Conclave pode começar nos primeiros dias de maio: não seria cedo demais?
A convocação de um conclave tão cedo inevitavelmente levanta questionamentos, ainda que as motivações reais permaneçam desconhecidas. Seria precipitado afirmar que há intenção de favorecer certos cardeais em detrimento de outros, sejam eles da Cúria ou das periferias do mundo.
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Redação (23/04/2025 15:55, Gaudium Press) Com a morte do Papa Francisco na manhã de segunda-feira, 21 de abril, às 7h35, tem início mais uma vez o antigo costume da Igreja: o funeral papal seguido do conclave. A Igreja confia a alma do Papa falecido à misericórdia divina, enquanto se prepara para escolher o novo sucessor de São Pedro. No entanto, há vozes que questionam a pressa com que esse processo está se desenrolando.
Na quarta-feira seguinte ao seu falecimento, os restos mortais do Papa Francisco foram trasladados à Basílica de São Pedro, onde os fiéis podem prestar suas homenagens até sexta-feira à noite. O funeral será celebrado no sábado, 26 de abril, às 10h, na Praça de São Pedro, sob a presidência do Cardeal Giovanni Battista Re. Após a Missa, o corpo será sepultado na Basílica de Santa Maria Maior, conforme o desejo expresso pelo próprio pontífice.
Francisco havia simplificado os ritos do funeral papal, dispensando a exposição do corpo na Sala Clementina, e reduzindo a cerimônia a um único caixão, numa celebração mais próxima à de um bispo diocesano que à de um “imperador romano”, como observou o historiador Massimo Faggioli. Ele também solicitou ser sepultado próximo à imagem da Virgem Salus Populi Romani, da qual era particularmente devoto.
Na terça-feira, apenas 26 horas após a morte do pontífice, foi realizada a primeira Congregação Geral dos cardeais, presidida pelo Cardeal Re, decano do Colégio Cardinalício. Essas reuniões reúnem todos os cardeais (mesmo aqueles com mais de 80 anos que não têm direito a voto) para discutir a preparação do conclave, onde serão abordados os rumos da Igreja e a eleição do próximo papa. Durante essas reuniões, os cardeais também juram absoluto sigilo sobre tudo relacionado ao conclave e à Sé vacante, sob pena de excomunhão.
No entanto, o início tão imediato causou desconforto. Em declaração ao blog Per Mariam, do jornalista católico Michael Haynes, o Cardeal Joseph Zen, de Hong Kong, questionou:
“Por que as Congregações tiveram que começar tão cedo? Como os idosos das periferias conseguirão chegar a tempo? Dizem que eles não têm obrigação de participar, mas eles têm esse direito, sim ou não?”
As declarações do cardeal Zen podem ser interpretadas no contexto de que a eleição poderia privilegiar os “candidatos” europeus ou aqueles que já trabalham na cúria vaticana, pois teriam mais tempo para conversar com seus pares e posicionarem-se numa eventual corrida pelo papado.
Diante da crescente islamização da Europa e das transformações promovidas por um pontífice latino-americano, é compreensível que alguns cardeais considerem a possibilidade de retornar a um perfil mais tradicional para o próximo papa. Nesse contexto, nomes como os dos cardeais Pietro Parolin, Jean-Marc Aveline e Pierbattista Pizzaballa ganham destaque.
Cardeal Pietro Parolin – Secretário de Estado do Vaticano
O cardeal italiano Pietro Parolin, nascido em 1955, atua como Secretário de Estado do Vaticano desde 2013. Com vasta experiência diplomática, é considerado um dos principais candidatos ao papado. Sua proximidade com o Papa Francisco e seu papel central na diplomacia vaticana reforçam sua posição como um dos favoritos no conclave.
Cardeal Jean-Marc Aveline – Arcebispo de Marselha
Jean-Marc Aveline, nascido em 1958 na Argélia, é arcebispo de Marselha desde 2019 e foi criado cardeal em 2022. Ele é conhecido por seu compromisso com o diálogo inter-religioso, especialmente com o Islã, e por sua defesa dos migrantes. Recentemente, foi nomeado presidente da Conferência dos Bispos da França, consolidando sua influência na Igreja francesa. Sua visão pastoral e sua experiência em contextos multiculturais o tornam um candidato relevante para liderar a Igreja ao estilo de Francisco.
