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A visita vai chegar, e agora?

Normalmente é uma alegria receber uma pessoa querida, um parente, um amigo que não vemos há tempos, e o dever da hospitalidade nos leva a querer organizar tudo e fazer o nosso melhor para que a pessoa que nos vem visitar fique confortável e tenha uma boa impressão de nossa casa e de nosso carinho. 

Foto: Anton/ Unsplash

Foto: Anton/ Unsplash

Redação (14/12/2024 09:24, Gaudium Press) Melhor começar trocando a roupa de cama, mesmo que o quarto de hóspedes esteja sem uso há tanto tempo; pode estar com cheiro de bolor. Não! Arrumar a sala é mais importante, é o primeiro ambiente que a visita vai ver; o quarto dá tempo de arrumar depois. E esse monte de louça na pia? Nossa! Tinha esquecido esse detalhe! Não adianta cuidar disso com a despensa vazia! Na geladeira só tem leite, cebola e água! E esses brinquedos espalhados? Meninos, comecem a juntar tudo! E nada de tênis jogados por todo canto! Guardem tudo isso agora! A campainha! Meu Deus, será que ela adiantou?

Esse pequeno caos é o panorama de uma família que se prepara para a chegada de uma visita. De repente, a bagunça que já virou rotina e com a qual ninguém se preocupa, passa a ser vista e se torna motivo de desespero. Afinal, a visita vai chegar, e agora, como dar conta de arrumar tudo e deixar a casa apresentável?

Mesmo no caso em que a família é mais organizada, e as coisas ficam naturalmente nos seus lugares, a chegada de uma visita sempre provoca a necessidade de deixar o ambiente mais harmônico e agradável, perfumar a casa, colocar flores, preparar alguns pratos mais elaborados e, dependendo da visita, abrir uma garrafa de vinho guardada para uma ocasião especial.

Duas importantes lições

Embora existam visitas cuja presença não cause tanto prazer, normalmente é uma alegria receber uma pessoa querida, um parente, um amigo que não vemos há tempos, e o dever da hospitalidade nos leva a querer organizar tudo e fazer o nosso melhor para que a pessoa que nos vem visitar fique confortável e tenha uma boa impressão de nossa casa e de nosso carinho. Disso, podemos e devemos tirar duas preciosas lições:

A primeira: por que, normalmente, nos preocupamos em deixar a casa em ordem, limpa, arrumada e bonita apenas na ocasião em que vamos receber uma visita? Por que não fazemos isso no dia a dia, para nós mesmos e para nossos entes queridos?

Nossa casa é nossa primeira igreja, é o templo sagrado para o qual convidamos a Deus (ou ao menos deveríamos convidar) para habitar conosco; por que descuidamos dele? Por que deixamos coisas quebradas por arrumar, roupas e calçados por guardar, louça para ser lavada depois, quartos fechados sem abrir a janela para a renovação do ar?

A segunda: nós estamos viajando e, um dia, chegaremos ao nosso destino e seremos visitas na casa de Deus. É claro que tudo lá é perfeito, mas qual não será a alegria d’Ele ao saber que, após longa, difícil e acidentada viagem, chegaremos em sua casa?

Com certeza, mesmo sem ter louça suja sobre a pia, quartos cheirando mofo, roupas e brinquedos espalhados, Ele quererá preparar o Céu para nos receber e há de querer enfeitá-lo e embelezá-lo ainda mais para a nossa chegada.

Carinho, respeito e sacralidade

Mons joao cla diasRecentemente, uma pessoa muito querida empreendeu a última fase de sua grande viagem, despedindo-se de sua família e de seus amigos e partindo – leve, sereno e sem bagagem – para ser recebido no Reino de Deus.

Refiro-me a Monsenhor João Clá Dias, fundador dos Arautos do Evangelho, que morreu exatamente como viveu, com muita dignidade e elegância. Suas exéquias foram algo nunca visto por este velho escriba e, certamente, por nenhum dos que estiveram presentes ou que acompanharam as transmissões pela internet.

Tudo na cerimônia era carinho, respeito e sacralidade. Pessoas de várias línguas, sentadas umas ao lado das outras, podiam não se entender no tocante aos idiomas de seus países de origem, no entanto, se entendiam perfeitamente no silêncio da contemplação.

