São Domingos de Gusmão: O santo que recebeu das mãos de Nossa Senhora o Santo Rosário
São Domingos de Gusmão foi um insigne Apóstolo na cruzada contra os albigenses e grande pregador do Santo Rosário, uma de suas principais armas contra os inimigos da Fé.
Redação (08/08/2020 07:00, Gaudium Press) Domingos nasceu na Espanha, em Calaruega, perto de Burgos e da abadia de Silos, em 1170. Era filho de Félix de Guzman e de Joana de Aza, mulher que se distinguiu pela grande piedade.
A Domingos, o que o fez santo, foi a educação cristã que recebeu. Instruído primeiramente na piedade, pela bem-aventurada Joana, e depois pelo preceptor, deu-se ao estudo, com afinco, à oração, com calor, às leituras piedosas, com carinho, e às obras de caridade, com afã.
Por espírito de penitência privava-se dos divertimentos permitidos à idade. Assim, enquanto os jovens da cidade, em bandos ruidosos, buscavam o espairecimento, Domingos, recolhido, procurava a Deus.
Quem foi São Domingos de Gusmão?
Estudando nas escolas públicas, vigiavam, com a maior atenção, o coração e os sentidos. Sempre ocupado com as coisas de Deus, falava pouco e, quando a isto era levado, fazia-o com moderação. Conversar, conversava somente com pessoas virtuosas. Era, então, circunspecto e doce ao mesmo tempo.
Os exemplos da mãe inspiraram-lhe grande devoção a Nossa Senhora e um amor pelos pobres fora do comum. Pelos desprotegidos privava-se de tudo o que possuía. Desfazia-se de dinheiro, de livros, de roupas, para ajudar os infelizes. Destarte, aos vinte anos, já despertava, na cidade em que nasceu, a caridade dos condiscípulos e de todos os habitantes daquela Calaruega de 1190.
A todos os filhos, Joana propiciou sólida educação cristã, imprimindo-lhes o selo de Deus, tanto assim que os três filhos que teve se tornaram religiosos: Domingos seria aquele decantado Domingos que atravessaria os séculos; o mais velho professaria na ordem de São Tiago; e o caçula na ordem dos Irmãos Pregadores, fundada pelo grande irmão.
Sonho profético de sua mãe
Joana de Aza, quando o trazia ainda em gestação, sonhou, certa feita, que carregava, no ventre, um cão em cuja boca se prendia, e bem preso entre os dentes, um archote de vivo fogo, fogo esse que se destinava a abrasar o mundo.
Que significava tão estranho sonho? Era um símbolo: na Idade Média, o cão designava os pregadores.
Também a madrinha de Domingos teve um presságio quanto à futura posição do afilhado: viu, uma vez, sobre a cabeça do menino, uma estrela, que dava a entender “que um dia o pequeno seria a luz das nações, e que havia de esclarecer os que jaziam nas trevas e à sombra da morte.”
É a estrela que aparece nos quadros do Angélico.
Caridade: uma das principais qualidades de Domingos
Educado, pois, primeiramente pela mãe, Domingos, depois aos cuidados de um tio, que era arcipreste na vizinhança de Calaruega, aos catorze anos, foi enviado a Palência. Ali estudou com ardor, principalmente teologia, distinguindo-se pela vivacidade, amor ao trabalho e virtudes. A caridade, sobretudo, pairava acima das demais qualidades que o adornavam.
O rumor daquele mérito não tardou a chegar aos ouvidos do bispo de Osma. Assim apenas conheceu o jovem Domingos, agregou-o, sem hesitar, ao seu capítulo.
Depois do ano de 1194, terminados com sucesso os estudos, o predestinado jovem de Calaruega foi residir em Osma, onde se tornou um dos suportes da reforma introduzida pelo bispo.
Por nove anos, o Pai dos pregadores levou vida de claustro. Desta fase da vida de São Domingos nada sabemos, senão que foi para todos os que com ele privavam modelo de piedade e regularidade. Giordano da Saxônia, autor de Libellus de pincipiis ord. Praed., conta-nos que o Santo “vivia confinado ao mosteiro”, donde saiu para, com Diego de Acebes, então bispo de Osma, cumprir uma nova missão delicada: pedir para o filho de Afonso IX de Castela, a mão duma princesa das Marcas.
