A internação do papa Francisco e quão longe estamos de um conclave?
Embora a infecção do papa não tenha sido qualificada como fatal, a condição do pontífice inspira cada vez maior preocupação devido à sua idade e ao histórico respiratório.
Cidade do Vaticano (17/02/2025 12:20, Gaudium Press) Na manhã de sexta-feira, 14, o Papa Francisco, 88 anos, foi internado no Hospital Gemelli para tratar uma bronquite, levando ao cancelamento do Angelus do domingo, 16, e de sua participação no Jubileu dos Artistas. O Vaticano informa que sua recuperação evolui bem, mas, como de costume, surgem especulações sobre uma possível renúncia. Estaria o pontificado realmente perto do fim, ou trata-se apenas de mais um boato?
O Papa Francisco está em seu terceiro dia de internação, a quarta em dois anos, observa a RaiNews. “Ele foi acometido por uma bronquite que se mostrou resistente aos tratamentos administrados em Santa Marta”, relata a mídia italiana. Segundo a Sala de Imprensa do Vaticano, “para facilitar sua recuperação, a equipe médica prescreveu repouso absoluto; portanto, amanhã, domingo, 16 de fevereiro, o Santo Padre não conduzirá a oração do Angelus, mas pretende enviar o texto para publicação.”
Como previsto, o Papa cancelou sua presença na missa dominical na Basílica de São Pedro e a visita aos estúdios de cinema de Cinecittà – a primeira de um pontífice – para um encontro com cerca de setecentos artistas. A missa foi delegada ao cardeal Tolentino de Mendonça, presidente do Dicastério para a Cultura e a Educação. Em mensagem aos fiéis, Francisco mencionou seu estado de saúde: “Gostaria de estar entre vocês, mas, como sabem, estou aqui no Policlínico Gemelli porque ainda preciso de algum tratamento para minha bronquite.”
A internação do Papa Francisco ocorreu dias após a audiência geral de 12 de fevereiro, quando, debilitado, precisou que um colaborador lesse seu discurso na Sala Paulo VI. “Eu, com minha bronquite, ainda não consigo”, disse na ocasião. “Espero que da próxima vez eu consiga.” Na semana anterior, havia mencionado um “forte resfriado”, posteriormente corrigido pela Sala de Imprensa da Santa Sé como bronquite. Na segunda-feira, 17, o Vaticano emitiu um comunicado dando mais detalhes sobre a bronquite do papa: “Os resultados dos exames realizados nos últimos dias e no dia de hoje demonstraram uma infecção polimicrobiana das vias respiratórias, o que levou a uma nova alteração na terapia. Todos os exames realizados até o momento indicam um quadro clínico complexo, que exigirá uma internação hospitalar adequada”. O texto não explicita a gravidade do quadro, mas deixa entender que ainda não houve melhora.
Embora a infecção do papa não tenha sido qualificada como fatal, a condição do pontífice inspira cada vez maior preocupação devido à sua idade e ao histórico respiratório. Aos 21 anos, Francisco teve parte do pulmão direito removido por uma infecção.
Nos últimos anos, a saúde do Papa Francisco tem sido fragilizada por problemas respiratórios, cirurgias e dificuldades de locomoção. Em 2024, cancelou compromissos por sintomas gripais e passou por exames no Hospital Gemelli. Em 2023, adiou uma viagem a Dubai por inflamação pulmonar e foi hospitalizado por bronquite infecciosa. Desde 2022, enfrenta dores no joelho e no nervo ciático, exigindo o uso de cadeira de rodas ou bengala.
Outras condições, como diverticulite, levaram a cirurgias intestinais em 2021 e 2023. Além disso, passou por procedimentos no joelho e enfrentou episódios frequentes de febre e resfriados. Sua saúde o obrigou a adaptar a agenda e delegar a leitura de discursos mais de uma vez, mas, apesar das limitações, segue ativo em eventos e audiências, além dos compromissos próprios do Ano Jubilar.
