São Vicente Ferrer: o Anjo do Apocalipse
Considerado um dos maiores pregadores da História da Igreja, São Vicente Ferrer, em seus sermões, combatia os vícios não só do povo, mas também do clero e da nobreza.
Redação (11/08/2024 11:59, Gaudium Press) São Vicente Ferrer nasceu na cidade de Valência, Leste da Espanha, em 1350. Sendo seu pai tabelião, os membros do Conselho Municipal foram seus padrinhos de Batismo; para assistir à cerimônia uma multidão compareceu na igreja.
Desde menino, jejuava duas vezes por semana e era muito devoto de Nossa Senhora. Aos doze anos iniciou o curso de Filosofia e aos quinze, o de Teologia.
Entrou na Ordem dos dominicanos, foi ordenado sacerdote e doutorou-se em Teologia na Universidade de Lérida. Seus sermões nas igrejas e pregações em auditórios atraíam enorme número de pessoas.
O Cardeal espanhol Pedro de Luna, que se tornou antipapa sob o título de Bento XIII, ordenou-lhe mudar-se para Avignon – Sul da França – e o nomeou mestre do Palácio ocupado por Luna.
O Santo para lá se dirigiu, mas quis residir no mosteiro dominicano dessa cidade e recusou o bispado e o cardinalato que Bento XIII lhe ofereceu. Afastando-se do antipapa, continuou a exercer sua missão de pregador popular.
Dom das línguas
Fez pregações na França, Suíça, Alemanha e – a pedido do Rei Henrique IV de Lancaster – na Inglaterra, Irlanda, Escócia. Importantes cidades da Itália, como Gênova, Pisa e Florença, receberam sua palavra.
Esteve também nos profundos vales dos Alpes ocidentais, onde realizou muitas conversões de valdenses, adeptos de uma seita herética segundo a qual “a pobreza evangélica era absolutamente necessária para a salvação”.[1]
Milagre extraordinário! São Vicente falava no dialeto de Valência e as pessoas de outras nações, com idiomas diferentes, o entendiam perfeitamente porque ele possuía o dom das línguas, como São Pedro após a descida do Espírito Santo, discursando diante do Cenáculo.
Na Espanha, converteu milhares de maometanos. Em Toledo, na época capital do país, os judeus eram numerosos, ricos e poderosos. Muitos deles se tornaram católicos e diversas sinagogas foram transformadas em igrejas.
Increpava os vícios e incentiva as virtudes
Nas pregações, São Vicente tratava especialmente dos Novíssimos do homem – morte, juízo, Inferno, Paraíso–, increpando os vícios do clero, nobreza e povo, incentivando as pessoas para a prática das virtudes. Ele tivera uma visão de São Domingos de Gusmão e São Francisco de Assis, os quais lhe ordenaram falar sobre esses temas.
Pronunciou “mais de 6.000 sermões, que duravam mais de três horas cada um”.[2] Posteriormente, foram editados com base em anotações dos ouvintes.
O Rei Fernando I de Aragão, Norte da Espanha, nomeou-o seu representante no Concílio de Constança, realizado de 1414 a 1418.
Dirigindo-se àquela cidade da Alemanha, ele evangelizou algumas regiões da França. Devido a sua idade avançada, só conseguia caminhar apoiado nos braços de discípulos, mas na cátedra tinha o vigor da juventude.
Por recomendação dos superiores, ele iniciou seu regresso à Valência. Entretanto, na cidade de Vannes – Oeste da França –, em 5 de abril de 1419, entregou sua alma a Deus.[3]
A putrefação do clero traz a corrupção dos fiéis
A respeito de São Vicente Ferrer, Dr. Plinio Corrêa de Oliveira comentou:
“Poucas coisas são tão bonitas na vida dos Santos quanto situarmos a missão deles no panorama da luta entre a Revolução e a Contra-Revolução.
“De acordo com esse panorama, na Europa do século XIV a Cristandade começa exatamente a entrar em declínio. Era uma decadência eclesiástica terrível que se atestava pelo fato de haver papas exilados em Avignon, sob a férula dos reis da França, um cisma tremendo.
“Mas tal era a confusão na Cristandade que, ao lado de cada pseudopapa ou do papa, havia Santos que os apoiavam.
“Compreende-se, para isso ser possível, o que significava de putrefação do clero, a qual trazia como consequência a corrupção dos fiéis. Assim, era toda a Idade Média que entrava em putrefação, de caráter mais moral do que intelectual.
“Não se tratava tanto de uma grande heresia, mas de uma deterioração moral, uma explosão de orgulho e de sensualidade que começava, a qual deveria gerar depois os desvios intelectuais que são os erros da Revolução.
“Então a Providência enviou, muito adequadamente para essa época, um Santo que foi grande em sua esfera própria como, por exemplo, o foi São Tomás de Aquino na sua. Porque, se podemos dizer que São Tomás de Aquino foi o Doutor comum, o filósofo dos filósofos, o teólogo dos teólogos, o mestre dos mestres, podemos afirmar que, como pregador popular, depois dos Apóstolos, provavelmente ninguém excedeu a São Vicente Ferrer.
“Ele dizia de si mesmo que era o Anjo do Apocalipse, que tinha vindo para anunciar a derrocada da Civilização Cristã e o começo do fim do mundo. Com efeito, ele lutou enormemente para a moralização dos costumes, com vistas a sustar essa decadência moral”.
Combateu vigorosamente a tibieza dos católicos
Muito mais importante que as conversões de judeus, maometanos, hereges, “era o poder de sua pregação pela qual ele sacudia as consciências meio adormecidas, sendo assim, por excelência, o Santo oposto à tibieza, porque esse tipo de pregador que fala a respeito do Inferno, dos pecados, que tonitrua, pede o castigo do Céu, é exatamente o Santo chamado para falar, não às almas fervorosas, mas sobretudo às tíbias, e feito para sacudir aquelas que de outro modo não se podem convencer. Então se compreende o número colossal de conversões operadas por ele.
“Contudo, por mais numerosas que tenham sido, essas conversões foram insuficientes. Delas não surgiu um movimento, uma corrente organizada para combater a Revolução que nascia.
“O resultado é que São Vicente Ferrer converteu muitas almas, mas não a Cristandade, não converteu a sociedade enquanto tal, pois ele não foi tão ouvido pelos homens de seu tempo quanto eles deveriam tê-lo escutado.
“Assim, São Vicente Ferrer foi o dique que a Providência levantou contra a Revolução, mas que a maldade dos homens destruiu. Entretanto, na abertura dessa torrente que começa a cair para o abismo, fica de pé a figura grandiosa dele, anunciando as catástrofes que provinham do fato de ele não ter sido ouvido, exatamente como a de um profeta do Antigo Testamento anunciando desgraças ao povo eleito porque não tinha dado atenção aos enviados de Deus.”[4]
Por Paulo Francisco Martos
Noções de História da Igreja
[1] MIGNE, Jacques-Paul. Abbé. Encyclopédie Theologique. Paris: Ateliers Catholiques du Petit-Montrouge. 1851, v. 35-II, coluna 965.
[2] VACANT, A; MANGENOT, E. Dictionnaire de théologie catholique. Paris: Letouzey et Ané. 1950, v. 15-II, coluna 3042.
[3] Cf. DARRAS, Joseph Epiphane. Histoire Génerale de l’Église. Paris: Louis Vivès. 1883, v. 31, p. 588-596.
[4] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Dique levantado contra a Revolução. In Dr. Plinio. São Paulo. Ano 23, n. 265 (abril 2020), p. 11-12.
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