Os ricos não irão para o Céu!
Não há nada de errado em querermos prosperar e melhorar de vida, mas nossas conquistas devem ser fruto de nosso esforço, de nosso trabalho e, sobretudo, da nossa fé.
Redação (30/04/2023 14:01, Gaudium Press) Uma das controvérsias mais antigas que existe, desde que o mundo é mundo, está na diferença entre pobres e ricos. Tornou-se muito comum dizer que os ricos não vão para o Céu. No entanto, muitos que assim o afirmam e querem ir para o Céu, também alimentam o desejo de se tornarem ricos.
Com base na premissa de que os ricos são inimigos de Deus e não merecem ir para o Céu, difundiu-se um dos maiores erros da história humana: que a divisão igualitária dos bens faria a todos ricos. Não, não faria. E também não faria a todos pobres, embora aumentasse consideravelmente o número desses, enquanto ricos permaneceriam os que criaram e difundiram essa falsa crença do igualitarismo.
Basta avaliar a realidade do comunismo implantado com a Revolução Russa: “divida-se quase tudo com quase todos, desde que nós, da cúpula, permaneçamos poderosos e ricos”.
E nem se precisa estudar História e Filosofia para adquirir esse conhecimento. Há um livrinho bem pequeno, do tipo que se lê em uma sentada, que dá perfeitamente conta do recado, A Revolução dos Bichos, de George Orwell, que, apesar de adepto do socialismo, foi o mais ferrenho e lúcido crítico da situação de opressão gerada na extinta União Soviética, concluindo que “todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros.”
O dinheiro move o mundo
Que fique claro que não sou um homem rico, portanto, tenho toda pertinência para falar dos ricos com isenção e imparcialidade. Fosse eu rico e minhas palavras poderiam gerar suspeição.
Então, façamos, primeiramente, um exercício de lógica: tirando raríssimas exceções, como São Francisco de Assis e outros grandes santos, ninguém deseja ou sonha com o dia em que se tornará pobre, mas quase a totalidade dos que o são sonham ardentemente com o dia em que possam se tornar ricos – vide as vultosas somas arrecadadas com as apostas nas loterias! Assim sendo, é de se crer que, quem aos ricos critica o faz mais por inveja do que por senso de justiça.
Dinheiro é o poder que faz girar o mundo. O dinheiro move a economia, gera empregos, possibilita o desenvolvimento, fomenta a cultura, incentiva o plantio, facilita a construção de moradias, incrementa o avanço científico e sustenta até mesmo as missões de apostolado e evangelização.
Todos precisamos de dinheiro e nada se faz sem ele; o problema está em nos tornarmos por ele dominados, e isso pode acontecer tanto a ricos quanto a pobres; e o orgulho, o egoísmo e a avareza podem atingir milionários e miseráveis com igual força de destruição.
Há uma pergunta que poderia me levar à forca se por aqui forca ainda houvesse: o que seria dos pobres sem os ricos? A geração de empregos, a produção de riquezas, o desenvolvimento de novas tecnologias, a descoberta de remédios e tratamentos capazes de curar muitas pessoas vêm do dinheiro dos ricos.
Mas, para me redimir e me livrar do fantasma da forca, faço também a pergunta contrária: o que seria dos ricos se não fossem os pobres? Afinal, o trabalho braçal, o trabalho pesado, o plantio, a colheita, o transporte, a transformação da matéria prima, tudo isso é feito pelos pobres.
Bem-aventurados os pobres de espírito
Contudo, a pergunta mais exata é: o que seria do ser humano sem Deus? O que seria da vida na Terra se as pessoas não cumprissem o seu papel? Quão melhor seria o mundo se todos agíssemos com docilidade nas mãos do Oleiro?
Um mundo só de ricos seria uma utopia e pouquíssimo duraria, e um mundo só de pobres seria um caos e findaria por falta de recursos e condições adequadas.
No Sermão da Montanha, Nosso Senhor Jesus Cristo disse: “Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos céus” (Mt 5, 3). E, ser pobre de espírito não significa, necessariamente, ser materialmente pobre. Uma pessoa pode ser rica, ter muitas posses, mas ser humilde, generosa, cumprir os mandamentos, frequentar os sacramentos; ser, enfim, pobre de espírito.
Ah, mas Jesus falou que os ricos não entrarão no Reino dos Céus. Será que falou mesmo?
Muitos se apegam ao Sermão das Bem-aventuranças para embasar os seus argumentos de que o Céu foi feito para os pobres, entretanto , se lermos o texto com a devida atenção, perceberemos que não foi isso que Nosso Senhor falou. Ele não disse que todos os pobres entrariam no Céu nem que era preciso ser pobre para conseguir entrar no Céu.
Há pobres tão insolentes, de espírito tão arrogante, tão cobertos pela cobiça, pela ganância e pela inveja, que se põem numa redoma que os impede de experimentar a abundância e viver na graça de Deus.
