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Revolução na Boêmia promovida pelos hussitas

Durante o Concílio de Constança, realizado entre 1414 e1418, as heresias de Wyclif e João Huss foram condenadas.

Brozik Vaclav Hus pred koncilem 6. cervence 1415

Redação (03/08/2024 08:16, Gaudium Press) Wyclif estava sepultado numa paróquia da Inglaterra, embora tivesse sido excomungado. Por determinação do concílio, seus restos mortais foram dali retirados, queimados e jogados no pequeno rio que passa próximo àquela igreja.

João Huss, nascido na Boêmia – atual República checa –, era padre e tornou-se reitor da Universidade de Praga, que gozava de enorme prestígio pois diversos professores e muitos alunos da mesma eram alemães.

Um indivíduo bastante rico, que passou a ser chamado Jerônimo de Praga, fez cópias das obras de Wyclif e entregou-as a Huss que, fascinado, começou a pregar as heresias ali contidas.

Certo dia, no céu de Praga apareceram cruzes ensanguentadas e incandescentes, significando terríveis calamidades que logo sucederiam.

Quando o Papa Gregório XII condenou a doutrina de Wyclif, o padre Huss se revoltou contra o pontífice e obteve o apoio do Rei da Boêmia Venceslau IV. Fez pregações em importantes igrejas do país, atraindo grande número de pessoas.

Entre outros erros, Huss negava o poder papal, afirmava que todos os bispos e clérigos fieis ao papa eram instrumentos de satanás, quem se encontrava em pecado mortal não podia exercer nenhum poder na Igreja e na sociedade temporal; rejeitava a Tradição, os Sacramentos da Crisma, Confissão e Unção dos enfermos, o culto aos Santos, e defendia a predestinação.

Em 1412, Gregório XII o excomungou.

Heresiarca punido pelo poder temporal

Incitando o ódio contra os alemães residentes na Boêmia, Huss provocou o assassinato de alguns deles. Muitos professores e perto de 20.000 alunos estrangeiros da universidade emigraram.

Os hussitas invadiram a Catedral de Praga e, em diversas paróquias, ameaçaram de morte os sacerdotes que combatiam a heresia.

Convidado pelo Imperador Sigismundo – que era também Rei da Boêmia, como sucessor de seu irmão Venceslau IV –, Huss dirigiu-se a Constança.

Encontrava-se nessa cidade uma delegação de prelados, párocos e doutores de Praga que pediram ao Concílio a punição de Huss por ter propagado heresias na Boêmia, promovido tumultos no povo, induzido os leigos a usurparem os bens da Igreja.

Exigiam sua prisão pois, se permanecesse livre, “na Boêmia se levantaria uma casa contra outra, a heresia se propagaria rapidamente pela Alemanha e surgiria uma perseguição contra a Igreja como nunca houvera”.[1]

Huss deu de ombros a essa advertência; continuou a vituperar o Papa e os membros da Hierarquia eclesiástica.  Então, o concílio o condenou como herege e o reduziu ao estado laical.

O Duque da Baviera, em nome do Imperador e representando o poder temporal, conduziu-o ao local de punição: rasparam sua cabeça, sobre a qual colocaram um boné de papel com a inscrição “heresiarca”, mudaram suas vestes pelo traje de condenado. Recomendaram-lhe, mais uma vez, que abjurasse a heresia, mas ele recusou cheio de ódio.  Então, foi queimado e seus restos jogados no Rio Reno.

Alguns meses depois, seu discípulo Jerônimo de Praga – que viajara para Constança a fim de “defender” o heresiarca Huss – foi condenado pelo Concílio, e lançado às chamas pelo “braço secular”.

Pregavam partilha de bens e supressão dos ricos

Após a morte de Huss, seus asseclas promoveram na Boêmia terríveis convulsões, saquearam residências dos eclesiásticos e mosteiros, assassinando diversos monges. Os taboritas – hussitas radicais – pregavam “a partilha de bens e a supressão dos ricos e dos nobres” [2],  ou seja, o comunismo.

Em 1418, Martinho V nomeou o dominicano Beato João Dominici – que atuara com tanta sabedoria e eficiência no Concílio de Constança – Legado pontifício na Boêmia e Hungria. O papa deu-lhe a missão de procurar converter os hussitas, mas se encontrasse oposição deveria “convencer os príncipes a tomar as armas contra os hereges”[3].

Tendo os hereges resistido ferozmente a suas atividades, o Beato solicitou a intervenção do Imperador Sigismundo, mas este preferiu continuar sua política de tolerância.  Consequentemente, os hussitas multiplicaram sua audácia e dominaram toda a Boêmia. Vemos, assim, como a moleza dos bons é a força dos maus.

Apostasias e ódio contra a Igreja

As desordens e sacrilégios na Boêmia se avolumaram sob a direção de um padre premonstratense apóstata, que se tornara hussita. Ele caminhava pelas ruas de Praga levando ostensivamente a Eucaristia e exortando o povo a eliminar os católicos.

Em 1419, invadiram o Palácio do Conselho de Praga, agarraram sete conselheiros católicos – que estavam no andar superior – e os jogaram através das janelas à praça fronteiriça, onde hussitas se encontravam com suas lanças erguidas. Instigados pelo padre apóstata, que segurava levantada uma Hóstia, os hereges os chacinaram. Esse crime hediondo passou a ser conhecido como “defenestração de Praga”.

Outra apostasia foi a do Arcebispo de Praga, que entregou aos hussitas várias fortalezas. O papa o excomungou e, pouco depois, ele morreu impenitente.

Um exemplo de ódio asqueroso contra a Igreja foi dado por Ziska, que era de família nobre e um dos principais chefes dos hereges. Atingido pela peste negra, pediu que após sua morte arrancassem sua pele para se fazer um tambor, o qual seria tocado a fim de conduzir os hussitas na luta contra os católicos.

Carta de Santa Joana d’Arc aos hussitas

Os hussitas denominaram a Boêmia “Terra prometida”, e as nações que lhe faziam resistência de terras de filisteus ou moabitas. Na realidade, na Boêmia, corria rios de sangue e não “leite e mel”, segundo as palavras da Sagrada Escritura relativas à verdadeira Terra prometida.

Após a sagração do Rei da França Carlos VII na cidade de Reims, em 17 de julho de 1429, Santa Joana d’Arc ditou uma carta dirigida aos hussitas, dizendo que “vinha da parte de Deus e faria cair sobre eles seu braço, se não voltassem ao seio da Igreja e não se submetessem à autoridade do Pontífice romano”[4].

Wyclif e Huss foram precursores de Lutero. No frontispício de um livro de cantos, elaborado pelos hussitas no início do século XVI, há uma gravura de um edifício representando a Igreja Católica, junto ao qual Wyclif ateia o fogo, João Huss traz o combustível e Lutero brande o archote.

Por Paulo Francisco Martos

 Noções de História da Igreja


[1] WEISS, Johann Baptist. Historia Universal. Barcelona: La Educación.  1929, v. VII, p. 7755-776.

[2] DANIEL-ROPS, Henri. A Igrerja da Renascença e da Reforma (I). São Paulo: Quadrante. 1996, v. IV, p. 159.

[3] DARRAS, Joseph Epiphane. Histoire Génerale de l’Église. Paris: Louis Vivès. 1883, v. 31, p. 229.

[4] Idem, ibidem, p. 306.

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