Qual é a melhor língua para falar com Deus?
“Domine, exaudi orationem meam et clamor meus ad te veniat! Hear my prayer, O Lord, and let my cry come unto Thee! Seigneur, écoute ma prière, sois attentive à mon appel! ¡Señor, escucha mi oración, atiende a mi súplica! Senhor, ouvi a minha oração, e chegue até Vós o meu clamor!
Redação (25/10/2023 10:36, Gaudium Press) Você já teve a sensação de que as suas orações não estão sendo ouvidas? Já pensou que pode estar rezando na língua errada ou menos apropriada para que os Céus se abram e ouçam o que você está tentando dizer a Deus?
De acordo com as Sagradas Escrituras, “toda a terra tinha uma só língua, e servia-se das mesmas palavras”, mas, depois que o homem construiu a imensa e imponente torre de Babel, em castigo à sua soberba, “o Senhor confundiu a linguagem de todos os habitantes e dali os dispersou sobre a face da terra”, e eles não mais se entenderam (cf. Gn 11, 1-9).
A partir de então, as línguas foram se multiplicando e, hoje, existem cerca de sete mil idiomas ativos em todo o planeta. Diante disso, em qual língua devemos nos dirigir a Deus para que Ele nos ouça e atenda às nossas orações?
A grandeza e a profundidade dos mistérios de Deus é algo que não conseguimos alcançar, mas tentemos fazer um exercício simples. Assim, por um instante, imaginemo-nos no lugar de Deus e ouçamos chegar a Ele o clamor das pessoas que oram em todas as partes da Terra.
Em que língua Jesus rezava?
Sérvio, hebraico, latim, inglês, francês, suaíli, espanhol, ilocano, português, iorubá…: qual delas sensibiliza mais o coração de Deus?
É de se supor que Jesus rezasse em hebraico ou em aramaico, embora seja provável que ele conhecesse e falasse também o grego e o latim, línguas muito importantes na época, como o inglês e o espanhol o são para nós hoje.
Por muito tempo, o grego foi o idioma dominante. O Novo Testamento foi escrito em grego, bem como a primeira grande tradução da Bíblia. Mais tarde, com a expansão da Igreja Católica, o latim tornou-se a língua oficial da fé, e até hoje muitas orações ainda são rezadas nessa língua.
No entanto, as orações em latim feitas pelo papa e pela cúpula do clero nos domínios da Santa Sé não têm impedido que as igrejas circunvizinhas ao Vaticano se esvaziem e muitas até sejam fechadas por falta de fiéis.
Também na Terra Santa cujo idioma oficial é o hebraico, muitas preces são pronunciadas nessa língua
Uma língua infalível
Eu já não sou uma pessoa jovem e, em muitos trechos do meu longo percurso, lutei contra a grande tristeza e o terrível desafio de sentir que rezava em vão, porque parecia que minhas orações não eram ouvidas por Deus.
Recentemente, conversando com um sacerdote pelo qual tenho grande estima, pude ouvir dele que essa angústia que tantas vezes me domina não é “privilégio” meu, porque muitos se sentem assim. Até santos passaram por isso.
Falamos longamente sobre a melhor oração e a maneira mais eficaz de sermos ouvidos por Deus, e muito me surpreendeu a língua que o padre me recomendou utilizar: “Esta língua é infalível! Aprenda-a e pratique-a, e o senhor verá que nunca mais as suas orações ficarão sem resposta”.
Assim que o ouvi, imaginei-me debruçado sobre livros ou diante de uma tela de computador reaprendendo gramática, vocabulário e conjugação verbal em outro idioma e já desanimei.
É difícil aprender latim!
– O senhor vai me desculpar, padre, mas não creio que obterei muito sucesso. Ao longo da vida, procurei adquirir um bom domínio sobre a língua portuguesa, que é a minha ferramenta de trabalho. Mas aprender latim a esta altura da vida? Não sei se serei capaz, preciso lhe confessar que nem inglês eu consegui aprender!
– Latim?! Meu filho, de onde tirou essa ideia? Seu Afonso, seu Afonso, não coloque palavras na boca do padre!
– Não é latim?
