A salvação das almas, lei suprema
A mentalidade materialista reinante ignora a vida sobrenatural e tem pouco ou nenhum interesse pela bem-aventurança eterna.
Redação (06/02/2023 10:17, Gaudium Press) Toda associação de qualquer tipo – religiosa, política, filantrópica, esportiva, etc. – tem seus estatutos, suas leis, seus compromissos. É inconcebível uma atividade sem diretrizes que a regulem. A Adoração Noturna Espanhola, por exemplo, ou nossa Federação Mundial de Obras Eucarísticas da Igreja, têm seus regulamentos.
É claro que a associação não recebe a seiva vivificante para cumprir a sua missão da letra de seus estatutos. Há sempre um ideal motor superior, que está acima das questões de ordem operacional e disciplinar. Mas as normas servem de causa e custódia à razão associativa.
A Igreja Católica, Corpo Místico de Cristo e povo santo de Deus, é também uma sociedade e os seus membros estão sujeitos a regulamentos… embora o seu descumprimento não os exclua de imediato, como acontece em outras comunidades. Como boa mãe, a Igreja instrui, corrige e perdoa, evidentemente contando sempre com o arrependimento e emenda daquele que falhou.
A lei e a graça
Ao promulgar o “Código de Direito Canônico” vigente, há quarenta anos, São João Paulo II deu uma luminosa explicação que citamos a seguir. Apesar de sua extensão, merece ser transcrita, pois cada frase é importante:
“O Código de Direito Canônico é absolutamente necessário para a Igreja. Por se constituir como corpo social e visível, ela necessita de normas que tornem visível a sua estrutura hierárquica e orgânica, para ordenar corretamente o exercício das funções que lhe foram confiadas divinamente, sobretudo do poder sagrado e da administração dos sacramentos; para compor, segundo a justiça fundamentada na caridade, as relações mútuas dos fiéis cristãos, tutelando e definindo os direitos de cada um; enfim, para apoiar as iniciativas comuns que se assumem para viver ainda mais perfeitamente a vida cristã, reforçá-las e promovê-las através das leis canônicas (…)”. (Constituição Apostólica Sacrae disciplinae leges, 1-25-83).
Certos católicos minimizam a importância da legislação canônica como se estivesse em conflito com as exigências da graça, dos carismas e da caridade, o que é um erro grosseiro. Como os arcos de uma mesma ogiva gótica, a lei e tudo relacionado à vida da alma se encontram e se unem em perfeita harmonia. A lei não é um obstáculo, é uma ajuda, quão medicinal e salvífica!
Este “preâmbulo legislativo” – para chamá-lo de alguma maneira– é feito com o objetivo de sublinhar algumas obrigações relacionadas com a Eucaristia, mais especificamente com a Comunhão sacramental. Estes são os dois cânones mais importantes do Código de Direito Canônico, como se verá.
Um deles é o cânon número 920: “Todo fiel, depois da Primeira Comunhão, é obrigado a comungar pelo menos uma vez ao ano”. Muitos que não praticam a Fé regularmente, tendem a ir à Missa apenas na Páscoa, ou por ocasião da morte de um conhecido, ou no início da Quaresma para que as cinzas sejam impostas a eles. Bem, e a recepção da Comunhão?
É verdade que para receber a Comunhão é preciso ter as devidas disposições, e isso não deve ser relativizado; a questão é espinhosa e pode não ter uma solução rápida ou fácil. Mas isso não significa anular qualquer reflexão a respeito. Porque se uma lei da Igreja estabelece a Comunhão anual, o católico coerente programa o que pode fazer, quando e como, para se pôr em ordem. E, antes de tudo, começa rezando para que os caminhos se abram para ele. Dormir despreocupado sobre o problema não cabe.
O outro cânon é o seguinte número, o 921: “O Viático (isto é, a Comunhão) deve ser administrado aos fiéis que, por qualquer motivo, se encontrem em perigo de morte”. Aqui a Igreja, através do legislador, pensa diretamente nas pessoas responsáveis pela atenção pastoral dos enfermos, assumindo sempre as suas boas disposições.
O ministro de Deus é a vida e a porta do céu
Há uma ideia errônea e muito infeliz soprada pelo espírito do mundo, que sustenta que o enfermo grave pode se assustar se um sacerdote for chamado para assisti-lo, como se o ministro de Deus fosse quem vai matá-lo e não aquele que traz, precisamente, os sacramentos da salvação: o perdão dos pecados, o Pão da Vida e a santa Unção.
Quem escreve esta reflexão experimentou no exercício de seus deveres sacerdotais quanto alivia e consola a um moribundo em seu leito de dor – e aos familiares e amigos que o acompanham – a oração, a leitura da Palavra de Deus e a celebração dos Sacramentos. Como pode um cristão ser impedido de receber aqueles subsídios salvíficos na hora extrema? Que tipo de consideração têm pelo moribundo aqueles que lhe negam o mais necessário para alcançar a felicidade eterna ? Receber a Eucaristia é uma necessidade e uma obrigação, tanto para os que vendem saúde, como para os que estão prestes a embarcar em sua última viagem! Que a Virgem de Lourdes, especial padroeira dos enfermos e cuja festa se celebra no dia 11 de fevereiro, dê forças para aqueles com saúde gravemente comprometida e aos seus familiares para assumirem esses compromissos!
A mentalidade materialista reinante ignora a vida sobrenatural e tem pouco ou nenhum interesse pela bem-aventurança eterna. Despreza ainda a própria dignidade da vida natural, sobretudo em seus estados mais frágeis, que são os prévios ao nascimento e ao desenlace definitivo.
A lei suprema da Igreja é a salvação das almas (Cânon 1752), todo o Código de Direito Canônico está ordenado para esse fim. Por isso, nós, católicos, não podemos prescindir dos auxílios que a Igreja nos põe à disposição para o bem temporal e eterno, nosso ou dos outros. Quando as leis de Deus e da Igreja não são cumpridas, muitos danos podem ser esperados para os indivíduos e para a sociedade; estamos constatando…
“Seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu”, pede-se no Pai Nosso. Um aspecto predominante da vontade de Deus é que o remédio curativo que é o Pão Eucarístico seja nosso companheiro de caminho.
Por Padre Rafael Ibarguren EP – Conselheiro de Honra da Federação Mundial das Obras Eucarísticas da Igreja.
Traduzido por Emílio Portugal Coutinho.
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