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O celular pode te matar…

Redação (Terça-feira, 15-10-2019, Gaudium Press) Viajando, há algumas semanas, para a cidade da Guatemala, me surpreendeu um enorme cartaz com o título deste artigo: “O celular pode te matar”. Vai a propaganda de advertência! É claro que, apenas passado o primeiro pensamento, nos damos conta que é um ensinamento, por um lado, e uma advertência, por outro, para que as pessoas não cometam a tão acostumada imprudência de estar manuseando seu celular enquanto dirigem.

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Qual foi “o primeiro pensamento” que me veio à mente nesse momento? Em um rápido passar de ideias, de informações, de situações que estamos vendo a todo momento, me fez refletir a frase: “O celular pode te matar”.

Exagero, poderá dizer alguém. Serão casos extremos, fora do comum viver dos homens e mulheres que, a todo momento, em todo lugar ou situação, estão com… seu celular na mão.

Bom, no mundo há exageros, também pesquisas e resultados, que podem ser considerados como válidos ou completamente fora da realidade. Penetremos neste mundo para ver o que concluímos.

Em um estudo da Universidade de Utah, os psicólogos David Strayer e Jason Watson assinalaram que “a possibilidade de um acidente automobilístico pode ser tão alto para aqueles que, enquanto conduzem, falam por telefone ou mandam mensagens de texto, como para condutores que haviam tomado mais álcool que o permitido pela lei”. O resultado certifica que distinguen menos da metade dos detalhes e situações que lhes são apresentados, devido ao que qualificam de “cegueira atencional”. Ficava patente que detectavam a metade dos estímulos e tinham um tempo de reação mais lento às luzes de freio do carro à frente, segundo nos relata Facundo Manes neurólogo e neurocientífico (El País 21-12-2015). É uma “morte” parcial a qual se produz, não tão distante da forte frase do cartaz que me impactou. Mas, será só isso?

Outro fenômeno que ocorre, na linha de “morte” é o que neurólogos estão chamando como “demência digital”. Com os anos nos acontece -e não poucos o dizem-, que se retêm menos os números de telefone, as datas de aniversário, os endereços, os encontros que nos comprometemos. Nos dias de hoje, isso se vê também nos jovens. O consideram um transtorno cognitivo, fruto de que tudo, telefones de contato, agenda, notas, relógio, guardamos no celular. Mais ainda, se temos uma dúvida, ou queremos saber algo, o “googleamos”, como se diz vulgarmente. Tudo à mão imediatamente, com suas consequências.

Manfred Spitzer, psiquiatra e neurocientista alemão, expõem em seu livro “Demência digital” exemplos cotidianos, onde pretende demonstrar como, o uso de novas tecnologias, afetam nosso cérebro sem que nos demos conta.

Segundo Spitzer, se utilizamos nosso cérebro, este cresce, mas se não o utilizamos, ele se atrofia. Não somente ocorre a perda da memória com a idade; na realidade, devido a falta de exercício do cérebro, que tem sido suplantado pelas tecnologias, provocaria -segundo esta teoria- a “demência digital”.

Há uma repercussão na capacidade cognoscitiva, seja a concentração, a atenção, a linguagem, a agilidade visual, a memória, etc., o que alguns chamam de “efeito Google”. Vivemos sobrecarregados de informação, mas a mesma, diz o psiquiatra, não é conhecimento, o “Google não é parte do conhecimento”. A informação ficará na “nuvem”, não em nossa inteligência (El Mundo, 28-10-2016).

Morrer fisicamente ou “morrer” psicologicamente, é grave; deixar morrer a outro, também nos enche de preocupação. Uma expressiva vinheta, intitulada singularmente “sociedade do espetáculo”, mostrava o braço de um homem afogando-se, pedindo ajuda, de um lado; do outro, em terra firme, umas cinco pessoas filmando o momento com seu celular. Uma realidade? Uma mera caricatura de algo que não ocorre?; pois, há poucos meses tivemos a oportunidade de ler a triste notícia de um avião russo que faz uma aterrissagem de emergência, botando fogo na parte traseira do mesmo. Um passageiro optou por filmar, com seu celular, o interior do avião antes de saltar pela porta de emergência dianteira, aparecem chamas e se ouvem os gritos de terror dos que não podiam sair; ficaram calcinados 41 passageiros… (El país, 6-5-2019).

O celular pode nos matar, se dirigimos e cometemos a imprudência de usá-lo nessa circunstância. O celular pode nos matar deixando-nos “dementes digitais”, se não o usamos com moderação. O celular de outros pode nos “matar”, deixando-nos morrer, se filmam nossos últimos momentos, em vez de socorrer-nos.

Outra recente notícia -que nos faz ponderar e até dar risada- é um modelo de representação corporal em 3D, criado pela empresa de sistemas telefônicos virtuais ‘Toll Free Forarding’; mostrando como poderiam evoluir as características físicas do ser humano obcecado pelas tecnologias até 2100. O protótipo, que recebeu o nome ‘Mandy’, aparece em uma posição que não é tão distante de tanta gente que vemos ao nosso redor. Acabará tendo as costas encurvada, mão com a forma de agarrar o celular, o pescoço encolheria, e… um cérebro menor. (El Horizonte, México, 24 setembro 2019).

Será somente uma posição física? Mais grave ainda o considera o psicólogo alemão Spitzer afirmando que, se continuar esta tendência, muitos jovens viciados digitais não serão inteligentes e terão um perfil mais deprimido, mais solitário, mais insatisfeito com a vida. Adverte que, a sobreutilização das tecnologias digitais em idades precoces derivará em demência na velhice: “porque o cérebro não foi treinado. Se não adquirem determinadas capacidades aos 20 ou 25 anos não as adquirirão nunca” (El Mundo, 26-10-2019). Usemos com moderação e domínio as redes; que não nos suceda de cair na chamada: “escravidão digital”.

(Publicado originalmente em La Prensa Gráfica de El Salvador, 13 de outubro de 2019)

Por Padre Fernando Gioia, EP

www.reflexionando.org

Traduzido por Emílio Portugal Coutinho

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