A via do maravilhamento, grande arma contra a depressão
Redação (Segunda-feira, 13-10-2014, Gaudium Press) Recordávamos esta manhã uma conversa que passamos a relatar em suas linhas essenciais:
– Estiveste em Cartagena de Indias e não tocaste o mar?, me perguntou um conhecido, em tom de mescla de incompreensão, leve agressão e curiosidade.
– Não, lhe respondi tentando a bondade; ocorre que o que me encanta dessa cidade é propriamente o cidade antiga, onde se pode -sobretudo nas noites, e quando não está invadido por certo turismo torpe e um tanto inculto- submergir-se no fantástico mundo do que era uma rica cidade da Espanha colonial do século XVII.
– Mas e o mar…?, insistia-me ainda perplexo e inquisidor interlocutor.
– Pois o grande e vasto mar… sim, não o toquei com minhas mãos, mas muito o admirei. Bem sabe você que poucas coisas são tão prazerosas como passear pelo alto das cortinas pétreas da cidade amuralhada, que em seu costado norte bordeia em largos trechos o histórico Caribe. O mar infinito, o mar de vários azuis e verdes de dia ensolarado, o mar que resguarda e oferece surpresas, esse mar que às vezes é mar violento… Cortinas de muralhas salpicadas de robustos e sentinelas baluartes, que também nos ajudam a remontar-nos à época dos galeões e das damas vestidas de seda e algodão, protegidas em simples e elegantes carruagens, de um ou dois cavalos. Esse passeio, para suscitar tua inveja, o fazia diariamente, e às vezes mais de uma vez por dia.
– Ahhh… sim.
Creio que foi então que meu companheiro começou a sentir o calor e sereno encanto que desfrutei em meu último passeio por Cartagena de Índias, lugar que favorece a bela utopia, onde a Providência me obsequiou com um elevado deleite espiritual. Sim, e sem haver saboreado as águas do belo e salgado mar…
E algo também lhe contei -não buscando me invejar, mas porque o bem-estar quando é autêntico e profundo tende a ser expansivo, a verdadeira alegria deve ser compartilhada com os demais- desse restaurante de preços muito, mas muito razoáveis, que descobri ali um dia feliz; um restaurante que se apropriou de uma antiga construção de uma ordem religiosa, e que nesse ainda sacral ambiente de pedra, de altos e decorados tetos, com simples e religiosos afrescos do Século XVI, oferece sorvetes quase celestiais, dos mais variados sabores tropicais, mesclados com ricas coberturas, frutas escolhidas, ou um suave chantilly, e que tem também em seu menu especialidades do mar.
E também lhe narrei minha diária peregrinação à Igreja de São Pedro Claver dessa maravilhosa cidade amuralhada, relicário em pedra coralina que guarda em bela urna os restos do imortal Escravo dos escravos, e a cujo costado se encontra o antigo e florido claustro que alberga o austero quarto de uso do santo nobre espanhol e a sala onde entregou sua alma a Deus. Lhe relatei igualmente meu deleite -um deleite que ainda que repetido não se desgasta-, com a fachada dessa igreja, que tem o mérito de que seus adornos de estilo barroco são dessa pedra de coral que é muito delicada de talhar. E assim mesmo lhe falei de minha romaria também quase diária à Igreja de Santo Domingo desta Cartagena do Poente, que é uma beleza de tons pastéis em seu interior, mas que é também uma igreja-fortaleza com suas baixas cúpulas reconstruídas para aguentar as balas dos canhões corsários, e com seus necessários apoios laterais para poder resistir toda a sólida estrutura. E lhe disse também de minha visita ao Museu naval, a poucos metros do mar.
Mas da mesma maneira me animei a falar-lhe de várias outras grandes/pequenas maravilhas, ao sentir que as portas de sua alma iam se abrindo à admiração desses magníficos restos que uma civilização de cunho cristão nos chegou, e que bem se conservam naquela fábula chamada Cidade antiga de Cartagena de Índias
***
Do muito bem informado catholic.net me chega um correio eletrônico, com um artigo do famoso psiquiatra espanhol Paulino Castells, que entre muitos outros dados recorda que hoje os adolescentes tem o dobro de probabilidade de sofrer depressão do que tinham os seus pais, e o triplo do que tinham seus avós. Algo está passando de grave nesses campos, o afirmamos também por outros dados que possuímos.
***
Em determinado momento se mesclaram em minha cabeça as duas situações de cima, para concluir algumas coisas que cremos ser relevantes.
Nos parece que um denominador comum nas pessoas deprimidas é uma espécie de fechamento em um mundo interior angustiante e/ou desesperançado. Estas pessoas sofrem de uma tristeza que não só as agoniza mas que de alguma maneira lhes obstaculiza a observação do mundo exterior, e com isso as priva do espiritual agrado da contemplação das grandes-pequenas maravilhas que sempre nos circundam.
Então, propomos para estes casos a prática e a investigação da “maravilhoterapia”. Ao deprimido devemos ajudá-lo a romper esse cerco cinza que entristece sua vida, esse verdadeiro calabouço do ruminar quase exclusivamente suas dores e desalentos. Nesse sentido, pode ser muito eficaz ir lhe habituando à contemplação das maravilhas. Podem ser grandes maravilhas, um castelo especialmente belo, uma paisagem elevadamente bela. Mas também das pequenas maravilhas: uma simples ave em um curto e elegante voo; uma árvore especialmente frondosa e exuberante de verde; a admiração de um simples mas nobre gesto de alguém que o quer, etc.
Às técnicas de reestruturação cognitiva, ou de diagnóstico e substituição de distorções básicas de pensamento, ou de fortalecimento de uma sã autoestima, ou de tantas outras válidas, consideramos que pode ser muito eficaz somar a técnica da “maravilhoterapia”.
Qualquer agrado para o deprimido, é algo muito valioso. Mas resulta que segundo São Tomás e o sentido comum, a beleza é algo que contemplado espontaneamente agrada. Então, sendo preciso que a pessoa deprimida “saia de si”, o caminho da contemplação desinteressada da maravilha que nos circunda pode ser um excelente recurso. Depois de praticar com a ajuda de outro, a pessoa deprimida poderá sentir que está já em seu poder o ir à procura desses agrados, ao contemplar com desprendimento de seu egoísmo as muitas coisas belas que ainda há em nosso redor.
Esta “técnica” pode ser completada com um aspecto místico-cristão, que analisaremos em futuras linhas.
Por Saúl Castiblanco
Traduzido por Emílio Portugal Coutinho
Deixe seu comentário