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A razão e o mistério são incompatíveis?

A Revelação e o Magistério não são teorias que possam nos interessar ou não, e das quais podemos prescindir, violando os compromissos batismais.

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Redação (06/07/2021 12:53, Gaudium Press) É razoável que um católico possa não acreditar na presença real de Nosso Senhor Jesus Cristo na Eucaristia? Claro que não! O mistério eucarístico faz parte do depósito da Fé e esse título deve ser respeitado, amado e vivido segundo o mandato formal do próprio Cristo: «Tomai e comei» (Mt 26,26), «fazei isto em memória de mim» (Lc 22,19), “se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis vida” (Jo 6,53).

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Entretanto… quão distante do Pão da Vida permanecem tantos fiéis em nossos dias! Distantes da Missa dominical, distantes da comunhão sacramental e distantes da adoração eucarística. E o singular é que, na maioria das vezes, não é por uma objeção racional que se estabelece essa distância. Assim, os tabernáculos permanecem solitários e as Missas pouco frequentadas. Em certos templos, onde a história e a arte deixaram mostras de valor cultural, entre os visitantes se registra maior número de turistas e curiosos do que peregrinos e fiéis no exercício de suas obrigações religiosas.

Como isso pôde acontecer? Não faltam católicos que para justificar a sua incoerência e apaziguar sua consciência (?), apelam a uma suposta Fé “adulta” que não dependa de tantos cânones e dogmas… com os quais forjam outra religião.

Perda do afeto e do encanto pelo mistério

Acontece que na mentalidade do homem contemporâneo o afeto e o encanto pelo mistério, dimensão privilegiada da Fé, foram se perdendo progressivamente. O outrora idolatrado racionalismo sistematizado por Descartes, posteriormente foi substituído por descobertas oferecidas pela ciência e pela tecnologia, com toda a parafernália de máquinas, indústrias, velocidade, imagens, sensações, enfim, de novidades e novos ritmos que foram sendo incrustados na vida “civilizada”; desta forma, foi se sufocando a capacidade de admiração aos valores espirituais, tão mais ricos e sutis do que o que é quase palpável ou útil.

Ora, o ser humano por natureza tem sede do espiritual – “a alma humana é naturalmente cristã” sentenciou Tertuliano – e ao produzir-se esse tal vazio interior, nasce consequentemente o desejo de preenchê-lo de alguma forma… de qualquer forma. “Chasez le naturel, il reviandra au galop” dizem os franceses: expulsai (ou violentai) a natureza e ela voltará a todo galope.

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É por isso que no mundo paganizado que nos cerca se proliferam tantas idolatrias e cultos estranhos, assim como recursos para escapar da realidade com drogas; há também os temores, as decepções e o suicídio, que agora é promovido e enaltecido com o doce nome de “assistido”.
A renúncia à racionalidade

Em tudo isto há uma renúncia à racionalidade, embora nem sempre seja explícita. Nos séculos XVII e XVIII a razão foi divinizada – a Revolução Francesa chegou a entronizar na Catedral de Notre-Dame o culto à “Deusa Razão” – e o mistério foi relegado por ser “obscurantista” e não se coadunar com as ciências exatas. E hoje, enquanto vai se enterrando a razão sem dor, o mistério é esquadrinhado de forma temerária, sempre que possa trazer alguma vantagem, real ou suposta.

Nossa condição de criaturas limitadas tem sede de arcanos; a concepção misteriosa da religião responde a uma necessidade vital porque não podemos justificar com cálculos humanos coisas inexplicáveis ​​que nos interessam e nos desafiam. Por exemplo, a Trindade, a Encarnação ou a própria Eucaristia.

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Lógica e mistério se complementam maravilhosamente

A propósito, é oportuno fixar a atenção em uma reflexão de Santo Ambrósio de Milão, Padre da Igreja. Tratando da Eucaristia, depois de explicar que o pão e o vinho se convertem no Corpo e no Sangue de Cristo pelo poder divino, mostra como a lógica se harmoniza com o mistério. Além do mais: lógica e mistério se complementam maravilhosamente. Claro que o faz a partir da perspectiva da nossa Fé, da sua Fé, leitor, leitora, que você condescende em ler este artigo.

“Mas por que usamos de argumentos? Atenhamo-nos ao que aconteceu em sua própria pessoa [a de Cristo] e os mistérios de sua encarnação nos servirão de base para afirmar a verdade do mistério eucarístico. Quando o Senhor Jesus nasceu de Maria, por ventura o fez segundo a ordem natural? A ordem natural de geração consiste na união da mulher com o homem. É evidente, então, que a concepção virginal de Cristo era algo acima da ordem natural. E [na consagração do pão e do vinho] o que tornamos presente é aquele corpo nascido de uma Virgem. Por que buscar a ordem natural no corpo de Cristo, se o próprio Senhor Jesus nasceu de uma Virgem, fora das leis naturais? A carne de Cristo que foi crucificada e sepultada era real; é, portanto, real o sacramento da sua carne”. (Do Tratado de Santo Ambrósio sobre os Mistérios, retirado do Ofício das Leituras do sábado VIII no tempo comum, tomo III, edição mexicana, ano 2000).

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A Revelação e o Magistério não são teorias das quais podemos prescindir

É encantador ver a naturalidade e o rigor com que se abordam tais mistérios inefáveis​. Sejamos racionais; A Revelação e o Magistério não são teorias que possam nos interessar ou não, e das quais podemos prescindir, violando os compromissos batismais.

E já que, como foi dito, estamos imersos na era da imagem e da sensação, concluamos com uma figura sensacional e eloquente tirada da pena do Apóstolo Santiago, colocada em sua carta dirigida às comunidades judaico-cristãs: “Sede cumpridores da palavra e não apenas ouvintes; isto equivaleria a vos enganardes a vós mesmos. Aquele que escuta a palavra sem a realizar assemelha-se a alguém que contempla num espelho a fisionomia que a natureza lhe deu: contempla-se e, mal sai dali, esquece-se de como era.”. (Tg 1, 22-24).

Muitos católicos se esqueceram do próprio rosto e não parecem afligir-se por isso… mostrando assim uma renúncia à razão. Maria Santíssima lhes ajude a corrigir este estado espiritual deficiente, e a Eucaristia seja o remédio que lhes devolva a vida em plenitude.

Mairiporã, julho de 2021

Por Padre Rafael Ibarguren EP – Assistente Eclesiástico das Obras Eucarísticas da Igreja.

Traduzido por Emílio Portugal Coutinho.

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