Itália se despede do Irmão Biagio
Biagio Conte, fundador da instituição de caridade “Missão Esperança e Caridade”, faleceu ontem, 12/01, aos 59 anos, após uma longa batalha contra um câncer. O missionário trabalhou cerca de 30 anos auxiliando e alimentando os sem-teto na região da Sicília.
Redação (13/01/2023 11:16, Gaudium Press) Faleceu no dia 12,01, aos 59 anos, o Irmão Biagio Conte, fundador da “Missão Esperança e Caridade”, em Palermo, capital da Sicília. O missionário dedicou-se de tal forma à caridade e à acolhida dos necessitados que ficou conhecido como o “São Francisco de nossos dias”. Seu funeral acontecerá na próxima terça-feira, 17, na Catedral de Palermo. Pelo menos 10 mil fiéis são aguardados para a cerimônia.
Irmão Biagio fundou a instituição de caridade “Missão Esperança e Caridade” em 1993, e o reconhecimento por sua persistente atuação em favor dos pobres e necessitados ultrapassou os limites de Palermo e se espalhou por toda a Itália e várias partes do mundo. Foram pelo menos 30 anos de atuação no auxílio e defesa de milhares de pessoas em situação de desamparo. Sua trajetória foi retratada em um filme e vários documentários.
O presidente da Itália, Sergio Mattarella, foi um dos primeiros a manifestar pesar pelo falecimento do missionário. “Tomei conhecimento com profunda dor da triste notícia da morte do Irmão Biagio, ponto de referência, não só em Palermo, para aqueles que acreditam nos valores da solidariedade e da dignidade”.
O prefeito de Palermo, Roberto Lagalla, lamentou a morte do Irmão Biagio, afirmando que ele deixa “um vazio insuportável”, e o governador da Sicília, Renato Schifani, disse que o exemplo do missionário seguirá “mais vibrante do que nunca”.
“Testemunha de Deus na cidade dos homens”.
Ao receber a notícia da morte do Irmão Biagio, o arcebispo de Palermo e primaz da Sicília, Dom Corrado Lorefice, conclamou os católicos a rezarem e “fazerem gestos concretos de caridade, reconciliação e paz”.
Em comunicado oficial, a Arquidiocese de Palermo se refere ao missionário como “testemunha de Deus na cidade dos homens”: “Hoje o Senhor chama cada um de nós a recolher o testemunho de tão brilhante exemplo. A sua vida, sinal para toda a cidade dos homens, manifesta a fé em Deus alimentada pelo Evangelho, a esperança vivida na pobreza radical e a caridade sem limites que contribui para a transfiguração da convivência humana a partir dos mais pobres”.
A Igreja local recordou que a obra do Irmão Biagio foi “animada e confirmada pela visita do Papa Francisco (2018), porque manifesta o rosto da Igreja pobre e dos pobres”.
Quem era Biagio Conte?
Nascido em Palermo, em 1963, filho de empreiteiros, Conte chegou a trabalhar na construtora da família quando adolescente, mas, devido a uma profunda crise espiritual, decidiu deixar tudo de lado, em 1983, indo morar em Florença.
Algum tempo depois, ele foi viver como eremita nas montanhas do interior da Sicília. Depois de fazer uma peregrinação a pé até a cidade de Assis, decidiu partir para a África, como missionário, mas, antes de viajar, passou em Palermo para se despedir de seus familiares. Porém, ao ver a situação em que se encontravam os pobres de sua cidade, decidiu ficar e, em 1993, criou a Missão Esperança e Caridade.
Ao longo do tempo, a Missão construiu várias casas para os pobres da cidade e um abrigo para mulheres e crianças, ajudando pelo menos mil pessoas a terem um teto para viver.
Irmão Biagio usava túnica e um bastão, como um eremita. Além do esforço para dar abrigo e comida aos necessitados, fez greves de fome e protestos na tentativa de sensibilizar as autoridades sobre temas importantes ligados aos direitos humanos.
Num desses protestos, pedia o fim das rejeições de barcos com migrantes no Mediterrâneo, criticando com veemência algumas multinacionais que operam no continente africano: “Considero absurdo, injusto e inconcebível que há tantos anos a Itália e a Europa vendam armas no mundo inteiro, particularmente na África; não só isso, mas tantas multinacionais com interesses muito fortes, estão explorando injustamente os diversos países africanos, enriquecendo apenas 10% daquela nação, enquanto a grande maioria da população morre de fome”, criticou.
Estrangeiros em uma terra estrangeira
Suas palavras costumavam ser duras: “Lembremos que nós, italianos, também fomos imigrantes, nos períodos antes e depois da Primeira Guerra Mundial e no período da Segunda Guerra Mundial. Estamos espalhados por diferentes nações do mundo e, ainda hoje, nossos jovens terminam seus estudos e depois, não encontrando trabalho, emigram para o norte da Itália e Europa. E assim descobrimos que somos todos estrangeiros em uma terra estrangeira, diz o bom Deus, e somos todos irmãos e irmãs, não deve haver diferença entre as pessoas e entre as nações, ajudemo-nos uns aos outros”.
Irmão Biagio foi um trabalhador incansável em luta pela solução dos problemas provocados pelas desigualdades sociais, exploração e abandono dos mais fracos, sendo admirado por seu empenho em defender os necessitados e respeitado pelas opiniões firmes, que nunca deixou de expressar.
Em um comunicado – considerado por alguns como sua carta de despedida – , escrito em 2021, quando afastou-se de suas atividades na Missão para um longo retiro, Irmão Biagio escreveu: “Agora chega. Com todo esse mal de viver, alteramos e transformamos o ser humano em objeto descartável – nos usamos e nos descartamos, viramos lixo, como fotocópias. Atropelamos a vida, o papel do homem e da mulher, reviramos e ofendemos os sexos, a dignidade e o respeito dos homens e das mulheres. Cuidado porque estamos produzindo novos ídolos, monstros terríveis, violências sobre violências, homicídios atrozes e opressão, em breve nos devoraremos uns aos outros.”
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