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O prêmio concedido aos que mais amam

Na manhã de domingo as mulheres acorreram ao sepulcro para prestar as últimas homenagens ao Corpo do Senhor. E o próprio Jesus, desejando recompensá-las, foi ao seu encontro anunciar as alegrias da Páscoa.

A Ressurreicao do Senhor por Fra Angelico Museu de Sao Marcos Florenca Italia Foto Gustavo Kralj

Redação (08/04/2023 10:25, Gaudium Press) A Igreja, ciosa de revestir a comemoração da Páscoa com a devida pompa, a celebra durante cinquenta dias, considerando-os como um só. Iniciam-se com a celebração da Vigília Pascal, designada por Santo Agostinho como “mãe de todas as santas vigílias”,[1] e se alongam como manifestação da alegria de todos os cristãos até o Domingo de Pentecostes.

A cerimônia litúrgica desta Vigília começa no exterior do templo, após o cair da noite, com a bênção do fogo, num rito que encontra sua origem nos primeiros séculos da Igreja. Esse fogo novo acende o Círio Pascal, símbolo do próprio Jesus Cristo que rompe as trevas da Lei Antiga e da escravidão ao pecado, para trazer às almas a salvação. Já no interior do recinto sagrado, a chama do Círio estende-se às velas de todos os fiéis ali reunidos como representação da Igreja inteira com suas lâmpadas acesas, em sinal de vigilância, à espera do Senhor.

A cena da assembleia imersa nas trevas leva-nos a reviver por alguns instantes a longa expectativa da humanidade até o advento de Nosso Senhor Jesus Cristo. Nesses séculos houve atroz sofrimento, súplicas, e muitas lágrimas foram derramadas. Seriam elas transformadas em alegria? As promessas divinas indicavam que sim. Esta viria não do esforço ou de um mérito adquirido, mas do perdão.

Não era possível que o mundo fosse redimido sem um grandioso ato de misericórdia, indispensável para purificar o gênero humano da culpa original e dos pecados atuais. A sequência de leituras proposta para a Solenidade de hoje indica os rumos pelos quais Deus conduziu seu povo, com o intuito de educá-lo, até operar a Redenção.

Contudo, levando em conta a extensão das leituras e seus inúmeros ensinamentos, adentrar-nos-emos de forma especial nas ricas considerações que o Evangelho nos traz.

O solene anúncio da Ressurreição

“Depois do sábado, ao amanhecer do primeiro dia da semana, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o sepulcro” (Mt 28,1)

Movidas pelo amor, Maria Madalena e a outra Maria dirigiam-se ao sepulcro para concluir a preparação fúnebre do Corpo sagrado e adorável de Nosso Senhor Jesus Cristo (cf. Mc 16, 1; Lc 24, 1). Estavam preocupadas de que os cuidados aplicados na sexta-feira não houvessem sido suficientes devido à urgência em concluir a tarefa antes do início do descanso sabático (cf. Jo 19, 38-42).

Transparece nesta cena, especialmente em Santa Maria Madalena — que deve ter sido quem demoveu a outra com seu entusiasmo —, o amor levado às últimas consequências. Era ela uma alma de eleição, não conhecendo limites sua caridade, apesar das fraquezas da vida passada de que já havia sido perdoada. À medida que se firmou nesse amor, também se identificou mais com o Mestre, disposta a fazer tudo por Ele.

Com efeito, em poucos personagens do Evangelho encontramos uma reciprocidade tão perfeita em relação a Jesus como na irmã de Lázaro e Marta, e por este motivo ela é modelo de amor. Amor vigilante e solícito, que não faz economia e enfrenta qualquer situação; amor que a incita à preocupação pelo que advenha ao Amado; amor que não tem respeito humano, pois enquanto os Apóstolos estão escondidos, ela não mede esforços nem sacrifícios, decidida até a rolar a pedra do sepulcro com as mãos, discutir com os guardas, implorar e provocar um tumulto, se necessário fosse. Por quê? Ela deseja embalsamar o Corpo d’Aquele a quem adora:

“O amor de Madalena a torna intrépida: nem o silêncio da noite, nem a solidão do lugar, nem a morada dos mortos, nem a aparição dos espíritos a apavoram; ela apenas teme por não ver o Corpo de seu Mestre para Lhe render as últimas homenagens”.[2]

Portentosos sinais da Ressurreição do Senhor

Jesus ressuscitou de forma portentosa:

