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A Ordem de Malta remodelada

Uma associação católica, um instituto religioso, um grupo de piedade não pode mudar de escopo sem que todos os que dele formam parte aprovem a mudança.

“O mandamento do amor é o distintivo que nos fará reconhecer como discípulos autênticos de Jesus”.

Redação (07/09/2022 14:32, Gaudium Press) “O que a todos afeta, por todos deve ser aprovado” declarava o papa Bonifácio VIII numa de suas “Regras de Direito”, nos alvores do século XIV: “Quod omnes tangit debet ab omnibus approbari”. Tal norma se encontra refletida no atual “Código de Direito Canônico” – as leis vigentes na Igreja Católica – no cânone 119 § 3.

Significa isso que uma associação católica, um instituto religioso, um grupo de piedade não pode mudar de escopo sem que todos os que dele formam parte aprovem a mudança; a recusa de um só impede alterações de finalidade, de objetivos ou de metas. Cada um deles integrou-se voluntariamente, temporariamente ou por toda sua vida, num grupo em razão do propósito que este declarava querer promover: a santidade de vida, o alívio dos doentes, a oração, a adoração noturna, o ensino, a catequese…

Se o objetivo muda, cada indivíduo tem o direito de declarar que não é para isso que ele se agregou; impedindo assim a mudança, conforme a prática multissecular da Igreja Católica. São direitos humanos inalienáveis, que a Lei da Igreja protege. Não se trata apenas de deixar de fora os não concordes, mas proteger a instituição; em particular, se tem décadas de anos (ou séculos…) de serviços prestados.

Reforma na Carta Constitucional

Porém na atual reforma da Carta Constitucional da Soberana, Militar e Hospitalária Ordem de Malta – cujas glórias remontam aos tempos das Cruzadas, em que cavaleiros nobres renunciavam a suas vantagens e comodidades, ao seu aconchego familiar, passando a dedicar suas vidas para proteger e amparar os peregrinos na Terra Santa, em particular os doentes – parece ter sido esquecido tal princípio.

O Papa Francisco – assessorado entre outros por um cardeal recém-nomeado – de uma vez alterou o significado, a constituição interna, o desígnio desse imenso grupo de pessoas (fala-se de milhares) que, de um ou outro modo, constituem a mundialmente respeitada “Ordem de Malta”.

A que até anteontem era uma “ordem religiosa laical, tradicionalmente militar, cavalheiresca e nobiliárquica” perdeu os qualificativos para se tornar (como existem milhares na Igreja) uma “ordem religiosa laical”.

Seu objetivo de promover a glória de Deus “mediante a santificação de seus membros a serviço da Fé e do Santo Padre, e ao auxílio do próximo”, passou a ser “a santificação dos membros mediante a tuitio fide e o obsequium pauperum especialmente em relação aos pobres e aos doentes, no serviço ao Santo Padre”. A Fé desapareceu, os pobres (com pobreza de linguagem, diga-se de passagem) são duplamente nomeados, e o “próximo” é reduzido aos “doentes”. A santificação não é procurada como meio para glorificar a Deus, mas indicada como algo diferente: separado do Criador? O próprio Santo Padre, que ocupava lugar de realce depois da Fé, é relegado ao último posto.

Na derrogada Carta Constitucional, a atividade hospitalária procurava nos assistidos “a elevação espiritual e reforçar neles a Fé em Deus”; tudo substituído por um genérico “testemunha da caridade cristã”.

As mudanças da organização interna são tantas e tão substanciais que um estudo cuidadoso levaria muitas páginas.

Esperamos que todos os dedicados cavalheiros e damas da Soberana e Militar Ordem Hospitalária, sejam professos com votos ou membros de obediência, de honra e devoção ou de graça magistral, capelães, doados ou doadas encontrem no novo texto o reflexo de suas interiores aspirações de “glória de Deus mediante a santificação pessoal”; e todos, unânime e livremente, aprovem a nova Carta. Caso contrário, o legítimo direito, princípio de Justiça, lembrado por Bonifácio VIII, referido ao iniciar estas breves linhas, terá sido atropelado.

Por José Manuel Jiménez Aleixandre

 

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