Cerimônias fúnebres costumam ser tristes ou tediosas. Essa, porém, foi belíssima, grandiosa, inundada de uma aura celestial. Tratava-se de alguém muito amado, um homem que só quem conheceu sua pessoa e sua obra sabe o tanto de desafios que ele enfrentou, e com que esmero se dedicou a servir e defender a Santa Igreja Católica, ensinando a tantos outros a viverem esse sagrado amor, em seu ápice, voltado à Virgem Maria, a excelsa Medianeira entre os homens e seu Filho Jesus.

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Se assim foi a partida, imagine-se a chegada!

Não havia uma só pessoa que não estivesse triste naquele solene ambiente, mas era uma tristeza embalada pela alegria de imaginar como estaria sendo a recepção dessa santa alma no Céu.

Com que alegria Nossa Senhora deve ter enfeitado tudo, com flores em tal quantidade e de tal aroma e beleza que empalideceriam as centenas de coroas recebidas durante o funeral!

Imagino os Santos de Deus, cujo dia foi escolhido para esse passamento, todos ali reunidos, os das primeiras fileiras transmitindo a novidade aos outros: “Ele está chegando, ele está chegando! São Miguel já está descerrando as portas. Agora, ele vai entrar!”

É claro que essas são apenas conjecturas, afinal, como diz o Apóstolo São Paulo, é impossível a nós, seres humanos, imaginarmos como sejam, de fato, “as coisas que olhos não viram, nem ouvidos ouviram, nem penetraram o coração do homem, aquelas que Deus preparou para os que o amam” (1Cor 2,9). E se tal foi a cerimônia de despedida, minha imaginação é pequena para compor a festa de chegada.

Capela do Santíssimo Sacramento – Casa Lumen Prophetæ, Mairiporã (SP) – Foto: Ignacio Montojo

Capela do Santíssimo Sacramento – Casa Lumen Prophetæ, Mairiporã (SP) – Foto: Ignacio Montojo

Templos de pedra e de carne

Dá-nos uma agradável ideia desse lugar – que nos enche de alegria e esperança ­– a própria casa de Monsenhor João, ou seja, as diversas construções em estilo arquitetural idealizado por ele, espalhadas por diferentes lugares, não apenas para uso e deleite dele mesmo e de seus filhos espirituais, mas ­especialmente preparadas para receber visitas: as capelas, igrejas e basílicas dos Arautos do Evangelho. Verdade seja dita, não há como entrar em uma delas e não ter na alma um vislumbre de como seja o Céu!

Este homem, amado por muitos, odiado e desprezado por alguns, sem dúvida marcou a história da Igreja e talvez ainda leve anos, ou até séculos, para que a importância de sua missão seja completamente compreendida.

Ele nos ensinou, pelo exemplo, que a maneira como devemos cuidar da nossa casa deve ser o reflexo da maneira como Deus cuida do Céu para nós.

Qualquer pessoa que tenha visitado uma das igrejas construídas por Monsenhor João jamais encontrou uma flor fora do lugar, uma cor em desarmonia com o conjunto, um som que quebrasse a sacralidade.

E quem tenha tido a oportunidade de estar diante dele – seja de sua própria pessoa, que durante 85 anos esteve entre nós, ou de seus filhos e filhas, que podemos chamar de outros “Joões”, ­– nunca viu um amassado na roupa, um fio de cabelo fora do lugar, um pequeno desdouro na dignidade.

Templos de pedra e templos de carne que refletem em tudo a imagem viva de Nosso Senhor Jesus Cristo e o amor que Ele tem por sua Igreja e por cada um de nós.

Diante dessas exéquias, experiência tão inusitada e tão cuidadosamente preparada, ficou para mim a lição que tento transmitir a quem me lê: que possamos manter nossas casas sempre arrumadas e limpas, preparadas para receber qualquer visita sem atropelo.

Especialmente, que possamos sempre deixá-la pronta para receber a Nosso Senhor Jesus Cristo, que, hoje, de surpresa nos visita, que, um dia, também nos receberá em sua Casa e exultará de alegria com a nossa chegada.

Que a casa, a vida e a despedida de Monsenhor João possam servir de exemplo para nós.

Por Afonso Pessoa

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