“De repente, houve um grande tremor de terra: o Anjo do Senhor desceu do Céu e, aproximando-se, retirou a pedra e sentou-se nela. Sua aparência era como um relâmpago, e suas vestes eram brancas como a neve. Os guardas ficaram com tanto medo do Anjo, que tremeram, e ficaram como mortos” (Mt 28,2-4)

São Mateus empenha-se em ressaltar o aspecto grandioso da Ressurreição: em sua narrativa, o forte tremor de terra parece um episódio do Antigo Testamento, e o Anjo que desce do Céu aproxima-se, retira a pedra e nela se senta tem uma magnificência peculiar. Ora, os guardas que presenciaram esta cena, além de ficarem aterrados, a ponto de desfalecerem, viram ademais, frustrado o objetivo que os levara para junto do sepulcro: comprovar que o Homem-Deus não passava de um mortal. A contragosto e para seu castigo, converteram-se eles em testemunhas oculares do maior prodígio havido na História.

Entretanto, às santas mulheres, o anjo aparece não mais terrificando, mas incutindo fé e confiança:

“’Não tenhais medo! Sei que procurais Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui! Ressuscitou, como havia dito! Vinde ver o lugar em que Ele estava. Ide depressa contar aos discípulos que Ele ressuscitou dos mortos, e que vai à vossa frente para a Galileia. Lá vós O vereis. É o que tenho a dizer-vos’” (Mt 28,5-7)

O Anjo transmite às mulheres uma incumbência: comunicar aos discípulos a notícia da Ressurreição, pois, abatidos pelo desânimo e decerto pesarosos por sua própria prevaricação, a Morte de Nosso Senhor lhes poderia dar a ideia de que Ele Se esquecera dos que estimava.

Elas partem ansiosas por transmitir esta grande notícia, e de repente Jesus lhes veem ao encontro, dizendo:

“Alegrai-vos!” As mulheres aproximaram-se, e prostraram-se diante de Jesus, abraçando seus pés” (Mt 28,9)

No intuito de animar as Santas Mulheres, o próprio Jesus tomou a iniciativa de ir ao encontro delas, mostrando que Ele vai à procura dos que realmente O amam. E eis que a sua primeira palavra é “Alegrai-vos!”, para, em seguida, permitir que Lhe abraçassem os pés.

Há aqui um paradoxo: outros evangelistas descrevem que primeiro aparecera à Santa Maria Madalena, a quem Jesus disse: “Não me toques” (Jo 20,17), e depois às Santas mulheres. Ora, Jesus não deixou que ela externasse toda a sua veneração, mas pelo contrário, às Santas Mulheres, deixou que segurassem seus pés. Por que?

Santa Maria Madalena tinha uma fé robusta e o Mestre não queria tirar-lhe o mérito de crer sem tocá-Lo. Jesus estava como que a dizer-lhe: “Não Me toques, porque Eu te reservo um mérito maior: o de crer sem comprovar”. Todavia, a ela, que já Lhe havia dado mostras de muito amor (cf. Lc 7,47), Jesus concedeu a graça de vê-Lo por primeiro.

Arautos da Ressurreição nomeadas pelo Senhor

Depois do imenso favor de permitir que tocassem em seu Corpo ressurrecto, Nosso Senhor deixa um recado destinado aos discípulos: que partissem rumo à Galileia para um encontro, pois Ele não havia desaparecido. Assim, o Salvador as constitui arautos para propagar a Boa-nova da Ressurreição, que os próprios Apóstolos ainda não conheciam.

Que modo de proceder contundente para os padrões estabelecidos pela sociedade da época! Os Doze, que eram Bispos e foram os primeiros a comungar o Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, são obrigados a receber a notícia através de mulheres! Eles fraquejaram, fugiram de medo e acabaram sendo postos à margem na hora da Ressurreição, pois Jesus quis dar um prêmio às que não haviam faltado à caridade.

Não será que, se não nos convertermos a um amor tão intenso quanto Ele espera de cada um, seremos ultrapassados pelos que consideramos inferiores a nós? Sejamos verdadeiramente fervorosos, para que isto não nos aconteça!

Por Guilherme Motta

Extraído, com adaptações, de:

CLÁ DIAS, João Scognamiglio. O inédito sobre os Evangelhos: comentários aos Evangelhos dominicais. Città del Vaticano-São Paulo: LEV-Instituto Lumen Sapientiæ, 2013, v. 7, p. 355-371.


[1] SANTO AGOSTINHO. Sermo CCXIX. In Vigiliis Paschæ, I. In: Obras. 2. ed. Madrid:BAC, 2005, v. XXIV, p. 307.

[2] DUQUESNE. L’Évangile médité. Paris: Victor Lecoffre, 1904, v. IV, p. 386.

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