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Em busca da imortalidade

“No fundo, almejavam e procuravam com tal ardor uma felicidade meramente terrena que, se fosse possível, quereriam passar a eternidade neste mundo”.

Equipamentos utilizados para preservar os cadáveres Foto: Divulgação

Equipamentos utilizados para preservar os cadáveres Foto: Divulgação

Redação (13/07/2025 11:23, Gaudium Press) Uma das situações mais comoventes com que podemos nos deparar é a dor de uma mãe diante da perda de um filho. Pior ainda se o filho tirou a própria vida e, incomparavelmente pior, se a falta de fé dessa mãe a faz encarar a morte como o fim absoluto de tudo.

Há dois meses, circulou na internet a notícia de uma atriz australiana que estava fazendo uma vaquinha virtual com o objetivo de arrecadar 300 mil dólares (cerca de 1,1 milhão de reais) para congelar o corpo do filho de 13 anos. Um lindo menino que, segundo a mãe, tirou a própria vida após ser vítima de bullying na escola.

Ao pedir auxílio financeiro para o seu ousado objetivo, a mãe lançou um apelo desesperado: “Só temos mais uma chance de preservar o corpo dele criogenicamente nos próximos sete dias. Se perdermos essa janela, perdemos também a chance de qualquer possível reanimação futura que a ciência possa oferecer”.

Não houve notícia sobre o resultado da tentativa de arrecadação do valor, e é provável que o propósito não tenha sido atingido, uma vez que, no dia da publicação, apenas 2% do valor tinham sido levantados.

As promessas da criogenia

A técnica de criopreservação pós-morte, também conhecida como criogenia, consiste em armazenar corpos humanos em baixas temperaturas com o auxílio do nitrogênio líquido.

O objetivo é impedir a decomposição e manter as estruturas biológicas preservadas para que a pessoa “retorne à vida”, caso a ciência avance a este ponto no futuro. No processo, o corpo é congelado em temperaturas que variam entre 130ºC e 196ºC negativos.

Embora não exista nenhuma tecnologia capaz de reanimar um corpo humano preservado dessa forma, com base no sucesso do congelamento e descongelamento de embriões, pessoas procuram por esse tipo de serviço na esperança de que, no futuro, a ciência evolua e possam retornar à vida.

Normalmente a criogenia é procurada por milionários que rejeitam a possibilidade da morte, mas há também diversos casos de corpos que são congelados a pedido de seus familiares. Estima-se que existam cerca de 600 corpos congelados atualmente.

O destino das almas

Diante de uma situação tão bizarra, não consigo me furtar a algumas conjecturas… Tento imaginar como seria a situação de uma alma cujo corpo tivesse sido congelado e que fosse para o Céu (embora deva ser improvável que alguém tão apegado à vida e que tenha manifestado o desejo de passar por esse processo a ponto de não querer deixar a Terra esteja em condições de ir para o Céu).

Mas, na hipótese de que vá, e considerando que o Céu é o inenarrável – segundo São Paulo, “o que os olhos não viram e os ouvidos não ouviram” ­–, que desagradável seria ter essa grandiosidade diante de si e saber que seu corpo, em vez de voltar ao pó do qual foi feito, está congelado e encerrado em um tubo de nitrogênio na Terra, em condições tão lamentáveis, esperando um ressuscitamento artificial.

O correto seria, diante de tantas agruras e dificuldades neste vale de lágrimas, desejar ser santo para ir ao Céu e não querer ficar para sempre na Terra. Imaginemos, estar num lugar que é indescritível e tão magnífico, e ver o nosso corpo congelado, num lugar tão pequeno, insignificante e tão cheio de dores e sofrimentos…

E se Deus permitisse que os efeitos da criogenia fossem sentidos pela alma?