Cardeal Pierbattista Pizzaballa – Patriarca Latino de Jerusalém
Pierbattista Pizzaballa, nascido em 1965 na Itália, é franciscano e atua como Patriarca Latino de Jerusalém desde 2020. Foi criado cardeal em setembro de 2023. Sua experiência na Terra Santa, marcada por esforços de reconciliação e diálogo inter-religioso, destaca sua capacidade de liderança em contextos complexos. Sua atuação durante conflitos na região, como a guerra em Gaza, evidenciou seu compromisso com a paz e a unidade. Ele chegou a se voluntariar para assumir o lugar de um refém no conflito entre Israel e o Hamas.
Claro que a história provou mostrar que qualquer previsão pode resultar inócua diante de resultados por vezes tão inesperados.
Vale lembrar que, com a morte do Papa, todos os cargos na Cúria Romana são suspensos, exceto os seguintes cardeais:
Cardeal Kevin Farrell, Camerlengo, que certificou oficialmente a morte e quebrou o anel e selo do Papa;
Cardeal Angelo De Donatis, Penitenciário-Mor;
Cardeal Baldaserra Reina, Vigário-Geral para a Diocese de Roma;
Cardeal Mauro Gambetti, Arcipreste da Basílica de São Pedro.
Esses cargos continuam em vigor para garantir o funcionamento básico da Igreja durante a vacância.
Quando começa o conclave?
Segundo o documento Normas Nonnullas de Bento XVI (2013), o conclave deve começar entre 15 e 20 dias após a morte do Papa; isto é, entre 6 e 11 de maio de 2025. Pode haver pequenos atrasos, mas o prazo máximo para o início é o 20º dia.
O Cardeal Pietro Parolin, ex-Secretário de Estado do Vaticano, provavelmente será responsável pela coordenação do conclave, já que os cardeais decano e vice-decano (Re e Sandri) estão acima da idade limite para votar (80 anos).
Embora, tecnicamente, qualquer homem católico batizado e em pleno uso da razão possa ser eleito papa (mesmo que não seja cardeal), há cerca de 700 anos a escolha recai sempre sobre os membros do Colégio Cardinalício. O eleito deve ser ordenado bispo antes de assumir o cargo, caso ainda não o seja.
Observadores apontam que o Colégio tende a evitar eleger candidatos muito jovens (abaixo dos 60 anos), buscando alguém que traga estabilidade, mas sem prolongar excessivamente o próximo pontificado.
Em comentário ao Per Mariam, o Cardeal alemão Gerhard Müller, ex-Prefeito do Dicastério para a Fé, declarou:
“A Igreja deve olhar para as palavras que Jesus dirigiu a Pedro: ‘tu és pedra, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja’… Que o próximo sucessor confirme seus irmãos na fé e guie o rebanho de Deus como um bom pastor.”
Por outro lado, um aberto opositor de Francisco, o Bispo Athanasius Schneider de Astana, no Cazaquistão, também reiterou sua oração por um papa santo, publicada no ano anterior. Já o Cardeal Raymond Burke, outro conhecido crítico de Francisco, embora não tenha feito declarações específicas, divulgou uma oração dedicada à eleição do novo pontífice.
A convocação de um conclave tão cedo inevitavelmente levanta questionamentos, ainda que as motivações reais permaneçam desconhecidas. Seria precipitado afirmar que há intenção de favorecer certos cardeais em detrimento de outros, sejam eles da Cúria ou das periferias do mundo. No entanto, um dado não passa despercebido: se o conclave ocorrer dentro do prazo previsto, poderemos testemunhar a eleição de um novo Papa — ou até mesmo a missa inaugural de seu pontificado — exatamente no dia 13 de maio de 2025, solenidade de Nossa Senhora de Fátima. Para os que veem sinais em cada coincidência, será difícil ignorar o simbolismo dessa data. Que não se ofusque um possível marco histórico da Igreja com temores apocalípticos: o que está por vir pode não ser o fim do mundo — mas, sem dúvida, será o começo de um novo tempo na Igreja.
Por Rafael Tavares
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