Papa Leão XIII publica Carta Apostólica “In unitate fidei”
Em preparação para sua próxima Viagem Apostólica à Turquia, o Papa Leão XIII publica a Carta Apostólica “In unitate fidei” por ocasião do 1700º aniversário do Concílio de Niceia.
Foto: Vatican News
Redação (23/11/2025 14:11, Gaudium Press) Em 2025, a Igreja Católica celebra o 1700.º aniversário do Primeiro Concílio Ecumênico de Niceia, realizado no ano de 325 d.C. por convocação do imperador Constantino I, na cidade de Niceia (atual İznik, Turquia).
Nesse contexto, o Papa Leão XIV realizará uma viagem apostólica à Turquia, com visitas previstas a Ancara, Istambul e İznik (antiga Niceia), por ocasião das comemorações jubilares do referido concílio.
O Concílio de Niceia, primeiro dos concílios ecumênicos reconhecidos pela Igreja, teve como objetivo principal resolver as controvérsias teológicas então existentes – especialmente a questão ariana – e estabelecer uma doutrina cristã unificada. Entre seus frutos mais significativos destacam-se a solene afirmação da divindade de Jesus Cristo, consubstancial ao Pai, e a promulgação do Credo Niceno.
In unitate fidei
A Carta Apostólica In unitate fidei do Papa Leão XIV, divulgada neste domingo, 23 de novembro, Solenidade de Jesus Cristo Rei do Universo, visa “encorajar em toda a Igreja um renovado impulso na profissão da fé, cuja verdade – que há séculos constitui o patrimônio comum dos cristãos – merece ser confessada e aprofundada de maneira sempre nova e atual”.
“Na unidade da fé, proclamada desde os primórdios da Igreja”, começa o Papa em seu texto, “os cristãos são chamados a caminhar em concórdia, guardando e transmitindo com amor e alegria o dom recebido”, recordando que “isto se expressa nas palavras do Credo: ‘Creio em Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, que desceu do céu para nossa salvação'”. O Papa lembrou que essa verdade foi formulada de forma eficaz há 1700 anos pelo Concílio de Niceia, o primeiro encontro ecumênico da história do cristianismo.
O Sumo Pontífice se referiu ao documento da Comissão Teológica Internacional Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador. 1.700º aniversário do Concílio Ecumênico de Niceia, publicado em 3 de abril passado, para aprofundar “a importância e a atualidade não apenas teológica e eclesial, mas também cultural e social do Concílio de Niceia”.
O Papa ressaltou que a proclamação da fé em Jesus Cristo, Filho de Deus, feita pelo Concílio em 325 d.C., “constitui o coração da fé cristã”. “Ainda hoje, em cada celebração eucarística dominical, recitamos o Credo Niceno-Constantinopolitano, a profissão de fé que une todos os cristãos”. Além disso, “nestes tempos difíceis que vivemos, em meio a tantas preocupações e medos, ameaças de guerra e violência, desastres naturais, graves injustiças e desequilíbrios, fome e miséria sofridas por milhões de nossos irmãos e irmãs”, observou o Papa, “este Credo nos dá esperança”.
Concílio de Niceia
Os tempos do Concílio de Niceia (325) eram profundamente conturbados. Embora o Édito de Milão (313), promulgado por Constantino e Licínio, “parecia anunciar uma era de paz externa, logo surgiram graves conflitos internos na Igreja”.
O principal foco de tensão foi a doutrina do presbítero Ário, de Alexandria, que negava a plena divindade do Filho, apresentando-O como um ser intermediário entre o Deus inatingivelmente distante e nós”, e que “teria havido um tempo em que em que o Filho ‘não era’”. Tal ensino, embora compatível com certas correntes filosóficas da época, espalhou-se rapidamente e ameaçou a unidade da fé.
Diante disso, o bispo Alexandre de Alexandria, reconhecendo a incompatibilidade dessa doutrina com a Sagrada Escritura, condenou-a num sínodo regional reunindo os bispos do Egito e da Líbia e alertou os demais bispos orientais.
