Duas tenazes ameaçavam a Igreja e o Império
“Os descendentes de Carlos Magno não sabiam mais defender o Império fundado por seu heroico antecessor. Sempre em luta uns contra os outros, eles passavam o tempo a se combater e a se reconciliar”. (Pe. Darras)
Redação (23/04/2022 10:36, Gaudium Press) Quando Carlos Magno faleceu, em 814, o Império por ele fundado se encontrava uno, firme e inteiramente fiel à Igreja. No entanto, seus filhos não seguiram seu exemplo e ocorreram desastres espantosos.
Assumiu o Império Luís I, o Piedoso, filho de Carlos Magno, homem tão mole que recebeu o cognome Débonnaire – Bonachão. Dividiu o Império para três de seus filhos, os quais, algum tempo depois, se insurgiram contra ele.
Pior. Tomou atitude favorável à heresia iconoclasta – que promovia a destruição das imagens sagradas – e quis obter o apoio do Papa Eugênio II para seu péssimo procedimento. “Este imperador, incapaz de governar sua própria família, pretendia dirigir a Igreja”.
Os três filhos de Luís I, o Bonachão: Lotário I, Luís II e Carlos, o Calvo, bem como seu sobrinho Pepino II, da Aquitânia, se indispuseram uns contra outros. E, em 841, acabaram entrando em guerra na localidade de Fontenoy, centro da França; mais de 40.000 homens morreram.
Luís II, cognominado o Germânico, tornou-se Rei da França em 843. Ele se precipitou em tal abismo de incredulidade que, em 855, chegou a enviar um exército a Roma, para instalar à viva força um padre excomungado no trono de São Pedro…
Vikings
Como se tudo isso não bastasse, duas tenazes ameaçaram esmagar a Igreja e o Império: os vikings, pelo Norte, e os maometanos, pelo Sul.
Os vikings eram pagãos provenientes da Escandinávia – Suécia, Dinamarca, Noruega. São também chamados normandos, ou seja, homens do Norte. Eram altos, loiros, ágeis e fortes.
Navegadores excelentes, em pequenos barcos com proas lindas puseram-se a atacar diversas regiões. Em algumas embarcações levavam cavalos, que utilizavam eximiamente quando chegavam em terra firme.
Através dos rios, os vikings procedentes da Dinamarca invadiram a França e tomaram importantes cidades. “Paris foi sitiada quatro vezes, saqueada três e incendiada duas.” Bordeaux caiu em poder deles pela traição dos judeus.
Escreve Ernest Lavisse (1842-1922), da Academia Francesa:
“Os normandos atacavam sobretudo os mosteiros, os verdadeiros focos da civilização carolíngia, onde encontravam ricos tesouros – os relicários de santos –, celeiros bem providos, oficinas bem apetrechadas e que, na sua maioria, não eram fortificados.” Em Tours, incendiaram o Mosteiro de Marmoutier e massacraram os 116 monges que nele habitavam.
Enquanto as autoridades civis fugiam ou pagavam grandes resgates para poupar algumas cidades, o Bispo de Paris – ajudado pelo Abade de Saint-Germain-des-Prés – tomou heroica atitude face aos normandos que sitiaram a cidade, em 885.
O prelado, após um ano que durava o cerco, recebeu o chefe viking em seu palácio, recusou qualquer negociação e falou ao “pirata na linguagem severa de um Profeta bíblico”, provocando medo e fazendo com que se retirassem.
Posteriormente, os normandos foram evangelizados e receberam o Batismo. Muitos deles se estabeleceram no Noroeste da França, numa região que se chamou Normandia, ou seja, país dos homens do Norte.
São Leão IV: prelúdio das Cruzadas
Nessa situação trágica, a Providência suscitou um Papa heroico: São Leão IV, que governou a Igreja de 847 a 855.
No primeiro ano de seu pontificado, surgiu, numa caverna das proximidades de Roma, uma monstruosa serpente que matava pessoas e ninguém conseguia liquidá-la.
A fim de extirpar o horrendo animal, São Leão fez muitas orações e jejuns. Na festa da Assunção de Nossa Senhora, tendo nas mãos a imagem da Santíssima Virgem pintada por São Lucas, organizou uma procissão da qual participaram grande número de pessoas.
Chegando ao local, ele se dirigiu sozinho à caverna, pôs o pé sobre o buraco de onde a serpente expelia vapores pestilenciais, ergueu as mãos ao céu e pediu a intervenção de Nosso Senhor. Nunca mais o monstro apareceu…
Os maometanos, que haviam dominado as ilhas Córsega, Sicília e Sardenha, dirigiram-se a Roma, mas não conseguiram nela penetrar devido a suas fortes muralhas. Entretanto, invadiram a Basílica de São Pedro, então situada fora dos muros, e roubaram o Altar da Confissão, de prata maciça.
Em 850, inúmeros navios de sarracenos apareceram nas costas da Toscana – Itália central –, e se dirigiam a Roma. Em Nápoles, os soldados se organizaram a fim de guerrear contra eles.
São Leão foi até Óstia – na embocadura do Rio Tibre – e com palavras de fogo animou os militares a lutarem com bravura, pois era uma guerra em defesa de Deus e de sua Igreja. Comenta o Padre Darras que essa bela atitude do Papa preludiava as Cruzadas.
Em determinado momento, ventos fortíssimos sopraram contra os navios e os destroçaram. Os maometanos que se encontravam em terra foram passados ao fio da espada pelos napolitanos.
A memória de São Leão IV é celebrada em 17 de julho.
Afonso, o Casto
Enquanto no Império aconteciam esses fatos, Deus suscitou na Espanha um varão católico de admirável pureza e combatividade: Afonso, o Casto.
Rei das Astúrias, região situada no Norte da Espanha, às margens do Mar Cantábrico, seguiu fielmente o exemplo dado pelo heroico Dom Pelayo, fundador desse reino.
Amigo de Carlos Magno, Afonso escreveu carta ao Papa São Leão III rogando orações pelo sucesso na guerra contra os maometanos, que dominavam quase toda a Espanha.
A Providência o atendeu e suas investidas militares contra tais inimigos foram sempre vitoriosas. Celibatário, entregou sua alma a Deus em 842, tendo reinado durante 52 anos.
Peçamos a Nossa Senhora que nos conceda as virtudes da Fé, confiança e combatividade para não sermos envolvidos pelo caos do mundo atual, muito pior – sobretudo no campo moral – do que o existente no século IX.
Por Paulo Francisco Martos
Noções de História da Igreja
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