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A misericórdia e a pastoral se opõem à justiça?

Na audiência aos participantes do Curso Internacional promovido pelo Tribunal da Rota Romana, “Dez anos da reforma do processo matrimonial canônico. Dimensão eclesiológica, jurídica e pastoral”, Leão XIV exortou-os a considerar, nos processos de nulidade matrimonial, as dimensões jurídica, eclesiológica e pastoral.

Foto: Vatican News

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Redação (23/11/2025 14:11, Gaudium Press) Ao receber, em 21 de novembro passado, os participantes do recente Curso de Formação do Tribunal da Rota Romana, Dez Anos Depois da Reforma do Direito Canônico do Processo Matrimonial. Dimensão Eclesiológica, Jurídica e Pastoral“, Leão XIV sublinhou “a relação entre essas três abordagens”, a qual é frequentemente esquecida. Com efeito, a teologia, o direito e a pastoral são considerados “como compartimentos estanques” e “colocados em oposição uns aos outros, como se o mais teológico ou o mais pastoral, fosse o menos jurídico”. Esta concepção errada “obscurece a harmonia” entre as diversas atividades eclesiais.

“Por que, nos documentos de processo de nulidade matrimonial, Jesus, como Juiz, é apresentado como manso e misericordioso”, perguntou o Pontífice. “Tal consideração pode parecer, à primeira vista, contrária às exigências inderrogáveis da justiça, que não podem ser negligenciadas em virtude de uma compaixão mal interpretada”, ressaltou o Pontífice.

Deus quer sempre a salvação de cada alma, e oferece a todo e qualquer pecador arrependido Sua Infinita Misericórdia. Porém, os juízos humanos, em particular referentes às causas de nulidade matrimonial, não podem ser manipulados “por uma falsa misericórdia”.

Já Santo Agostinho frisava ser a misericórdia, “a compaixão do nosso coração pela miséria alheia, que nos impele a socorrê-la, se nos for possível”. Contudo, “este movimento é conforme à razão, quando a misericórdia se manifesta sem comprometer a justiça; tanto ao ajudar um necessitado, quanto ao perdoar um arrependido” (A Cidade de Deus, L. 9, c. 5).

“O matrimônio não é um ideal, mas o cânone do verdadeiro amor entre homem e mulher: amor total, fiel e fecundo” repetiu o Pontífice. É um mistério que subsiste apesar de qualquer falência conjugal. Assim, o processo canônico de nulidade matrimonial, como lembrado por Bento XVI, “constitui essencialmente um instrumento para apurar a verdade sobre o vínculo conjugal. Seu objetivo constitutivo […] é, portanto, prestar um serviço à verdade”.

Procurar a verdade é o sentido correto da expressão “salvação das almas”, suprema lei do direito da Igreja. “As dimensões eclesiológica e jurídica, se consideradas realmente, levam a descobrir a dimensão pastoral”, destacou o Pontífice.

E o Papa Leão XIV concluiu, citando as palavras de São João Paulo II: “a atividade pastoral, embora ultrapasse em muito os aspectos jurídicos, sempre envolve uma dimensão de justiça. De fato, não seria possível conduzir as almas ao Reino dos Céus se se prescindisse daquele mínimo de caridade e prudência que consiste no empenho de fazer observar fielmente a lei e os direitos de todos na Igreja”.

Por José Manuel Jiménez Aleixandre[1]


[1] Doutor em Direito Canônico, docente no Instituto Teológico São Tomás de Aquino, Caieiras SP.

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