Atentado de Anagni
O Rei Felipe, o Belo, neto de São Luís IX, promoveu contra o Papa Bonifácio VIII, em 1303, um atentado que foi uma das causas da Revolução Francesa.
Redação (13/04/2024 10:30, Gaudium Press) Nascido em 1268, foi sagrado rei aos 17 anos de idade. Muito parecido com seu avô, pela sua presença e perfeição de traços fisionômicos, Felipe foi cognominado “belo”.
Desde menino, participava das Missas diariamente e usava cilício. Mas deixou-se dominar pelo orgulho, o qual arrasta todos os outros vícios.
Envolveu-se em graves problemas financeiros: apoderou-se de grande parte dos bens da Ordem do Templo, expulsou os judeus da França açambarcando suas fortunas, fez manipulações monetárias alterando o valor das moedas de ouro.[1]
Iniciador do absolutismo na França
As leis medievais tinham “como ponto de partida a noção de que o verdadeiro soberano de um reino não é o senhor feudal, nem o rei, nem o imperador, mas o Direito, cuja origem é divina”.[2] O Decálogo era a Lei das leis.
Felipe, o Belo, deixou-se governar por legistas, entre os quais o ímpio Nogaret. A respeito dos legistas, Dr. Plinio Corrêa de Oliveira explica:
“O absolutismo dos legistas, que se engalanavam com um conhecimento vaidoso do Direito Romano, encontrou em príncipes ambiciosos um eco favorável. E pari passu foi-se extinguindo nos grandes e nos pequenos a fibra de outrora para conter o poder real nos legítimos limites vigentes nos dias de São Luís de França e São Fernando de Castela”.[3]
O neto do rei santo “iniciou o absolutismo na França [que foi] uma das causas da Revolução Francesa”.[4]
Devido a algumas ações contra a Igreja praticadas por Felipe, o Papa Bonifácio VIII o ameaçou de excomunhão e, em 1302, lançou a bula Unam Sanctam a qual, utilizando a metáfora das duas espadas, versa sobre o poder espiritual e o poder temporal.
Bem diferente de São Gregório VII – papa de 1073 a 1085 – que excomungou o Imperador Henrique IV, o maior potentado da época, Bonifácio VIII não anatematizou Felipe, o Belo, o qual se revoltou contra o pontífice e conseguiu apoio de bispos, nobres e burgueses.
Em inícios de 1303, Nogaret, nomeado chanceler, pediu a Felipe, o Belo, que prendesse o papa. Os fraticelli – comunistas que se separaram da Ordem dos franciscanos – e a poderosa família romana dos Colonna aderiram a Felipe.
Bonifácio VIII foi esbofeteado
Em 8 de setembro de 1303, Nogaret, sob as ordens do rei e auxiliado por uma tropa de 2.000 homens, chegou à pequena cidade de Anagni, nas proximidades de Roma, onde Bonifácio VIII se encontrava em seu palácio de verão.
Nos estandartes dos militares franceses figuravam São Pedro e flores-de-lis, para fazer com que a população julgasse estarem eles lutando pela Igreja. O chefe da milícia burguesa, responsável pela segurança da cidade, se vendera aos conspiradores e não permitiu nenhuma reação contra estes.
Em Anagni, Nogaret uniu-se ao senador romano Sciarra Colonna, que fora condenado pela Justiça devido a suas conspirações contra a Igreja e se aliara ao movimento revolucionário dirigido por Felipe, o Belo.
A tropa dos franceses pôs fogo às portas da catedral e penetrou no castelo papal, onde fizeram pilhagens. Nogaret e Sciarra correram aos aposentos de Bonifácio VIII.
O pontífice, com 83 anos de idade, estava sentado em seu trono, com paramentos completos e tiara; numa das mãos segurava a cruz e na outra as chaves. Apenas dois cardeais que o apoiavam se encontravam ao seu lado.
Os soldados, dando urros de revolta, entraram na sala. Mas, ao verem aquele venerável ancião, ficaram imobilizados, mudos e se retiraram. Movido por ódio satânico, Sciarra arrancou o pontífice de seu trono e o esbofeteou.
Nogaret intimou Bonifácio VIII a convocar um concílio para ser julgado. Por ter recusado a cumprir essa ordem infame, o papa ficou preso pois pretendiam levá-lo para a França.
Marco inicial do processo revolucionário
Na manhã seguinte, tendo os militares franceses se dispersado, um cardeal fiel foi à praça fronteiriça e bradou “Viva o Papa! Morte aos estrangeiros!”
Os habitantes de Anagni, sobretudo os camponeses, levantaram-se em armas e, gritando “Viva o Papa, morram os traidores”, mataram grande número dos invasores, mas Nogaret e Colonna conseguiram fugir.
Após libertarem o pontífice, os autênticos católicos, portando os estandartes da França, caminharam pelas ruas da cidade plenos de alegria.
Quatrocentos cavaleiros romanos chegaram a Anagni e conduziram à Cidade eterna Bonifácio VIII, que se encontrava num “profundo abatimento”.[5]
Do conhecido “Dicionário de Teologia Católica” consta a frase: “Retornando a Roma, ele vegetou ainda durante um mês e morreu em 11 de outubro de 1303”.[6]
Como seria belo se o papa recorresse a Nossa Senhora, pedindo-Lhe fortaleza! A Virgem o atenderia e ele continuaria lutando pela Igreja até o último hausto.
Dr. Plinio Corrêa de Oliveira afirmou que o atentado de Anagni foi o “marco inicial deste processo [revolucionário] que se desenrola até nossos dias”.[7]
Em novembro de 1314, Felipe, o Belo, morreu após ter caído do cavalo durante uma caçada. Tinha 46 anos de idade.
Relações entre a Igreja e o Estado
Lançando o Estado contra a Santa Igreja, Felipe, o Belo, trabalhou pela perdição das almas. Pois, “sendo o Estado composto de homens, não poderia ter outra finalidade a não ser a dos homens. Se estes são criados para a glória de Deus, o Estado deveria agir no sentido da salvação das almas.”[8]
Rezemos para que seja logo esmagada a Revolução gnóstica e igualitária a fim de ser implantado, em todo seu esplendor, o Reino de Maria.
Por Paulo Francisco Martos
Noções de História da Igreja
[1] Cf. DANIEL-ROPS, Henri. A Igreja das catedrais e das Cruzadas. São Paulo: Quadrante. 1993, v. III, p. 656.
[2] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Idade Média: o Direito consuetudinário. In Dr. Plinio. São Paulo Ano 23, n. 270 (setembro 2020), p. 9.
[3] Idem. Revolução e Contra-Revolução. 5. ed. São Paulo: Retornarei. 2002, p. 27.
[4] Idem. Influência: até onde ela chega? In Dr. Plinio. Ano 14, n. 154 (janeiro 2011), p. 29.
[5] DARRAS, Joseph Epiphane. Histoire Génerale de l’Église. Paris: Louis Vivès. 1882, v. 30, p. 122.
[6] VACANT, A; MANGENOT, E. DICTIONNAIRE DE THÉOLOGIE CATHOLIQUE. Paris: Letouzey et Ané. 1910, v. 2-I, coluna 996.
[7] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Revolução A e Revolução B. In Dr. Plinio. Ano 24, n. 276 (março 2021), p. 16.
[8] Idem. Tempo houve em que a filosofia do Evangelho governava os Estados… In Dr. Plinio. Ano I, n. 5 (agosto 1998), p. 18.
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