Há muitos anos, precisei fazer uma aplicação de nitrogênio líquido em uma pequena verruga plantar, próxima à unha de um dos dedos do pé direito. Foi uma das piores dores que senti na minha vida. Um gelado que queima e provoca uma dor que se prolifera por toda a perna. Algo verdadeiramente infernal. Embora seja uma técnica aplicada a um corpo sem vida, imagino que desesperador seria se essa dor pudesse ser sentida pela alma…

A longevidade a qualquer custo

A sabedoria dos Salmos nos ensina que “setenta anos é o total de nossa vida, os mais fortes chegam aos oitenta. A maior parte deles, sofrimento e vaidade, porque o tempo passa depressa e desaparecemos” (Sl 89, 10).

Se temos essa média de tempo de vida é porque assim o Senhor estabeleceu. No entanto, há muita gente que procura a longevidade a todo custo, tentando prolongar ao máximo os seus dias sobre a Terra, como se só a Terra existisse.

Na tentativa de não envelhecer, ou ao menos de não aparentar envelhecimento, as pessoas gastam grandes somas de dinheiro e se submetem a tratamentos que são verdadeiras torturas, e processos de harmonização facial que as deixam irreconhecíveis até para si mesmas.

Porém, tudo passa e esses cultores do corpo e da beleza também passarão, ainda que, em vida, já estejam fazendo os acertos para que seus corpos sejam congelados. Querem a longevidade a qualquer custo.

Mas como seria acordar num futuro distante, num mundo modificado, sem a presença dos familiares, amigos e afetos do passado?

Diferente da promessa de Jesus de que ressuscitaremos em corpos gloriosos, que desagradável seria ressurgir num corpo mortal, envelhecido, talvez doente e artificialmente preservado num frio que queima…

Num comentário ao Evangelho de Domingo de Ramos, lembrando as aclamações diante da entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, Monsenhor João Clá explicou com muita propriedade como aquele povo, na verdade, queria um Messias político, que lhe desse um reino temporal: “No fundo, almejavam uma felicidade meramente terrena e, com tal ardor a procuravam, que se fosse possível, quereriam passar a eternidade neste mundo.”

Assim é ainda hoje. Muitos e muitos temem a morte por verem-na como fim absoluto e, por isso, se apegam desesperadamente a esta vida. Se pudessem, desejariam mesmo passar a eternidade neste mundo. Os que podem pagar, tentam comprá-la.

A falta de Deus

Este lamentável medo da morte e desejo de permanecer na vida são fruto da falta de fé e do desprezo a Deus. Que terrível, que ignomínia não desejar estar com Deus! Desprezá-Lo a ponto de escolher ficar na Terra e se manter distante d’Ele!

Que triste pensar que há tantas pessoas como esta mãe australiana que sofreu a tragédia de ver uma criança de 13 anos tirando a própria vida. Será que uma criança que tivesse sido apresentada a Deus, feito a catequese, a Primeira Comunhão, e tivesse sido ensinada a rezar e a ir à igreja, teria tido a mesma atitude diante da dor provocada pelo bullying que sofreu?

Se uma mãe se relacionasse com Deus, se tivesse entregado a Ele a sua vida e depositado n’Ele as suas esperanças, não teria tido melhores condições para lidar com a dor do filho e instrui-lo nos caminhos da fé e da esperança?

Mesmo que tivesse perdido seu filho, por esse ou por outro motivo, se tivesse Maria em sua vida, não iria agarrar-se a essa Mãe maravilhosa e buscar alento junto d’Ela?

E, embora tivesse de enfrentar o inevitável sofrimento da morte do filho, a certeza da vida eterna acalentaria de alguma forma o seu coração e, em vez de ceder ao desespero e fazer uma vaquinha para levantar em pouco tempo uma quantia tão alta para congelar o corpo do menino, poderia abraçar uma ação caridosa, ajudando outras mães e outras crianças.

Não confiar em Deus leva a esses extremos, a sofrimentos sem solução e à irrefletida revolta. Esse é o tipo de situação que, não confiando, a pessoa acaba primeiramente culpando a Deus por sua tragédia, e depois passa a odiá-Lo e repeli-Lo um pouco mais!

Lembremo-nos de rezar pelas pessoas que vivem situações tão tristes, e nunca deixemos de agradecer a Deus pelo dom da fé, “firme fundamento da esperança, certeza a respeito do que não se vê” (Hb 11,1).

Por Afonso Pessoa

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