Tudo correu maravilhosamente, e ambos tornaram à Espanha a dar conta do sucesso. O rei, satisfeito, fez com que os dois se incumbissem de trazer a princesa, de modo que o bispo e Domingos, de novo, demandaram as Marcas, para, muito tristemente, constatarem que a jovem que iria desposar o príncipe falecera repentinamente. Ao invés de buscar Castela, Diego enviou mensageiro a Afonso IX, para pô-lo ao par do acontecido, e, com Domingos, rumou para Roma.
Surgimento de diversas heresias
O objetivo de Diego de Acebes, em Roma, era tratar com o Papa uma questão que, de há muito vinha acalentando: ver-se livre do bispado, porque queria dar-se todo inteiro à evangelização das tribos nômades e idólatras dos Cumanos, na região do Don e do Volga, desejo que o bom bispo não viu satisfeito, em vista das heresias que então devastavam a cristandade: Inocêncio III, simplesmente, recusara-se tratar do caso de Diego de Acebes, já que outros campos de ação se ofereciam ao zelo do bispo e do companheiro.
Em Languedoc, por exemplo, uma nova heresia surgira que devia ser combatida – a albigense.
Apenas estabeleceu-se a religião cristã, surgiram-lhe no seio diversas heresias.
Os primeiros séculos da Igreja foram os que produziram maior número de sectários, a cuja frente se encontravam, quase sempre, bispos e arcebispos.
Naqueles tempos apareceram sucessivamente os gnósticos, que ensinavam que bastava a fé sem as boas obras, e cujos adeptos se arrogavam um conhecimento sublime da natureza e dos atributos divinos; os nicolaítas, que defendiam que as mulheres deviam ser comuns; os arianos, que negavam a consubstancialidade, ou seja, a igualdade de substância do Filho e do Pai na Trindade… (…)
Os hereges albigenses
Do século XII para o século XIII, vivia tranquila e pacificamente entre o Garona e a margem esquerda do Ródano uma população composta de homens simples, sensatos e valorosos, que a história, mais tarde, designaria com o nome de albigenses, homens que, contaminando por pregações apaixonadas que ameaçavam a Igreja, tornaram-se heréticos, rejeitando a autoridade papal e não admitindo a maior parte dos sacramentos. Pelo ano de 1200, estes hereges de Albi, achavam-se espalhados por quase toda a Europa, mas em maior número e, pois, mais perigosamente, ao longo do curso inferior do Danúbio, no norte da Itália e ao sul da França.
A doutrina filosófica da seita calcava-se num velho princípio pagão: a existência de duas divindades, uma boa, que criara as almas, e outra má, que criara o mundo dos corpos. E, ensinando que os homens deviam resguardar-se de tudo aquilo que fosse corpóreo, acabavam os seus adeptos, a rejeitar o matrimônio, a vida de família, tudo aquilo, enfim, que julgavam fosse de encontro com a pura espiritualidade.
Destarte, os mais ardorosos, os mais zelosos, passavam, muitas vezes, a desejar a morte.
Tanto pela filosofia como pelo modus vivendi, tais hereges eram, pois, naturais inimigos da Igreja Católica.
Papa convoca o Concílio de Verona
O Papa Lúcio III, alarmado com a consistência que tomavam os albigenses, os valdenses, restauradores do donatismo, e outras heresias, reuniu, em 1184, um grande concílio em Verona, do qual participou, espontaneamente, o imperador Frederico I.
Aquele concílio de Verona tomou as mais severas disposições contra os hereges: decretou que os condes, barões e outros senhores jurassem ajudar, e de mão armada, a Igreja, para descobrir e castigar os hereges, sob pena de serem excomungados e perder bens e direitos.
Os demais, que prometessem, também debaixo de juramento, denunciar ao bispo ou aos delegados, todas as pessoas que se suspeitasse viviam, na heresia ou formavam sociedade secretas.
Estabelecimento da Inquisição
A disciplina canônica, decretada pelo concílio de Verona daquele ano de 1184, faz crer que o estabelecimento da Inquisição datava daquela época.
