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Instrumentum Laboris do próximo sínodo: um documento político progressista?

A Nova Igreja “inclusiva” do Cardeal Hollerich: o que alguns querem do sínodo.

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Redação (29/07/2023 09:58, Gaudium Press) No próximo sínodo, talvez a voz mais autorizada e que resume a opinião dos católicos progressistas seja a do cardeal de Luxemburgo Dom Jean-Claude Hollerich, o relator geral.

Sabe-se que o argumento e a estratégia que tais progressistas utilizarão para tentar modificar a doutrina deixada por Cristo será a sua versão de “inclusão”, supostamente contrária à discriminação:

“Para os jovens de hoje, o maior valor é a não discriminação. (…) Incomoda muito a discriminação! Há algumas semanas, conheci uma jovem de 20 anos que me disse: ‘Quero deixar a igreja porque ela não acolhe casais gays. Não sou lésbica, mas minha amiga é. Sei o quanto ela sofre e não quero estar entre aqueles que a julgam’. Isso me fez pensar muito”, afirmou Hollerich ao L’Osservatore Romano no final do ano passado.

Ademais, o cardeal jesuíta insistiu: “Ninguém está excluído: os divorciados e recasados, os homossexuais também, todos. O Reino de Deus não é um clube exclusivo. Abre as portas a todos, sem discriminação. Para todos! Às vezes há um debate na Igreja sobre se esses grupos têm acesso ao Reino de Deus. Isso faz com que alguns membros do povo de Deus se sintam excluídos. Você se sente excluído, e isso não está certo! Não se trata de sutilezas teológicas ou dissertações éticas: trata-se simplesmente de afirmar que a mensagem de Cristo é para todos!”

Portanto, – cremos que não traímos a essência do pensamento do Cardeal – é melhor deixar a teologia e a ética cristãs de lado quando se trata de pensar e construir esta nova Arca de Noé, que deve ser a sua Nova Igreja: todos devem entrar lá. (Vale lembrar que todos os animais irracionais entraram na Arca, pelo menos os da vizinhança, mas quase todos os racionais ficaram de fora, com as consequências que conhecemos…).

Além disso – e não nos surpreende –, nenhuma referência do cardeal nas suas declarações à necessária conversão do pecador, à metanóia – mudança de mentalidade, como sinônimo de mudança de vida – que se pede a todos para estarem unidos ao pensamento de Cristo e ao ser de Cristo.

Não. É inclusão, inclusão, inclusão e não discriminação: Primeiro Mandamento da Nova Igreja. Distinção entre Céu e inferno, Verdade e Erro, Bondade e Maldade, Beleza da santidade e Feiúra do pecado. Serão estes resquícios de casuística teológica ou ética inútil e bizantina que deve ser superada? Porque, como Hollerich também disse ao L’Osservatore, “a Igreja deve mudar”.

Mas esta mudança para a Nova Igreja Inclusiva deveria ser feita sem alarde ou debate: “a comunhão com Deus, Pai, Filho e Espírito Santo abre-nos à comunhão da Igreja. A comunhão com Deus, Pai, Filho e Espírito Santo evitará de converter o Sínodo num debate político em que cada um luta pela sua própria agenda”, declarou este cardeal jesuíta no dia 9 de outubro, na Sala Nova do Sínodo. Assim, o significado de termos tradicionais como “comunhão”, “catolicidade” e “universalidade” aproxima-se do significado de “inclusão”, tal como concebido pelos defensores desta Igreja Nova. E também são estabelecidas as premissas que necessariamente trazem a conclusão: se você não “incluir” as desejadas sacerdotisas, a comunhão dos divorciados, a bênção dos casais homossexuais e tudo o que existe na Criação, você não é apenas um discriminador, você simplesmente não é católico. E se você pensa o contrário, então “o que você quer é um debate político que rompe a comunhão com a Trindade. Você quer impor sua agenda, nós não’. Não dizem exatamente assim, mas dizem.

O problema para esses estrategistas é que o plano deveria ter sido desenvolvido pacificamente, tranquilamente, “sem debate” e isso não acontece. É um problema, porque no debate público e aberto eles perdem, visto que não é fácil conciliar suas intenções e posições com o que foi dito por Cristo, que chegou a afirmar que quem não estava com Ele era contra Ele, mostrando-se, assim, não tão ‘inclusivo’, do tipo Hollerich.

Infelizmente já há muitos que veem brechas no Instrumentum Laboris do próximo sínodo para que essa ideologia do progresso seja introduzida.

Por exemplo, o célebre George Weigel perguntou-se há poucos dias, no site de publicações religiosas First Things, por que razão o Documento de Trabalho (Instrumentum Laboris, ou IL) para o Sínodo de Outubro sobre a Sinodalidade é praticamente desprovido de referências aos santos, ou à herança de santidade da Igreja durante dois milênios, ou aos santos que nos rodeiam neste terceiro milênio sobre o ‘caminhar juntos'” (vimos acima que “santidade” não é um conceito que combina com o tipo de inclusão Hollerich).