– Por certo que não! Se até boa parte do clero não se aplica a aprender o latim suficiente para as celebrações litúrgicas e os cantos gregorianos, tão belos e tão pouco executados, como iria exigir isso do senhor?
Confesso que respirei aliviado, mas a curiosidade continuou viva em minha mente. Foi então que o estimado sacerdote me deu uma lição preciosa sobre meditação, também conhecida como oração mental.
Aprenda a orar na língua dos anjos!
O padre me explicou que, de certa forma, sobretudo com o advento da internet, meditação virou moda e tem até instrutores e aplicativos para ensinar as pessoas a meditarem, com o uso de mantras e práticas estranhas importadas de outras culturas.
– Tudo isso é absolutamente desnecessário, seu Afonso! Para meditar bastam apenas três coisas: uma pessoa, Deus e um idioma.
Lá vem de novo a história do idioma, pensei. E quase dei um passo para trás quando o padre me falou que eu precisava aprender a orar na “língua dos anjos”. Virou carismático! Foi a primeira coisa que me veio à mente, afinal, “orar na língua dos anjos” ou “orar em línguas estranhas” é uma prática disseminada entre os católicos carismáticos e os evangélicos pentecostais.
Não vou dizer que duvido, mas, em muitos casos, não passa de uma repetição aprendida. Nesse sentido, senti o incômodo de me ver em meio a um monte de gente, gritando sílabas incompreensíveis! Lancei um olhar meio torto para o padre.
– Que olhar é esse seu Afonso?…
– O senhor vai me ensinar a rezar na língua dos anjos que nem…
Minha frase foi interrompida pelo riso do padre.
– Por quem me toma, seu Afonso? Imagine que vou lhe ensinar algo que ninguém entende, ninguém interpreta e ninguém traduz? Sobre isso, consulte os ensinamentos de São Paulo Apóstolo!
Palavras demais, respostas de menos
– Perdão, padre.
– Calma, meu amigo! O senhor não vai precisar aprender uma nova língua, apenas relembrar uma língua que já sabe desde pequenininho, a língua responsável pelos melhores sorrisos e expressões de tranquilidade daquela que lhe ensinou as primeiras palavras: a sua mãe.
É claro que o senhor não se lembra, como nenhum de nós, mas basta olharmos outros bebês para compreendermos. A criança chora, grita, esperneia e ninguém a compreende. A mãe se agita para tentar adivinhar a necessidade ou a dor que deixa seu filho naquele desespero. Então, quando, finalmente, a criança fica em silêncio, a mãe sorri, afaga e a balança calmamente em seu colo, e ela dorme satisfeita, recebendo a atenção que buscava.
Em certos momentos, sentimos necessidade de usar muitas palavras para tentar explicar a Deus a dimensão de nossos problemas. Às vezes, até gritamos, num clamor desesperado, contudo, é no silêncio que Deus nos ouve, fora da agitação. E é no silêncio que Ele nos responde. Palavras demais, respostas de menos…
É preciso acreditar, mesmo sem compreender
Incorporei o conselho do padre à minha prática devocional e tenho me surpreendido com o resultado. É muito comum reclamarmos que Deus não nos ouve e não nos atende. Muitos até mudam de religião, acreditando que em outro templo Deus estará mais presente, quando, na verdade, Ele está diante de nós e ao nosso lado o tempo todo. Basta nos calarmos, fazermos com que cesse o movimento de nossa língua.
Muito do que pedimos não nos é dado por razões que não conhecemos, afinal, nem tudo podemos compreender. No entanto, o excesso de palavras, a agitação e o desespero mais afastam do que aproximam de Deus, em cujos desígnios o fim último será sempre o nosso bem.
Então, seja suaíli, grego, espanhol, ilocano ou qualquer outra a língua de nossa expressão, quando aprendermos a fazer silêncio e a abrir o nosso coração, finalmente estaremos falando a língua que Deus entende e na qual Ele responde ao nosso clamor e à nossa oração.
Silencie, apenas silencie. O Senhor conhece todas as coisas e perscruta o nosso coração. Apenas estar calado, com fé, na presença dele, será suficiente para que Ele ouça, em profundidade, a sua oração.
Por Afonso Pessoa
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