O advento de Inocêncio III ao pontificado, em 1198, marcou a fase memorável da história da Inquisição. Este Papa, ao ver que a heresia dos albigenses triunfava das bulas apostólicas, insatisfeito com a maneira com que os bispos e delegados executavam as medidas decretadas pelo concílio de Verona, acabou por optar pela adoção de comissários que seriam encarregados de reparar o mal que os prelados não haviam extirpado. E, se não se atreveu, prontamente, a privá-lo da intervenção nos assuntos relativos aos hereges, achou meios de fazer com que a autoridade episcopal se tornasse quase nula.
Em 1203, Inocêncio III encarregou Pedro de Castelnau e a um Raul, ambos monges de Cister, de pregar contra os albigenses. Tais pregações tiveram êxito. Assim, pareceu ao Papa ser favorável o momento para introduzir na Igreja inquisidores dependentes dos bispos, que tivessem o direito de perseguir os hereges.
Diego de Acebes e Domingos de Gusmão, tornaram-se famosos perseguindo hereges com calorosíssimas pregações.
Em 1208, na França, sob o reinado de Filipe II e sob o pontificado de Inocêncio III, teve lugar o definitivo estabelecimento da Inquisição.
Fundação dos Dominicanos
Alguns meses antes da morte de Inocêncio III, São Domingos, cujo zelo em agir contra os hereges tornara-o estimadíssimo do Santo Padre, apresentou-se à corte romana com o fito de obter a autorização para fundar uma ordem destinada a pregar contra as heresias.
O Papa acolheu a ideia com grande satisfação, não escondendo a alegria que lhe ia na alma.
Dada a autorização, Domingos, imediatamente, pôs mão à obra: organizou o instituto e impôs-lhe a regra de Santo Agostinho, porque o concílio Lateranense de 1215 proibia novas Regras para ordens religiosas.
Em vista das novas Ordens, diz Joergensen que, numerosas haviam surgido em torno do ano de 1200, e para pôr fim à confusão que daí derivava, o concílio formalmente decretara que, no futuro, nenhuma ordem nova seria aprovada pela Igreja, e que nem quem que quisesse fundar uma nova ordem, ou construir um novo convento, seria obrigado a aceitar uma das antigas Regras, já aprovadas.
Entre os primeiros fundadores atingidos por este decreto estava São Domingos. E, em nota ao seu Livro III, diz Joergensen que este fato bastaria para destruir a asserção do escritor dinamarquês Bierfreund, segundo o qual Domingos, ao contrário de Francisco, teria sido sempre o favorito do Papa e da corte romana, e dele teria sempre obtido os privilégios pedidos.
Segundo Giordano da Saxônia, o Concílio de Latrão reconheceu tanto os frades dominicanos como os frades menores: mas nem uns nem outros puderam obter a aprovação pontifícia de sua Regra. O próprio Domingos, foi expressamente convidado a voltar para casa, e a deliberar com os seus frades sobre a escolha de uma regra a se impor, entre as de ordens já existentes.
Apóstolos da cruzada contra os albigenses
Como é sabido, os dominicanos escolheram a regra de Santo Agostinho; e Honório aprovou a escolha deles, declarando, de modo bastante explícito, que os dominicanos eram “uma ordem de cônegos segundo a Regra de Santo Agostinho”.
Morto Inocêncio III, Honório III subiu ao trono imperecível de São Pedro.
Satisfeito com a conduta de Domingos e dos companheiros, o novo pontífice autorizou a propagação da ordem em toda a Cristandade, de modo que, em pouco tempo, a Espanha e a Itália sentiam os seus efeitos.
Os dominicanos, pois, associados com a Inquisição, foram apóstolos da cruzada contra os albigenses, que o conde de Tolosa, senhor feudal, protegia, conde que chegou ao extremo de, em 1208, assassinar o delegado da Santa Sé, Pedro de Castelnau.
São Domingos de Gusmão, instituição do Santo Rosário e de sua festa
Um dos meios mais eficazes que São Domingos empregou para obter de Deus a conversão dos hereges, ao mesmo tempo, instruir os fiéis, foi a prática e a instituição do Santo Rosário, prática que consiste em se recitar quinze Pai-Nossos, e depois de cada Pai-Nosso, uma dezena de Ave-Marias, para honrar os quinze principais mistérios da vida de Jesus e de sua Santa Mãe. O terço é a sua terça parte. Rezá-lo bem é unir a oração do coração à oração vocal.
