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Honrar pai e mãe

Ah, se soubessem o quanto dói no coração e na alma do pai e da mãe uma injustiça, um desprezo cometido por um filho! Quiçá todos os filhos pudessem ser pais e mães para experimentar na pele esta triste realidade!

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Redação (01/09/2023 15:04, Gaudium Press) Você já parou para pensar: por que, ao nos dar os Dez Mandamentos da Lei, Deus ordenou aos filhos honrarem pai e mãe, mas não ordenou aos pais honrarem os filhos? Certamente, foi porque Ele via a vida de cada ser humano do princípio ao fim, diferente dos homens que só podem ver a pequena porção chamada agora.

Pela lógica humana, visto que as crianças nascem frágeis e desprotegidas, pareceria mais coerente que Deus tivesse dado um mandamento de os pais honrarem e protegerem os seus filhos, considerando que, por óbvio, os filhos retribuiriam aos pais tudo o que deles recebessem.

Tirando as exceções – pais que abandonam seus filhos e até mesmo aqueles que os matam antes do seu nascimento pela prática do aborto –, Deus sabia que os cuidados, a proteção e a conservação dos filhos faziam parte de um instinto natural, comum a homens e animais, portanto, não haveria necessidade de um mandamento para gerir essa questão.

A lição dos animais

É certo que, ao longo dos tempos, os animais acabaram superando os seres humanos nesse quesito, uma vez que fêmea de nenhuma espécie faz o que faz a mulher: assassinar a própria cria ainda em seu ventre; e os animais nos superam também no encaminhamento de seus filhotes. Não há, no mundo animal, superproteção da cria, e cada etapa do desenvolvimento é rigidamente cumprida. Uma mãe animal não alimenta seus filhos depois que eles já têm condições de se alimentarem por si mesmos. E, num aparente gesto de crueldade, as fêmeas dos pássaros empurram seus filhotes para fora do ninho, fazendo com que eles vençam a resistência, aprendam a voar e ganhem autonomia.

O mesmo não acontece na espécie humana, a única em que se pode ver “filhotes” na casa dos 30, 40 anos absolutamente inúteis e encostados, vivendo às custas dos pais, sem conseguirem alçar voo e cumprirem o papel que lhes está reservado como homens e mulheres adultos.

O único mandamento atrelado a uma promessa

Quando um casal tem um bebê, ao olhar para aquela criatura frágil e encantadoramente linda – sim, porque todos os bebês são lindos aos olhos dos pais – sente que a vida ganhou sentido, que foi cumprida uma das missões mais importantes das que lhe estavam destinadas e, juntos, pai e mãe vislumbram um “felizes para sempre”, com filhos bons e obedientes, amorosos, protetores e eternamente gratos por tudo aquilo que deles vierem a receber.

Uma linda utopia, que seria a realidade perfeita, mas, infelizmente, não é. Por isso Deus não apenas determinou em sua Lei que os filhos honrassem pai e mãe, mas destacou este mandamento como o único atrelado a uma promessa: “Honra teu pai e tua mãe, para que teus dias se prolonguem sobre a terra que te dá o Senhor, teu Deus” (Ex 20, 12).

Deus, que é Pai de todos nós, sabia o quanto é importante para um pai ser honrado por seus filhos e o quanto dói no coração de um pai e de uma mãe o desprezo, a injustiça e a ingratidão de um filho. Por isso, disse: “Faze isso e eu te recompensarei.”

Muitos justificarão a própria atitude de abandonar seus pais pelo que eles representam: “Ah, meus pais não me amaram! Minha mãe não cuidou de mim. Meu pai me abandonou quando eu era pequeno ou antes mesmo que eu nascesse e eu sequer o conheço…” Porém, nada disso faz sentido, pois Deus não disse: “Honra teu pai e tua mãe se eles forem bons, cuidadosos, amorosos e protetores”. Com sua ordem, Ele deixou implícito: “Honra-os, sejam eles quem forem e como forem, simplesmente porque eles são os teus pais.”

O que diz o Catecismo

O Catecismo da Igreja Católica nos ensina a honrarmos não apenas os pais biológicos, mas também todas as pessoas que exercem um papel paternal e maternal em nossas vidas. No entanto, isso não exclui o respeito e a honra devidos aos pais legítimos, por mais pecadores e incorretos que eles sejam, porque, ainda que não sejamos criados por eles, não há outra maneira de um ser humano vir ao mundo se não for pela união de um homem e de uma mulher; logo, sejam eles quem forem, a honra lhes é devida e assegurada pelo mandamento divino.