Weigel ressaltou que não houve uma referência ao “chamado universal à santidade” da Lumen Gentium do Concílio Vaticano II, embora o sínodo seja apresentado como continuação desse Concílio.

Por sua vez, o Dr. Gavin Ashenden, um convertido do anglicanismo (estes são geralmente muito firmes na fé recém-adquirida, mais do que muitos católicos), já tem dois artigos este mês, no Catholic Herald, analisando o Documento de Trabalho do próximo sínodo: Synodality, ‘Instrumentum Laboris’ and the culture wars (Sinodalidade, ‘Instrumentum Laboris’ e as guerras culturais) e  Instrumentum Laboris or Instrumentum Deceptionis?

No primeiro artigo, Ashenden diz que tem o direito de se perguntar “se há uma conexão entre essa cultura sexualizada [de nossos dias] e nosso embarque em um ato de síntese cultural com uma sub ou anticristã cultura através do processo de sinodalidade. A pergunta que devemos nos fazer é se a sinodalidade aparece como tendo energia para converter a cultura secular à fé, ou se as prioridades da cultura secular subvertem a fé e a mudam”. Ou seja, não há opção, e há sempre “conversão”: ou ‘conversão’ à ‘fé’ do mundo, ou conversão à fé de Cristo (da qual, vale ressaltar, o Instrumentum Laboris não aborda, porque quando se trata de conversão é “mudança”: ou para que não haja mais abuso sexual, ou conversão à “unidade”, ou conversão em relação aos “marginalizados dentro da Igreja”, ou conversão a uma nova forma de “relações entre homens e mulheres na Igreja”, ou uma conversão ao “que já somos no Batismo”, mas não uma conversão no sentido clássico e real, que é o da mudança de nossa condição de pecadores, de não cumpridores dos Dez Mandamentos da Lei de Deus, rumo ao seu cumprimento, à santidade).

Em seu segundo artigo sobre o assunto, o Dr. Ashenden, decepcionado com o documento de trabalho do próximo sínodo, afirmou que “a impressão imediata dada pelo Instrumentum Laboris é que ele é, antes de tudo, um documento político, que trata de dinâmicas terapêuticas e progressistas; insensível (na melhor das hipóteses) à dimensão da alma e do espírito, preferindo o ego e a reforma social.”

Há uma sinodalidade espontânea permanente

Ele esclarece que a sinodalidade é algo comum na Igreja, “um processo contínuo que se desenvolve naturalmente fora de qualquer planejamento burocrático. Os católicos conversam e consultam-se. Olham, percebem, valorizam, reclamam e parabenizam. Nunca se pensou que fosse necessário um processo formal de gestão sinodal. Mas foi isso que nos foi dado.”

Essa sinodalidade católica espontânea e não dirigida, diferente da “sinodalidade burocrática”, preocupa-se e exige reformas em áreas onde a corrupção está presente na Igreja, como “abuso sexual clerical, encobrimento e proteção de abusadores, corrupção financeira institucional, afirmação de sexualidade desordenada fora do casamento, certo grau de clericalismo autoritário inflexível em alguns setores, e a passividade e laxismo na observância e a falta de entusiasmo pela evangelização que existe entre muitos leigos”.

Enquanto isso, “surge uma terrível suspeita de que [por via sinodal] está se atuando como um meio provisório para mudar a natureza da própria fé”, e “cresce a preocupação de que a sinodalidade burocrática seja apenas um pretexto para uma revisão progressiva da ética e da fé católicas”.

“Como as crianças da parábola que olhavam para cima e pediam pão espiritual, no Instrumentum Laboris, os autores deram aos famintos uma pedra espiritual. O pão é o que poderíamos chamar de psicoterápico em seu círculo, não do Espírito.”

“O Instrumentum Laboris escolhe diferentes áreas de nossa vida comum como as principais causas de nossa preocupação e as privilegia em detrimento das nossas preocupações sinodais informais.”

“Muita guerra, demasiadas alterações climáticas, economia injusta e alienação existencial de quem se identifica e o seu valor pelos apetites sexuais. Essas são, é claro, as impressões digitais do esquerdismo progressista, sejam elas encontradas em círculos políticos, LGBTQ+ ou de mudanças climáticas.”

“‘Pelos seus frutos’, mas também por sua linguagem, ‘ os conhecereis'”, destacou o ex-anglicano e agora muito católico Dr. Ashenden.

Em suma, a linguagem do católico progressista já é patente, revelando-nos as suas intenções.

Agora veremos que frutos dará o – para muitos – temido sínodo. Veremos se são de Cristo, ou se serão os da “inclusão de Hollerich”. Mas o debate está aberto, e Deus não abandona a sua Igreja.

Por Carlos Castro

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