Sixto V aprovou o antigo costume de recitar o Rosário. Gregório XIII instituiu a festa do Rosário. Clemente VIII introduziu-a no Martirológio. Clemente XI estendeu-a a toda a Igreja. Benedito XIII inseriu-a depois no Breviário Romano.
Leão XIII, na Encíclica Diuturni temporis, de 1891, falando sobre a festa do Rosário, diz: Nós, em perene testemunho de nosso apreço por esta forma de piedade, além de havermos decretados que dita festa eu seu Ofício sejam celebrados em toda a Igreja, com rito duplo de segunda classe, também quisemos que o mês de outubro inteiro fosse consagrado a esta devoção. Enfim, prescrevemos que nas Ladainhas Lauretanas, se acrescentasse a invocação: “Rainha do sacratíssimo Rosário, como augúrio de vitória na presente luta”.
Encíclicas sobre o Santo Rosário de Nossa Senhora
O Papa Leão XIII, sobre o Rosário de Nossa Senhora, deixou-nos várias Encíclicas. Na sua Octobri Mense, entre outras coisas, sobre a excelência do Rosário, origem e glórias, escreve: Ora, como quer que, entre as diversas formas e maneiras de honrar a divina Mãe, são de preferir aquelas que por si mesmas são julgadas mais excelentes e a ela mais agradáveis, apraz-nos expressamente apontar e vivamente recomendar o santo Rosário.
A este modo de orar foi dado, na linguagem comum, o nome de coroa, porque ela também recorda, num feliz enredo, os grandes mistérios de Jesus e de Maria: as suas alegrias, as suas dores e os seus triunfos.
Se os fiéis meditarem e contemplarem devotamente, na ordem devida, estes augustos mistérios, haurirão deles um admirável auxílio, quer em alimentar a sua Fé e em preservá-la da ignorância e do contágio dos erros, quer em elevar e fortalecer o vigor do seu espírito. Com efeito, por esse modo o pensamento e a memória de quem reza são, à luz da Fé, atraídos com suavíssimo ardor para esses mistérios. Neles concentrados e imersos, nunca se cansarão de admirar a obra inenarrável da Redenção humana, levada a efeito a tão caro preço e com uma sucessão de tão grandes acontecimentos. E, diante destas provas da divina caridade, a alma se inflamará de amor e de ingratidão, consolidará e aumentará a sua esperança, e avidamente visará à recompensa celeste, preparada por Cristo para aqueles que se Lhe houverem unido pela imitação dos seus exemplos e pela participação das suas dores.
E enquanto isso, com os lábios se pronunciam as orações ensinadas pelo próprio Cristo, pelo Arcanjo Gabriel e pela Igreja. Orações tão cheias de louvores e de salutares aspirações não poderão ser repetidas, sem produzirem sempre novos e suaves frutos de piedade.
Santo Rosário: instrumento de guerra eficacíssimo para combater os inimigos da Fé
Que, pois, a própria Rainha do Céu haja ligado a esta oração uma grande eficácia, demonstra-o o fato de haver ela sido instituída e propagada pelo ínclito São Domingos, por impulso e inspiração dela, em tempos especialmente tristes para a causa católica, e bem diferentes dos nossos, e instituída como um instrumento de guerra eficacíssimo para combater os inimigos da Fé.
Com efeito, a seita herética dos albigenses, ora sorrateira, ora abertamente, invadira numerosas regiões, espantosa descendência dos maniqueus, repetia ela os monstruosos erros destes, e renovada as suas hostilidades, as suas violências e o seu ódio profundo contra a Igreja.
Contra essa turba tão perniciosa e arrogante, já agora pouco ou nada se podia contar com os auxílios humanos, quando o socorro manifestamente de Deus, por meio do Rosário de Maria.
Assim, graças à Virgem, gloriosa e debeladora de todas as heresias, as forças dos ímpios foram abatidas e quebradas, e a Fé de muitíssimos ficou salva e intacta. E pode dizer-se que semelhantes fatos se verificaram no seio de todos os povos. Quantos perigos conjurados! Quantos benefícios alcançados! A história antiga e moderna aí está para o demonstrar com os mais luminosos testemunhos”.
(Vida dos Santos, Padre Rohrbacher, Volume XIV, pp. 94-114)
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