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O “sim” ao chamado de Deus: uma opção?

A liturgia deste 15º Domingo do Tempo Comum nos convida a refletir sobre o nosso chamado como batizados: de que adianta ao homem ganhar o universo se vier a perder a sua alma?

Gesu insegna agli Apostoli

 Redação (13/07/2024 17:15, Gaudium Press) Pelos idos anos de 1500, um jovem da nobreza espanhola fixou residência em Paris, a fim de lá se formar na melhor universidade da Europa, e ser um digno representante de seus ancestrais. Era ele descendente dos reis de Navarra, e sua família frequentava a corte espanhola.

Desde pequeno, se sobressaía por sua brilhante e viva inteligência. Ao ingressar para o curso de Filosofia na universidade, fê-lo com a intenção e o propósito firmes de se distinguir de seus companheiros, o que conseguiu sem muito esforço, pois sua inteligência não admitia dificuldades. Dele se dizia: “nunca estudante algum conseguira em Paris tanto com tanta facilidade”.[1] E não havia matéria alguma que fosse obstáculo para sua capacidade. Seu nome era Francisco Xavier.

Em determinado momento de seus estudos, quando Francisco já tinha as metas claras para o seu futuro, conheceu um novo estudante de aproximadamente 40 anos, o qual, segundo diziam as más línguas, possuía “superpoderes” e andava atemorizando as pessoas. Francisco, porém, não se deixando levar pela opinião alheia, travou amizade com o “suspeito”, e encantou-se pela santidade e virtudes deste misterioso varão, cujo nome era Inácio de Loyola.

Inácio, que ansiava por fundar a Companhia de Jesus, discernindo que Francisco poderia ser um de seus discípulos, pôs-se a fazer apostolado com ele explicando-lhe as verdades eternas, com o intuito de atraí-lo à futura Ordem.

Com o passar do tempo, quando a amizade já estava mais que consolidada, Francisco, que contava então 27 anos, sentia em seu interior um grande temor quando o amigo lhe falava qual era a vontade de Deus a seu respeito, e caiu numa profunda tristeza, pois não queria abandonar as honras do mundo. Inácio, dotado de grande discernimento, percebendo o estado de Francisco, aproximou-se dele e perguntou-lhe o que estava sucedendo, ao que o jovem lhe confiou os segredos do coração. Após ouvi-lo pacientemente, Inácio indagou-lhe: “Francisco, de que adianta ao homem ganhar o universo se vier a perder a sua alma?”[2]

Estas palavras penetraram como uma espada no coração de Francisco Xavier. E ele, como o auxílio dos céus, correspondeu à voz de Deus que lhe chamava. E hoje, graças a esse “sim”, podemos nos dirigir a ele como São Francisco Xavier!

O chamado

A história acima mencionada bem ilustra a liturgia deste 15º Domingo do Tempo Comum, que bem poderia ser acunhada de liturgia do chamado. Com efeito, na primeira leitura, contemplamos o profeta Amós narrando o chamado que Deus lhe fez para profetizar ao povo de Israel (cf. Am 7,12-15). Na segunda leitura, vemos São Paulo afirmar aos Efésios que todos nós, batizados, somos chamados a ser santos e irrepreensíveis diante de Deus (cf. Ef 1,3-4). No Evangelho, após Jesus ter chamado os doze, envia-os como testemunhas suas (cf. Mc 6,7-13).

De fato, a palavra vocação, muito corrente entre nós, vem do latim vocare, que quer dizer chamar. Assim, diz-se daquele a quem Deus chama para algo, que possui uma vocação. Ora, todos os homens têm uma vocação, visto que não há homem que passe pela Terra e não receba um chamado de Deus.

Em primeiro lugar, todos nós, que fomos criados à imagem e semelhança de Deus, somos chamados à santidade. Alguns alcançarão essa santidade no matrimônio, outros na vida religiosa, outros, enfim, no sacerdócio. E dentro desses estados, Deus chamará alguém a ser um excelente confessor, outro poderá ser uma exímio superior de uma casa religiosa, outro será pintor, poeta, músico, professor, médico, ou muitas outras coisas que não caberia aqui enunciar.

E esse chamado, nos é dado já antes de nosso nascimento, conforme declarou o salmista: “Ainda informe vossos olhos me olharam e por Vós foram previstos os meus dias” (Sl 139,16). Ou ainda, como disse o Senhor a Jeremias:

“Antes de formar-te no seio de tua mãe, eu já te conhecia, antes de saíres do ventre, eu te consagrei e te fiz profeta para as nações” (Jr 1,5)

Cabe a nós, portanto, ouvir a voz de Deus que se manifesta a nós, revelando esse chamado seja em nosso interior ou por meio de uma causa externa. E, uma vez que esteja claro para nós qual é Sua vontade a nosso respeito, nossa atitude deve ser a mesma do profeta Isaias:

“O Senhor abriu-me os ouvidos. Não lhe resisti nem voltei atrás” (Is 50,5).

Ou seja, não devemos e nem sequer temos o direito de opor resistências à voz da graça. Porque, como diz o Apóstolo: “A vocação e os dons de Deus são irrevogáveis” (Rm 11,28-30). Logo, uma pessoa nasce com uma vocação e morrerá com ela, e no dia de sua morte, será julgada em função da fidelidade a esse chamado. Assim, alguém que esteja chamado a ser um monge e decide ser médico, pode comprometer gravemente sua salvação eterna.

Peçamos a Nossa Senhora, a exemplo de São Francisco Xavier, que digamos um generoso “sim” ao chamado de Deus a nosso respeito, e que Ela nos conceda graças superabundantes para abandonarmos tudo aquilo que nos impede de trilhar o caminho do serviço Divino, compreendendo como passam as coisas deste mundo, e nos auxilie a perseverar em nosso chamado, seja ele qual for, a fim de que um dia estejamos todos unidos no Céu. E que tenhamos fincadas em nossos corações as palavras dirigidas por Santo Inácio a seu discípulo: de que adianta ao homem ganhar o universo se vier a perder a sua alma?

Por Guilherme Maia


[1] DAURIGNAC, J.M.S. São Francisco Xavier: apóstolo das Índias. Trad. M. Fonseca. 2. ed. Rio de Janeiro: CDB, 2018, p. 35.

[2] Idem.

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