Entre 2023 e 2025, o Papa Francisco manteve uma agenda intensa, apesar das limitações de saúde. Em 2023, realizou viagens apostólicas à República Democrática do Congo e ao Sudão do Sul (janeiro-fevereiro), à Hungria (abril), a Portugal para a JMJ (agosto), à Mongólia (setembro) e a Marselha, França (setembro). A visita à COP28 em Dubai, prevista para dezembro, foi cancelada por razões médicas.
Em 2024, reduziu deslocamentos, concentrando-se em eventos na Itália, como a visita a Verona em maio. Para 2025, os preparativos do Jubileu estão em andamento, com a abertura da Porta Santa em 24 de dezembro de 2024. Apesar das restrições médicas, Francisco segue determinado a cumprir sua missão pastoral. Em 2022, admitiu que problemas no joelho impediram viagens a Kiev e Moscou.
A intensa agenda de viagens e o ritmo de trabalho parecem ter cobrado seu preço. Comparando fotos recentes com as de dois anos atrás, nota-se um evidente inchaço facial, que, segundo fontes médicas consultadas, pode ser efeito do uso prolongado de corticoides, comuns no tratamento respiratório, mas que no longo prazo, podem causar efeitos colaterais nos ossos, diabetes, hipertensão, problemas neurológicos e imunológicos, entre outros.
Diante do agravamento da saúde do Papa, surgem especulações sobre se ele estaria preparando a Igreja para uma renúncia ou apenas reconhecendo a limitação de seu tempo. Nos EUA, um influenciador sugeriu que Francisco já não toma as decisões cruciais de seu pontificado, alimentando a controvérsia. A coincidência entre sua internação e a indicação do filme “Conclave” a oito prêmios do Oscar intensificou ainda mais os debates no país, onde Francisco enfrenta resistência em algumas dioceses. No entanto, o próprio pontífice já afirmou que só renunciaria em caso de absoluta incapacidade, o que, por ora, não se verifica.
Seja qual for o desfecho desta internação, Francisco já lida com dois pontificados: o fim do seu e a preparação do próximo. Resta saber se voltará decidido a acelerar sua agenda ou a conduzir um encerramento mais sereno. Inevitavelmente, suas próximas decisões serão vistas como mensagens ao sucessor.
A conclusão da reforma da Cúria e da diocese de Roma, bem como a consolidação do seu projeto de sinodalidade, marcam essa reta final. Nomeações recentes refletem sua visão para o futuro: Irmã Raffaela Petrini, primeira presidente do Governatorato da Cidade do Vaticano, e Irmã Simona Brambilla, nova prefeita do Dicastério para a Vida Consagrada, indicam maior protagonismo feminino. No episcopado, a promoção do cardeal McElroy, alinhado a Francisco na questão da imigração, como arcebispo da capital norte-americana, e a carta aos bispos americanos sobre o tema demonstram que um papa pode, por vezes, influenciar a política, especialmente nos EUA.
Outro movimento estratégico foi a manutenção dos cardeais não-eleitores Giovanni Battista Re e Leonardo Sandri como decano e vice-decano do Colégio Cardinalício. Com isso, durante o período de Sé Vacante, as articulações ficarão nas mãos de cardeais sem direito a voto, permitindo maior margem de influência para figuras como Pietro Parolin, Tolentino Mendonça, Matteo Zuppi e outros homens de sua confiança.
Francisco pode ter mais passado que futuro, mas usou seu tempo para moldar o conclave que elegerá seu sucessor. Nomeou cerca de dois terços dos cardeais eleitores, priorizando afinidade ideológica em vez do tradicional critério de cargos ou sedes cardinalícias. Nos próximos meses, será interessante observar quais figuras ele fortalecerá e quais afastará.
A especulação midiática e o tom conspiratório de certos influenciadores pouco acrescentam e podem até desrespeitar o papa, que precisa das orações dos fiéis. No entanto, é evidente que, seja qual for o tempo que lhe resta, Francisco o usará para consolidar seu legado.
Rafael Tavares
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