A estrela, os Magos e a docilidade ao Espírito Santo
À dureza de coração da maioria do povo eleito, rejeitando o nascimento do Messias, opõe-se o exemplo de docilidade ao chamado de Deus, manifestado por reis pagãos de longínquas nações.
Redação (05/01/2024 17:46, Gaudium Press) Estudiosos da astronomia e interessados pelas coisas do céu, em vez de se ocuparem com glórias mundanas, foram os Magos preparados pela Providência para discernir o significado de uma misteriosa estrela que começou a se mover no firmamento. Por uma inspiração do Espírito Santo, sabiam ter chegado a hora de nascer um Rei que seria ao mesmo tempo Deus e, portanto, deveria ser adorado.
Mas como eles concluíram que este Menino devia surgir no seio do povo judeu? Talvez se basearam em algum conhecimento da Revelação escrita e na expectativa messiânica de Israel, largamente difundida no Oriente pagão.[1] Decerto tocados pela graça, tiveram uma experiência sobrenatural de que algo grandioso adviria, e interpretaram o aparecimento da estrela como um sinal que os pôs em movimento em busca do Rei recém-nascido que haveria de mudar a História. “Vimos” e “viemos”, diz o Evangelho. Ou seja, bastou-lhes ver a estrela para abandonarem tudo com uma docilidade única, prontidão exemplar e total confiança em Deus, e, sem medir esforços, empreenderam uma longa viagem através de desertos e montanhas, enfrentando toda espécie de riscos, inclusive a incerteza quanto à acolhida que teriam no reino de Israel, por mais distinta e numerosa que fosse sua comitiva.
Vê-se, pois, não terem agido motivados por prudência humana, mas, sim, pelo impulso do dom de conselho, pelo qual o Espírito Santo faz o homem julgar com retidão sobre como deve agir em qualquer circunstância.[2]
Um triste contraste
Ao chegarem os Magos à região de Jerusalém, a estrela que os guiava ocultou-se. Eles, porém, não se perturbaram nem desistiram, porque tinham a certeza de que Deus lhes falava no fundo do coração e de que não fora uma impressão passageira que os impelira. Perdido o caminho, à falta de um auxílio sobrenatural sensível, puseram em jogo todos os recursos naturais que estavam ao seu alcance. Sem hesitar, sem permitir que um lampejo de insegurança se apoderasse de seu espírito, entraram na cidade para se informar, provocando um tremendo alvoroço por seu vistoso séquito, sua língua, costumes e luxuosos trajes.
Por isso São João Crisóstomo interpreta o desaparecimento da estrela como um fato promovido por Deus para tornar a notícia do nascimento do Messias conhecida na Cidade Santa.[3] Anunciam, então, que haviam ido visitar o Rei dos judeus, alegando terem divisado sua estrela. Com efeito, não era raro na Antiguidade identificar o advento de personagens ilustres com fenômenos celestes. E ficava subentendida sua fé na divindade do Menino, pois disseram:
“Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-Lo” (Mt 2,2).
Ora, que Rei é este? Ninguém adora um rei da Terra… só se adora a Deus, Rei do Céu e da Terra que governa os astros.
Não obstante, que significado possuía esta estrela para os habitantes de Jerusalém, pouco versados em astronomia? E como acolheriam eles este Rei cujo nascimento era anunciado de um modo tão inusual? Todos sabemos como eles rejeitariam, infelizmente, a nosso Senhor.
Frisante contraste entre os Magos vindos do Oriente e aqueles que são os principais beneficiados por nosso Senhor: os de sua pátria! Os primeiros recebem uma graça, uma intuição profética por onde veem a santidade e a divindade de nosso Senhor: honram-no como Rei, Deus e Senhor, a despeito das exterioridades. Os outros não O reconhecem e não O aceitam. E Herodes fará de tudo para matá-Lo, como finalmente o conseguirão os príncipes dos sacerdotes, ao rejeitar e crucificar o Messias, que não se coadunava com sua mentalidade e anseios mundanos. Ó tristeza: reis pagãos acreditaram na mensagem que lhes fora transmitida por Deus através de uma estrela, e os judeus, com a Revelação e com todas as profecias, não quiseram abrir a alma para o seu Rei, o Messias!
Também para nós brilha uma estrela
Da atitude dos Magos podemos extrair um ensinamento útil para nossa vida espiritual: muitas vezes, por um sopro da Providência em nossas almas, somos levados a abraçar uma santa imprudência, que pode dar origem a uma grande realização. Precisamos ser flexíveis à voz do Espírito Santo que nos convida por meio de seus dons.
Para nós também brilha uma estrela: é a Santa Igreja Católica. Ao longo dos tempos, todos quantos se converteram é porque de alguma maneira viram esta estrela e resolveram adorar a Jesus Cristo. Ela continua a brilhar e brilhará até o último dia da História, como prometeu nosso Senhor: “As portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16,18).
O Salmo Responsorial de hoje (cf. Sl 71,11) traz esta magnífica profecia: “As nações de toda a Terra hão de adorar-Vos, ó Senhor!”. Fica patente, nesta sentença inspirada pelo Paráclito, não apenas que Jesus veio para todos, mas que, em determinado momento, a humanidade inteira deverá adorá-Lo.
Para que isso se verifique, é indispensável que haja apóstolos. Os primeiros cristãos eram tão poucos! Contudo – como o grão de mostarda, que se desenvolve até tornar-se uma grande árvore – espalharam-se pelo mundo. Hoje, nossa responsabilidade não é menor que a dos Apóstolos, porque a palavra enunciada no Salmo Responsorial ainda não se cumpriu. Há, quiçá, uma obrigação mais grave no presente, já que muitos abandonaram a verdadeira Religião e deram as costas a Deus.
Neste dia, manifestemos nossa fé de que, cedo ou tarde, a Religião Católica será admitida e louvada por todos os povos, pois não é possível nosso Senhor Jesus Cristo ter Se encarnado, ter redimido os homens e ser por eles ignorado.
Por Lucas Rezende
[1] Cf. TUYA, Manuel de. Biblia Comentada. Evangelios. Madrid: BAC, 1964, v. 5, p. 36-37.
[2] Cf. TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. II-II, q. 52, a. 1, ad 1.
[3] Cf. JOÃO CRISÓSTOMO. Homilía VII, n. 3. In: Obras. Homilías sobre el Evangelio de San Mateo (1-45). 2. ed. Madrid: BAC, 2007, v. 2, p. 133.
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