou tudo, esqueceu tudo, Se fez completamente amor para ela, a qual vive num conúbio com a graça divina o mais íntimo que se possa imaginar.
“No ano seguinte, o santo varão volta e ela não está à margem do rio. Ele atravessa o Jordão e encontra o corpo dela estirado no chão; sobre a areia ela escreveu algumas palavras, recomendando-lhe que a enterrasse.
“Para os funerais dessa espécie de Anjo do deserto vem o rei do deserto. […] O santo varão velho e o leão cavam a sepultura, na qual ela é colocada. […]
“Devemos pedir a ela que nos dê uma contrição verdadeira de nossos pecados, mas uma contrição na paz, sem escrúpulos; uma contrição verdadeiramente santa, que aproxime nossas almas de Nossa Senhora.” [2]
Por Paulo Francisco Martos
[1] Cf. VARAZZE, Jacopo de. La Légende Dorée. Paris: Garnier-Flammarion. 1967, v. I, p. 284-286.
[2] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Santa Maria Egipcíaca, exemplo de contrição. In revista Dr. Plinio. São Paulo. Ano XV, n. 169 (abril 2012), p. 22-25.
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