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Eu não lhe daria tal pai…

1º de novembro, dia da Solenidade de Todos os Santos, por volta das 2h30 da madrugada, um santo cerra seus olhos na terra para abri-los no Céu, onde o aguardam, em expectante gaudium, toda a miríade de santos diante dos quais, humilde, ele sempre se ajoelhou e em cujo concurso confiou. Três formosas damas o conduzem diante desse cortejo; uma delas, Maria, seu grande amor.

Mons joao cla

Redação (05/11/2024 15:45, Gaudium Press) Órfão de pai desde o seu nascimento, quis Deus que o meu filho fosse “adotado” pelo melhor pai que alguém poderia ter nesta terra. E hoje, ao vê-lo em pé, à cabeceira do esquife de seu pai espiritual, e o respeitoso carinho com que arrumava as almofadinhas vermelhas que serviam de apoio à cabeça de Monsenhor João Clá, um longo filme se passou em minha memória…

Meu filho era ainda um menino, perto de completar 14 anos, quando conheceu Monsenhor. Na época, Seu João.

Lembro-me bem de que ele teve uma fase em que se dedicou a colecionar cartões telefônicos. Comprei-lhe uma grande pasta que logo ficou repleta deles. Familiares, colegas de trabalho, sempre tinha alguém me dando cartões para levar a ele.

Aquela coleção era a menina de seus olhos e, sempre que possível, íamos juntos à grande loja da (extinta) Telesp, no centro de São Paulo, perto da Praça da República, em busca de alguma raridade.

Hoje muita gente nem sabe o que é um cartão telefônico, que usávamos nos orelhões para fazer chamadas. Alguns eram simples, mas havia cartões com imagens muito bonitas e eu me divertia vendo o cuidado e a disciplina com que o meu menino cuidava daquela sua coleção até o dia…

Uma decisão inusitada

Quando ele chegou e me disse que ia se desfazer de sua preciosa coleção, estranhei aquilo. Então, ele me explicou que tinha conhecido o “Seu João” e que recebera uma acolhida tão boa e tão grandes conselhos daquele homem “que parecia ver a sua alma” que queria dar a ele um presente especial e decidira dar o que tinha de mais precioso: a sua coleção de cartões!

A pergunta que eu lhe fiz foi repetida por Monsenhor: “Você tem certeza de que quer fazer isso, meu filho?”

A minha pergunta só se referia ao fato de ele se desfazer de algo que gostava tanto, porém a pergunta do “Seu João” era muito mais profunda. Com efeito, ele compreendia que, com aquele gesto, com aquela decisão inusitada, aquele rapazinho estava entregando seu bem mais precioso, não a ele, mas a Nossa Senhora. Não se tratava da rara coleção de cartões, mas da própria alma.

Monsenhor deu a vida para o Céu

Agradeço muito a Deus por sua infinita misericórdia, tendo permitido que eu criasse meu filho sozinha, dando a ele tudo o que um filho precisa e deve receber de uma mãe e, depois, escolhendo para ele o melhor dos pais, a fim de que, das mãos daquele santo homem, ele recebesse a parte da educação e dos ensinamentos que cabe a um filho receber do pai.

Ao meu filho, eu dei a vida na terra. Ao meu filho, Monsenhor deu a vida para o Céu. E neste dia, em que, de longe ­acompanho as suas exéquias – pois moro em outra cidade e só poderei me despedir dele no domingo, observando o semblante de tantos filhos que se despedem desse zeloso pai, dentre eles o meu – compreendo que eu não lhe daria tal pai, ainda que me casasse com o mais poderoso rei. Esse pai, somente Deus poderia lhe dar. E deu.

1º de novembro, dia da solenidade de Todos os Santos, por volta das 2h30 da madrugada, um santo cerra seus olhos na terra para abri-los no Céu, onde o aguardam, em expectante gaudium, toda a miríade de Santos diante dos quais, humilde, ele sempre se ajoelhou e em cujo concurso confiou.

Três formosas damas o conduzem diante desse cortejo. Uma delas, Maria Santíssima, tendo, a um lado, Dona Annitta, sua mãezinha querida e, do outro, sorridente e amável, Dona Lucilia, com seu inconfundível chale lilás.

(Escrito pela mãe de um sacerdote Arauto)

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