A fraqueza de Deus e a fortaleza do homem
Com insuperável beleza literária, neste domingo, Jesus não só nos ensina a bem rezar, como nos indica os meios de tornar infalível nossa oração, incentivando-nos a uma confiança sem limites em suas divinas palavras.
Redação (24/07/2022 10:20, Gaudium Press) Um grande mistério e divino exemplo eram as orações de Jesus ao Pai. Como explicar a atitude do Homem-Deus rogando ao Pai por tantas intenções, se Ele mesmo é onipotente e, sobretudo, sendo Eles iguais entre Si? Não parece um tanto contraditório Deus pedir a Deus um auxílio para Si próprio? Não seria mais adequado Ele diretamente tornar efetivos seus anseios, ao invés de orar?
Essas dúvidas e muitas outras se desfarão se meditarmos sobre um comentário feito pelo Santo Patriarca Hesíquio de Jerusalém.[1] Diz-nos este autor que, desde toda eternidade, o Filho desejava poder dirigir-se ao Pai enquanto inferior, mas era-Lhe impossível realizá-lo, pois, segundo nos explica a Teologia com base na Revelação, as Pessoas da Santíssima Trindade são iguais entre Si. Por sua vez, também o Pai desejava doar algo ao Filho, mas através de que meio, se Eles são idênticos?
Maria resolveu essa questão com o seu fiat, permitindo ao Filho fazer-Se Homem. Era de dentro de sua natureza humana que Jesus elevava sua mente a Deus e exprimia os desejos de seu Sagrado Coração, rogando fossem eles concretizados. Ou seja, nunca Jesus rezou enquanto Deus — e nem teria sentido, aliás, Ele assim proceder — mas sempre o fez como homem, pois sabia que certas graças não seriam jamais obtidas senão por meio de seus pedidos, por isso “Ele andava retirado pelas solidões e a orar” (Lc 5,16).
O poder da oração pertinaz!
Jesus foi para nós um exemplo insuperável da realização de seu próprio conselho: “Oportet semper orare et non deficere — Importa orar sempre e não deixar de o fazer” (Lc 18,1). É preciso rezar como se respira, e, portanto, em nenhum momento perder o fôlego nem o ânimo.
No evangelho de hoje, encontramos Jesus, em atenção a um pedido feito pelos seus discípulos, enfatizando a necessidade e a importância de rezar e nunca desistir de fazê-lo. Pois a oração unida à de Jesus e feita por sua intercessão é infalível: “Em verdade, em verdade vos digo que, se pedirdes a meu Pai alguma coisa em meu nome, Ele vo-la dará” (Jo 16,23). Baseando-nos nas palavras do Redentor, cabe a nós termos uma confiança inabalável no poder da oração.
Contudo, é imprescindível conformarmo-nos à vontade de Deus seguindo o exemplo do Seu próprio Filho quando Ele disse: “Meu Pai, se é possível, que se afaste de Mim este cálice! Todavia, não se faça como Eu quero, mas sim como Tu queres” (Mt 26,39). Ele externou esse anseio para deixar-nos claro o quanto é legítimo exprimirmos nossa dor, manifestando o desejo de que ela termine, mas sempre em conformidade com a vontade de Deus.
Haverá então orações que devem ser incondicionais? Sim, as graças claramente necessárias para a nossa salvação não podem ser pedidas de maneira condicional. Também quanto a essa forma de rezar, deu-nos exemplo nosso Senhor. E, aqui sim, suas orações proferidas de maneira absoluta, jamais deixaram de ser atendidas, segundo no-lo explica São Tomás de Aquino.[2]
Por exemplo, ao rezar por Pedro: “Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça; e tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos” (Lc 22,32). Foi pelos frutos dessa oração de Jesus que Pedro perseverou, se santificou e chegou ao seu belíssimo martírio. E certamente será por essa mesma causa que o sucessor de Pedro confirma na fé todos os fiéis.
É preciso rezar
Desta forma devemos entender o evangelho desse domingo como um convite para rezarmos cada vez mais. Se até o Filho de Deus quis orar tantas e tantas vezes durante a sua vida terrena, quanto mais nós precisamos fazê-lo. Mesmo que receamos não ter qualidade suficiente nas nossas orações, superamos essa carência pela quantidade de nossas preces, pois foi justamente esta a intenção Divino Mestre ao elaborar essa tão bela parábola.
Sobretudo, lembremo-nos que temos um Pai no Céu, sempre disposto a dar aquilo que pedimos (Cf. Lc 11,13), pois a oração faz fraco o forte Deus!
Extraído com adaptações de:
CLÁ DIAS, João Scognamiglio. O inédito sobre os Evangelhos: Comentários aos Evangelhos dominicais. Città del Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2012, v.6. p. 243-253.
[1] Cf. JOURDAIN, Zéphyr-Clément. Somme des grandeurs de Marie. Paris: Hippolyte Walzer, 1900, t.I, p. 56-57. Tradução pessoal.
[2] SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. III, q.21, a.4.
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