Há várias passagens na Bíblia que se referem à importância de se honrar pai e mãe, e o próprio Nosso Senhor Jesus Cristo, sendo Deus, foi submisso a Maria e a José: “Em seguida, desceu com eles a Nazaré e lhes era submisso”. (Lc 2, 51). E Ele mesmo repreendeu os homens por sua hipocrisia em não obedecerem à ordem divina, substituindo-a por preceitos humanos. “E Jesus acrescentou: ‘Na realidade, invalidais o mandamento de Deus para estabelecer a vossa tradição. Pois Moisés disse: ‘Honra teu pai e tua mãe’; e: ‘Todo aquele que amaldiçoar pai ou mãe seja morto’. Vós, porém, dizeis: ‘Se alguém disser ao pai ou à mãe: Qualquer coisa que de minha parte te pudesse ser útil é corban’, isto é, oferta, e já não lhe deixais fazer coisa alguma a favor de seu pai ou de sua mãe, anulando a Palavra de Deus por vossa tradição que vós vos transmitistes. E fazeis ainda muitas coisas semelhantes a esta” (Mc 7, 9-13).

Filhos que sentem vergonha dos pais

Ah, se soubessem o quanto dói no coração e na alma do pai e da mãe uma injustiça, um desprezo cometido por um filho! Quiçá todos os filhos pudessem ser pais e mães para experimentar na pele esta triste realidade!

Não é incomum que os filhos bem-sucedidos se envergonhem de seus pais, que, muitas vezes, permaneceram simples e ignorantes. Devemos honrar nossos pais dando-lhes amor, respeito, gratidão e obediência, não nos envergonhando deles e ajudando-os em suas necessidades quando eles já não puderem prover o próprio sustento. É muito humilhante para um homem e uma mulher que se esforçaram para criar, educar e prover todas as coisas para os seus filhos, na velhice precisarem mendigar uma ajuda, e nem sempre obtê-la.

Não digo aqui que os filhos devam renunciar às suas vidas, suas carreiras e suas famílias em detrimento dos pais. No entanto, por mais alto que tenham subido, nunca devem deixar de assisti-los, sem esquecer que não teriam chegado a lugar algum se não fosse a mãe que os amamentou, que cuidou da sua higiene, que os ensinou a falar e a andar, que lhes deu educação, ou o pai que se desgastou no trabalho para sustentá-los, que lhes ensinou lições preciosas e que, muitas vezes, precisou ser rude para forjar o seu caráter.

E a mãe e o pai – ou um dos dois – que não tenham cumprido esse papel como deveriam, prestarão contas a Deus e não devem ser julgados, odiados e desprezados pelos filhos, pois, sem o concurso deles, nenhum teria nascido.

Nisto Freud não tinha razão

Por mais que Freud tenha apresentado que a origem da maioria dos traumas está na relação entre pais e filhos, devemos considerar que Deus está muito acima de qualquer psicologia, e Ele não pediu ou sugeriu, Ele determinou e ofereceu ao cumprimento da sua determinação uma grande recompensa ainda na Terra.

Sabemos que há pais abusadores e que praticam violência contra os seus filhos, mas, nos referindo aos pais normais, que estão dentro da curva, podemos considerar, com convicção, que nossos traumas são oriundos muito mais de nossa moleza espiritual, rebelião interior e resistência a obedecer do que ao que os nossos pais fizeram ou deixaram de fazer. O Catecismo da Igreja Católica, em seu item 2200, afirma que “o respeito por este mandamento proporciona, com os frutos espirituais, os frutos temporais da paz e da prosperidade. Pelo contrário, a sua inobservância acarreta grandes danos às comunidades e às pessoas humanas”.

É preciso estar precavido…

E, no tocante à obediência devida pelos filhos, o Catecismo diz: “Enquanto viver na casa dos pais, o filho deve obedecer a tudo o que eles lhe mandarem para seu bem ou o da família. ‘Filhos, obedecei em tudo aos vossos pais, porque isto agrada ao Senhor’ (Cl 3, 20)” (CIC 2217). Ademais, não são apenas os pais idosos que sofrem com o mau comportamento dos filhos, mas também os pais de jovens e até mesmo de crianças que se tornam cada vez mais rebeldes e desobedientes, afrontando os pais enquanto dependem deles para morar, comer, se vestir, enfim, para sobreviver.

Infelizmente, há filhos que são um peso e um estorvo para os pais e, por mais que esses os amem, devem estar precavidos e seguir o exemplo dos pássaros: empurrá-los para fora do ninho, para que não se convertam em áspides venenosas que venham a dar o bote fatal e colocar os pais para fora do ninho, apropriando-se daquilo que não semearam e, portanto, não têm direito a colher durante a vida de seus genitores.

Por Afonso Pessoa

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