O camelo no fundo da agulha
Ah, mas Jesus falou que “era mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus”. Sim, falou. E tem muita gente que dá a isso uma explicação tosca, afirmando que, ao dizer “camelo”, Nosso Senhor estava se referindo a uma corda ou a uma linha mais grosseira, uma espécie de barbante, que seria difícil passar pelo buraco da agulha, ou às portas dos camelos nas muralhas de Jerusalém.
Embora não seja um teólogo, eu sou da opinião que, quando o Mestre disse “camelo”, Ele estava falando de camelo mesmo. E que quem inventou essa história de corda, barbante ou porta certamente não foi uma pessoa rica, mas algum pobre desejoso de ser rico e rancoroso por não sê-lo. Jesus não desperdiçaria uma oportunidade de ensinar uma lição profunda com um exemplo tão óbvio, de uma linha grossa ou de uma porta especial.
Ele usava, sim, a linguagem figurada, mas o fazia de forma a dar-nos choques de realidade. Compreendo que Ele quis demonstrar o perigo do apego à matéria que alguns ricos, infelizmente, têm, por isso o exemplo superlativo do camelo. Mas quantos pobres há que também são apegados ao dinheiro e, pior, ao dinheiro que não possuem e foi dado a outros para administrar?
Deus não julgará as pessoas por serem ricas, pobres, homens, mulheres, religiosos, leigos, trabalhadores ou investidores. Deus julgará cada um pelo seu coração e pelas suas ações. Os que são ricos precisam fazer bom uso da sua riqueza e os que são pobres devem cumprir muito bem a sua missão, seja ela qual for. Tanto uns quanto outros devem agir em conformidade com a vontade de Deus.
É importante considerar também a necessidade de nos desenvolvermos, melhorarmos e aperfeiçoarmos, agradando a Deus com as nossas ações. Jesus Cristo nos mostrou a sabedoria na parábola dos talentos, os quais devem ser multiplicados e dar frutos, não para a nossa vaidade e usufruto, mas para a glória de Deus.
Não depende de quanto temos
Deus não nos criou para a mediocridade, para a mendicância, para a miséria, e deseja o nosso progresso constante. De Abraão a Davi, a quantos Ele abençoou com posses e bens materiais? Portanto, não há nada de errado em querermos prosperar e melhorar de vida, mas nossas conquistas devem ser fruto de nosso esforço, de nosso trabalho e, sobretudo, da nossa fé. O que não podemos é desejar o que é do outro ou desejar que, se não podemos enriquecer, que o outro também empobreça, apenas para nos sentirmos melhor, de acordo com nosso tacanho senso de justiça.
Na parábola dos talentos, o Senhor deixa muito claro que, ao que foi fiel no pouco, Ele concederá mais, mostrando que existe uma lei da abundância e da prosperidade. Essa lei não depende do quanto se tem, mas que proveito se tira para Deus daquilo que se tem, daquilo que Deus nos concedeu.
É fundamental não termos apego aos bens materiais, e isso também não depende do quanto temos, mas sim da forma como nos deixamos envolver pelo que temos, ou até pelo que não temos, porque há muita gente que possui muitos bens e muitas riquezas e vive como se não possuísse; e muitos que se fazem escravos daquilo que nem possuem, roubando, adulterando e praticando toda sorte de delitos para se apossar daquilo que não é seu por direito, que pertence ao outro.
Há situações de fome e de miséria que poderiam ser melhoradas pela ação dos que possuem muito? Sem dúvida, há, e possuir e não compartilhar é um pecado grave. Porém, há pessoas que, mesmo tendo condições de trabalhar e progredir, por decisão própria, passarão a vida inteira de esmolas e de favores, porque se afeiçoaram a isso e não desejam viver de outra maneira.
A esmola ao homem são
Há uma música de um cantor popular que diz: “Ao se dar uma esmola para um homem que é são, ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão.” E existem muitos que estão viciados em pedir, em explorar, em querer tirar do outro aquilo que acreditam que deveria ser seu. E, não nos iludamos, há pobres e há ricos que agem dessa maneira. Há mendigos espirituais, mendigos emocionais.
Para muitos a riqueza não pesa, pois sabem administrar os bens que possuem – e com eles gerar recursos e possibilidades–, usufruir sem afetação e multiplicar com inteligência. Estes caminham leves pela vida. E outros que, não tendo e não precisando passar pela muitas vezes aflitiva prova da riqueza, ainda assim, vivem curvados sob o peso da inconformidade e da revolta; é como se carregassem pedras sobre os ombros. Pesa-lhes não ter e pesa-lhes ver que o outro tem.
Ser rico ou ser pobre são apenas dois papéis que vivemos na vida e, embora a cruz do pobre pareça pior, a do rico pode ser muito mais pesada. Se temos ou se não temos, não é isso que importa a Deus, mas sim a maneira como conduzimos e zelamos pelo que nos foi colocado nas mãos.
Devemos procurar progredir em todas as circunstâncias e a tudo agradecer, certos de que Deus sempre fará o melhor para nós. Se ricos ou pobres, o importante é vivermos desapegados de tudo o que temos e de tudo o que Deus não nos deixou possuir, e vivermos para amar e fazer a vontade de Deus em todas as coisas.
Por Afonso Pessoa
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