A quase-renúncia de Dom Damasceno: porta para um diálogo tardio ou rampa para novos atropelos?
Estamos no meio de um caso mundial suscitado pela publicação de um livro-denúncia em que os Arautos proclamam pelos telhados a reconstituição dos fatos da intervenção do dicastério vaticano e os atropelos ao direito.
Redação (24/11/2025 19:20, Gaudium Press) A notícia, inicialmente veiculada por Specola na Infovaticana, foi confirmada pouco depois pela Gaudium Press: o Cardeal Raymundo Damasceno Assis, de 88 anos, enviou ao dicastério para a Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica a sua renúncia ao cargo de Comissário Pontifício dos Arautos do Evangelho. Poucos dias depois, era noticiado que sua renúncia não fora aceita pelo dicastério, sob a direção da Irmã Simona Brambilla, MC.
A renúncia era esperada: há muito vinha crescendo o abismo entre o dicastério e o comissário. E qual o contexto? Estamos no meio de um caso mundial suscitado pela publicação de um livro-denúncia em que os Arautos proclamam pelos telhados a reconstituição dos fatos da intervenção do dicastério vaticano e os atropelos ao direito (ver Nota de imprensa sobre o livro “O Comissariado dos Arautos do Evangelho”).
Não é preciso dizer que a notícia está fervilhando nos corredores do Vaticano e na opinião pública em geral, principalmente nas Américas e na Europa. A razão é muito simples: os Arautos, gostem ou não deles, chamam a atenção. Ora, esta atenção se multiplica quando se constata incontáveis atropelos jurídicos, fundamentados em abusos de autoridade de todo tipo, gerando consequências desastrosas.
Os atropelos por parte do dicastério não pouparam sequer o comissário, nomeado pelo próprio Vaticano. Dom Damasceno, cuidadoso e calculista, era afeito a métodos que contrastavam com a cupidez do dicastério, afim a medidas destrutivas, despachadas e alheias ao direito. Destarte, o purpurado brasileiro foi paulatinamente posto à margem, até que seu campo de ação ficou cerceado por completo, até levar a uma situação contraditória: um “comissário comissariado”…
A atitude da Irmã Simona Brambilla não foi menos surpreendente: numa agilidade jamais vista nas respostas do dicastério, ela solicita ao Cardeal Damasceno, de 88 anos, que permaneça ainda alguns meses à frente do comissariado – embora ele mesmo tenha admitido que já nem há mais o que fazer.
É de se perguntar ainda se carta da Irmã Brambilla é válida, pois mais uma vez se dirige aos Arautos do Evangelho como “associação pública”, sendo que é uma associação privada. Este é um grave problema que gerou um imbróglio tal que o dicastério teve que alterar o decreto de instituição do comissariado, recorrendo a meios escusos e fraudulentos para a sua execução, conforme demonstra o referido livro.
De fato, Dom Damasceno, após tanto tempo, esforços e recursos empregados, considerando sua missão concluída, postulou o encerramento da intervenção vaticana. Mas o dicastério – como está demonstrado no livro – reagiu com contundência em 2024, afirmando não estar suficientemente satisfeito com as diligências realizadas.
Com a publicação do livro, entretanto, multiplica-se o número de autoridades – tanto civis quanto eclesiásticas – inconformes com os procedimentos dos quais têm sido alvos os Arautos, que até agora tinham observado respeitoso, embora dolorido, silêncio.
Neste contexto, o pedido de renúncia de Dom Damasceno torna agora a situação do dicastério ainda mais delicada. Confirmada esta renúncia em alguns meses, como promete a prefeita e sua secretária em carta, já não haveria mais nenhum membro do Comissariado dentre os que foram nomeados pelo próprio dicastério. Depois de um “comissário comissariado”, temos então agora um “comissariado descomissariado”. Quando chegaremos ao descomissariado puro e simples?
Em suma, o que virá em seguida? É presumível que Dom Damasceno tenha apresentado sua renúncia também para Sua Santidade, o Papa Leão XIV. Seguirá o Santo Padre os ditames do dicastério que pede ainda mais “alguns meses”? A questão é que o comissariado neste ponto já não está num “estaleiro” como ilustra o livro-dossiê, mas já verdadeiramente naufragou.
A aceitar definitivamente a renúncia, como se procederá? Com ainda maior animosidade ideológica? Se, como se rumoreja agora, o dicastério nomear novos comissários mais a seu gosto – isto é, ainda mais violentos, e abusadores do poder que seus predecessores –, estará confirmando tudo quanto o livro descreveu como linha delituosa de ação. Resta ainda saber quem estaria disposto a assumir tão complexo encargo… Parece ser cada vez mais difícil encontrar candidatos ao naufrágio. Um dos fortes candidatos, Mons. Jordi Bertomeu, que já prometeu publicamente que as suas próximas vítimas seriam os Arautos do Evangelho, encontra-se agora imerso num escândalo mundial.
Por outro lado, será que é a intenção mesma do dicastério deixar tudo num infinito banho-maria? Se assim for, persistirá na atitude inexplicável e insustentável do ponto de vista jurídico também confirmando as denúncias do livro-bomba, que elucida a tática de asfixia vocacional por eterna dilação.
Deste modo, o pedido de renúncia de Dom Damasceno transformou o contexto de efervescência mundial num beco sem saída para o dicastério, principalmente na pessoa de sua prefeita, a Ir. Simona Brambilla, que decidiu alinhar seu proceder ao do Cardeal João Braz de Aviz, herdando dele tanto a ideologia bitolada quanto a antipatia geral da qual gozava o ex-prefeito. Diante de tanta complicação, optará ela também pela via da desistência? Ou seguirá a via do ex-prefeito no “grave abuso de autoridade” e na “grave violação do segredo de ofício”, conforme aponta o art. 65 do hoje conhecido Regulamento do Corpo da Cúria Romana?
Seja como for, os Arautos do Evangelho têm se mostrado confiantes, pois como disse São Tomás de Aquino “quem fala a verdade, não pode ser vencido, independentemente com quem se dispute” (Super Iob, cap. 13, l. 2, n. 229). E embora sejam eles poucos comparados a todo orbe católico, possuem crescente aderência – e também inconformidade com esta situação – de uma imensa massa da opinião pública católica, sobretudo nas redes sociais. Num contexto em que Papa Leão XIV invoca sempre mais a unidade e a paz, o dicastério estará disposto a contrariá-lo e trazer ainda mais efervescência para a Igreja Católica? Não será a hora de Leão XIV dar um basta nesta situação?
Por Luis Fernando Ribeiro




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