“No entanto, os seguidores de Ário também se uniram. Isso levou a uma das maiores crises na história da Igreja do primeiro milênio. O motivo da disputa, na verdade, não era um detalhe secundário. Tratava-se do cerne da fé cristã”, sublinhou Leão XIV.
O imperador Constantino convocou, então, o primeiro Concílio Ecumênico da história, reunindo em Niceia, no ano de 325, cerca de 318 bispos — número até então sem precedentes.
Credo Niceno-Constantinopolitano
Os Padres do Concílio testemunharam a sua fidelidade à Sagrada Escritura e à Tradição apostólica, tal como era professada durante o batismo. Assim, o Credo Niceno começa professando: “Cremos em um só Deus, Pai onipotente, Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis”. E o Concílio foi chamado a definir o significado correto da fé em Jesus como “o Filho de Deus”.
“Os Padres confessaram que Jesus é o Filho de Deus na medida em que é ‘da substância (ousia) do Pai […] gerado, não criado, da mesma substância (homooúsios) do Pai’. Com esta definição, a tese de Ário foi radicalmente rejeitada’, frisou o Papa.
Portanto, os Padres de Niceia “quiseram reafirmar que o único Deus verdadeiro não está inatingivelmente distante de nós, mas, pelo contrário, aproximou-se e veio ao nosso encontro em Jesus Cristo”.
Ademais, Santo Atanásio sublinhou várias vezes e com grande força a dimensão soteriológica expressa no Credo Niceno. Com efeito, escreve que o Filho, descido dos céus, ‘tornou-nos filhos do Pai e, tornando-se Ele mesmo homem, divinizou os homens. Não se tornou Deus a partir da sua humanidade, mas a partir da sua divindade tornou-se homem para poder divinizar-nos’”, explicou Leão XIV.
Portanto, “o Credo Niceno não nos fala de um Deus distante, inatingível, imóvel, que repousa em si mesmo, mas de um Deus que está perto de nós, que nos acompanha no nosso caminho pelas estradas do mundo e nos lugares mais obscuros da terra”.
“A liturgia e a vida cristã estão firmemente ancoradas no Credo de Niceia e Constantinopla: o que dizemos com a boca deve vir do coração, para que seja testemunhado na vida”, frisou o Pontífice.
E depois acrescentou: “o Credo Niceno lembra-nos, com efeito, que não devemos esquecer que Jesus Cristo é o Senhor (Kyrios), o Filho do Deus vivo, que ‘pela nossa salvação desceu do céu’ e morreu ‘por nós’ na cruz, abrindo-nos o caminho para uma vida nova com a sua ressurreição e ascensão”.
Contudo, “seguir o Senhor compromete os nossos passos no caminho da cruz que, através do arrependimento, nos conduz à santificação e à divinização”, completou o Papa.
Ecumenismo
Em seguida, Leão XIV afirma que “o Concílio de Niceia é atual pelo seu altíssimo valor ecumênico. […] O diálogo ecumênico levou-nos, com base no único batismo e no Credo Niceno–Constantinopolitano, a reconhecer nos irmãos e irmãs das outras Igrejas e Comunidades eclesiais, os nossos irmãos e irmãs em Jesus Cristo e a redescobrir a única e universal Comunidade dos discípulos de Cristo em todo o mundo”.
Porém, Leão XIV aponta que “devemos caminhar juntos para alcançar a unidade e a reconciliação entre todos os cristãos. O Credo de Niceia pode ser a base e o critério de referência deste caminho. Propõe-nos efetivamente um modelo de verdadeira unidade na legítima diversidade. Unidade na Trindade, Trindade na Unidade, porque a unidade sem multiplicidade é tirania, a multiplicidade sem unidade é desintegração”.
O Pontífice conclui, aconselhando a “deixar para trás as controvérsias teológicas, que perderam a sua razão de ser, para adquirir um pensamento comum e, mais ainda, uma oração comum ao Espírito Santo, para que nos reúna a todos numa única fé e num único amor. […] Precisamos de um ecumenismo espiritual de oração, louvor e culto, como aconteceu no Credo de Niceia e Constantinopla”.




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