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De seda e ouro

Bogotá (Quinta-feira, 08-11-2012, Gaudium Press) Com a abolição das corridas de touro, não somente os trajes de luzes deixaram de existir mas também o delicado trabalho à mão, artesanal, do qual provinham. Em outros tempos  os mais bonitos eram tecidos pelas virginais mãos de freiras de clausura.toureiro-foto alfredo romero.jpg

Feito de seda e fios de ouro e prata, alguns  deles com predras preciosas costuradas na jaqueta, passaram provavelmente aos museus e dali ao esquecimento gradual da opinião pública, até mesma dos que apreciavam seu colorido, adornos e especialmente seu significado. Sempre caros, cada traje tinha possuía um valor próprio e a qualidade de ser exclusivo. Salpicados de sangue e dor, não poucos são hoje guardados ainda rasgados em algumas partes, como testemunho de chifradas que muitas vezes eram mortais.

O traje de luzes é de origem espanhola, concretamente do começo dos século XVII, que vestiam os homens andaluzes retratados por Goya, muitos dos quais eram simples ajudantes nas brigas de touros que os nobres costumava fazer a cavalo, pois tinham a obrigação da caçar, em seus feudos, aos touros e javalis bravos e selvagens do caminho – que frequentemente atacavam romarias, caravanas de camponeses e tropas de animais de carga, deixando estragos, feridos e mortos, pois ninguém sabia como fazer para enfrentá-los.

Ao senhor das terras cabia, com sua capa, espada e lança não somente eliminar as feras de suas terras senão também proteger sua gente. Assim o nobre ofício tornou-se recreação, ainda muito discutida hoje em dia.

É curioso que semelhante delicadeza de seda e fios de metal precioso, se use – onde ainda existem as corridas de touro – para uma rude e arriscadíssima luta que pode custar a vida a um homem e deixá-lo lesado o resto de seus dias. Suaves ao toque, bordados com delicadeza e com lantejoulas brilhantes, mais parecem um presente feminino de muita elegância e elaboração que um vestido adequado para um duelo de morte.

Denominá-lo “traje de luzes” pelo brilho e colorido, parece evocar aquela visão da beata Ana Catarina Emmerick[1], que disse haver notado que nossos primeiros pais (Adão e Eva) antes do pecado que arruinou o plano inicial de Deus, emitiam luzes variadíssimas que provinham de distintas partes do corpo, aliás tão diferentes que pareciam refletir estados de ânimo durante o dia. Seja como for, esse contrário harmônico[2] tem uma carga simbólica[3] de muita riqueza psicológica para entender a mentalidade de um povo como o espanhol, onde o esplendor e o desafio constituem uma só personalidade, especialmente em cerimônias religiosas e festas populares.

Vestir o “traje de luzes” tinha todo um pequeno cerimonial secreto, que incluía ajudante e algumas orações ou jaculatórias diante de uma imagem religiosa. Brilhar a cor escolhida pelo toureiro, era um presente surpresa que ele dava ao público que assistia à corrida. O traje exigia certo porte e elegância ao caminhar, e inclusive certas regras do duelo, pois não se podia sair correndo com deselegância e brincadeira de algum lance da luta com o touro.

Sabê-lo vestir, exigia também certa estética corporal proporcionada, que ajudava a apreciar, sem malícia, essa bela obra de Deus que é o corpo humano feito do barro… e que ao barro voltará, mesmo vestido de luzes.

Antonio Borda / DA

[1] Beatificada em outubro de 2004 pelo hoje beato João Paulo II.
[2] Expressão utilizada pelo Professor Plinio Correa de Oliveira a respeito de certos contrastes da natureza e os costumes sociais que, aparentemente contrários, têm profundos e belos significados filosóficos e inclusive teológicos que os fazem harmônicos.
[3] Idem.

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