O que é a Imaculada Conceição de Maria?
Hoje, 8 de dezembro, o 2º domingo do Advento cede lugar à celebração da Imaculada Conceição de Nossa Senhora. Mas o que significa dizer que a Mãe de Deus é Imaculada?
Redação (08/12/2024 09:12, Gaudium Press) Ensina a Teologia que Nosso Senhor, do alto da Cruz, confiando a Nossa Senhora o discípulo amado como filho (cf. Jo 19,26-27), entregou-lhe também a todos e a cada um dos homens que viverão até o fim do mundo, os quais estarão amparados por sua maternidade espiritual.
Ora, tão excelsa Mãe nos foi dada, mas será que realmente A conhecemos? Certo é que, mesmo no Céu, não cessaremos de nos encantar com seus sublimes predicados que, paulatinamente, passaremos a conhecer. Contudo, aquilo que nos seja possível vislumbrar já aqui na terra será de enorme valia para crescermos na devoção a ela e a amá-la ainda mais.
Por essa razão, celebrando a solenidade da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, antes do comentário à liturgia, convém entendermos o que é a Imaculada Conceição de Maria, singular privilégio d’Ela, e talvez desconhecido de muitos que A tem por mãe.
Para isso, nada melhor do que recorrer à etimologia destas duas palavras, Imaculada e Conceição. A primeira significa sem mancha, nódoa ou impureza. A segunda, se refere ao ato da geração no ventre da mãe.
Ora, aplicadas a Nossa Senhora, querem estes termos dizer que a Santíssima Virgem foi gerada sem mancha no claustro de Sant’ Ana, sua mãe. Porém, qual mancha? A mancha original, ou seja, aquela que todos os homens herdaram de nossos primeiros pais, Adão e Eva, como efeito da desobediência a Deus no paraíso, quando comeram do fruto proibido.
Sabemos pela doutrina católica que todos os homens nascem com o pecado original e, no momento do Batismo, em virtude dos méritos da Paixão de Cristo, são perdoados de dita culpa, permanecendo, porém, com os efeitos que lhe são próprios. Com Maria Santíssima, entretanto, em vista de seu primordial e singular privilégio de ser, acima de tudo, Mãe de Deus, isto não foi assim, pois Ela, desde o primeiro momento de sua concepção, por privilégio exclusivo de Deus, nunca teve em si a culpa original, nem sequer os seus efeitos.
É necessário ainda considerar que, além do fato de nunca ter havido nela o menor pecado, foi a Virgem Maria também santificada por Deus já no ventre materno, segundo atestaram alguns Padres da Igreja, como Santo Agostinho e São Justino, além de certos autores Cristãos, como Orígenes e Tertuliano, porquanto foi Ela cumulada com uma particular plenitude de graças pelo Altíssimo já desde o seu nascimento. Daí o Anjo Gabriel, no momento do anúncio da Encarnação, ter-se dirigido a Ela com as palavras: “Ave, cheia de Graça, o Senhor está contigo” (Lc 1,28).
Como justificar esta verdade?
A tradição nos demonstra que, desde o início do cristianismo, Maria já era considerada Imaculada, e muitos, arrebatados de encanto por sua pessoa, a consideravam, erroneamente, como a “4ª Pessoa da Trindade” (sic!), tão excelsa era a Mãe de Deus.
Desde o séc. VII, a Igreja celebrava no Oriente a festa da Imaculada Conceição de Maria. No Ocidente, porém, tal festa ganhou destaque somente a partir do séc. XII.
Contudo, os teólogos punham-se a questão: como explicar que a Santíssima Virgem foi concebida sem pecado original, uma vez que a Igreja pontifica que todos os homens foram redimidos por Nosso Senhor? Como conciliar estas duas realidades? E os estudiosos, embora cientes e crentes na Imaculada Conceição de Maria, digladiavam-se para solucionar dito impasse, procurando um meio de justificá-lo teologicamente.
A solução, entretanto, foi inspirada pelo Divino Paráclito ao Beato Duns Scotto (1265-1308). Segundo este franciscano, todos os homens foram objetos da Redenção. Contudo, é preciso considerar que, como “para Deus nada é impossível”, os méritos da Paixão de Cristo, uma vez que são “administrados” pela Santíssima Trindade, podem ser aplicados de modo liberativo ou preventivo. No primeiro caso, que é o de todos os homens, os méritos são aplicados no momento do Batismo, como já mencionado, e “libertam” da culpa ao ser administrado o Sacramento. No segundo, esta liberação foi preventiva, isto é, antes mesmo que Ela fosse concebida, por uma especial dádiva Deus, foi isenta da culpa. Perguntaram então a Duns Scotto como isso se deu, ao que ele respondeu: “Deus podia fazer, convinha que fosse feito, e Ele, por isso, fez”.[1]
Proclamação do Dogma
Passaram-se 19 séculos, e a piedade popular clamava para que esta verdade de fé fosse proclamada como dogma. Assim, no ano de 1848, sua Santidade, Pio IX, instituiu uma comissão de teólogos responsável por preparar a definição do dogma. Em 1849, enviou a Encíclica Ubi primum ao episcopado mundial, para pedir a opinião dos bispos a respeito da definibilidade. Dos 603 interrogados, 546 eram favoráveis.
Finalmente, no dia 8 de dezembro de 1854, por meio da Bula Inefabillis Deus – “Roma locuta, causa finita”,[2] – Maria Santíssima foi proclamada como Imaculada desde a sua conceição:
“Para a honra da santa e indivisa Trindade, para adorno e ornamento da Virgem Deípara, [..] proclamamos e definimos: a doutrina que sustenta que a beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante de sua conceição, por singular graça e privilégio do Deus onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada imune de toda mancha da culpa original, é revelada por Deus e por isso deve ser crida firme e constantemente por todos os fiéis”.[3]
Liturgia da solenidade
A liturgia desta solenidade gira em torno da Augusta Mãe de Deus. E a primeira leitura proclama o trecho do “protoevangelho” (Gn 3,15) que faz clara alusão, de acordo com toda a Igreja, à Santíssima Virgem, profetizando a luta incessante que seus filhos deveriam travar com o poder das trevas até o momento em que o mal esteja totalmente subjugado e derrotado, e o Reino de Cristo estabelecido na terra:
“Porei inimizades entre ti e a Mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar” (Gn 3,15).
O triunfo do Imaculado Coração de Maria
Ora, em nenhum momento da História o mal pareceu dominar tanto como em nossos dias. Basta sair à rua ou acompanhar um noticiário para o comprovar. Sem embargo, se isso é verdade, é bem verdade também que próximo está o Triunfo de Nossa Senhora prenunciado nas suas aparições de Fátima, pois já podemos constatar muitas de suas predições: guerras e catástrofes naturais e um previsível aniquilamento de várias nações. Mas “por fim, o meu Imaculado Coração Triunfará” – assegurou a Santíssima Virgem.
Logo, elevemos a Deus nossas preces, pedindo-Lhe que a cabeça da serpente seja esmagada por Nossa Senhora o quanto antes, e que Ela reine, desde já, no coração de todos os seus filhos.
Por Guilherme Maia
[1] Cf. FERNÁNDEZ, Aurelio. Teología Dogmática. Madrid: BAC, 2009, p. 423.
[2] Do latim, “Roma se pronunciou, a causa está encerrada”.
[3] DH 2803. In: DENZINGER, Heinrich; HÜNERMANN, Peter (ed.). Compêndio dos símbolos, definições e declarações de fé e moral. Trad. José Marino Luz; Johan Konings. São Paulo: Paulinas; Loyola, 2007, p. 615.
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