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Cartas de Santa Teresinha: Lições de confiança e sabedoria

Consumida de zelo pela salvação das almas, Santa Teresinha nos deixou em suas cartas, felizmente guardadas pela História, valiosos ensinamentos.

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Redação (03/07/2023 08:55, Gaudium Press) Um dos anseios de Santa Teresinha do Menino Jesus era o de ser missionária e poder pregar o Evangelho por todo o mundo, mesmo nas ilhas mais longínquas. Ora, como a vocação dessa alma de fogo era viver no recolhimento do Carmelo e fazer brilhar seu heroísmo somente aos olhos dos Anjos e Bem-Aventurados do Céu, o Bom Deus, que “não seria capaz de inspirar […] desejos irrealizáveis”, reservava-lhe uma participação palpável e sensível em tal empresa.

Dois “irmãos” enviados por Deus

Certo dia, estando a trabalhar na lavanderia, a santa carmelita foi chamada à parte pela Madre Inês de Jesus, que lhe leu uma carta recém-chegada. Tinha como remetente um jovem seminarista que, “inspirado, dizia, por Santa Teresa, […] vinha pedir uma irmã que se dedicasse de modo especial à salvação de sua alma, e o ajudasse com orações e sacrifícios, quando missionário, para lhe ser possível salvar muitas almas”. Prometia, em retribuição, lembrar-se sempre dela na celebração do Santo Sacrifício, assim que fosse ordenado.

Acabada a leitura, ó alegria! Madre Inês revelou à Ir. Teresinha que a escolhida para auxiliar o futuro missionário era ela! Embora sentindo-se indigna deste encargo, aceitou-o prontamente.

A partir de então, Santa Teresinha passou a contribuir com a fidelidade de Maurice Bellière, então seminarista e aspirante a missionário, o qual, às vésperas da morte dela, embarcou para a Argélia.

Ora, passados alguns meses, Madre Maria de Gonzaga fez-lhe uma segunda proposta: encarregar-se também dos interesses espirituais e apostólicos de outro seminarista e futuro missionário, chamado Adolphe Roulland. Exultante de alegria, Santa Teresinha ganhou um novo “irmão”!

União selada anos antes

A união entre Teresa e Roulland, porém, já possuía nessa ocasião um belíssimo antecedente.

Em 8 de setembro de 1890, Teresa abandonara definitivamente este mundo tornando-se esposa do Rei dos Céus, por sua profissão religiosa. Neste dia, com toda a confiança, pediu a seu Divino Esposo particularmente por uma alma apostólica, pois, não podendo ser sacerdote, queria que em seu lugar um padre, participante de sua sede de almas, recebesse graças especiais.

Anos mais tarde, o já então Pe. Roulland contou à santa carmelita que, justamente na data de sua profissão, ele tivera dúvidas quanto à sua vocação e entrada no seminário maior. Enquanto rezava na Capela de Nossa Senhora do Livramento, de repente e de modo definitivo, firmou-se no caminho do sacerdócio.

Eis que uma ponta do véu misterioso que esconde os segredos da eternidade foi então levantada: Teresa encontrou aquele por quem ardentemente pedira e pôde, unida a ele de forma concreta, rumar à conquista de almas. Como ela mesma afirmaria mais tarde, nessa união o Pe. Roulland realizava o papel bíblico de Josué, que liderava o combate no campo, enquanto ela se alegrava em ser o seu pequeno Moisés, cujos braços e coração, sustentados por Cristo, estavam continuamente voltados para o Céu a fim de obter a vitória.

De fato, assim que recebeu a notícia de que o Pe. Roulland, recém-ordenado, fora destinado a evangelizar a província de Su-Tchuen, na China, a carmelita fixou na parede da sala onde trabalhava um mapa do território chinês, para não esquecer em nenhum instante de sua parte nessa obra.

Em suas cartas…

A amizade de Teresa com esses dois sacerdotes, inteiramente sobrenatural, fincou profundas raízes em sua alma, nutrindo-se das frequentes missivas que trocavam. Estas foram felizmente guardadas pela História, e constituem tesouros de santos ensinamentos.

Ao escrever ao Pe. Roulland, a carmelita procurava animá-lo a suportar os sofrimentos do labor apostólico, que variavam desde as moléstias físicas até as perseguições, sempre lhe apontando, com a sabedoria própria dos humildes, os altos desígnios de Deus escondidos por trás de tais circunstâncias. Algumas vezes, não hesitava em contar a seu irmão missionário algum fato de sua vida ou do convívio no Carmelo de Lisieux, e fazia-lhe também alguns pedidos inusitados, como, por exemplo, que lhe enviasse uma mechinha de seu cabelo, para ser guardada como relíquia quando recebesse a palma do martírio…

No entanto, ainda mais tocantes são as correspondências ao Pe. Bellière. Sendo ele muito fraco e débil, não duvidou em confiar-se inteiramente à direção da Ir. Teresinha e tê-la como guia espiritual. Ela, por sua vez, notando essa disposição de alma e conhecendo a fundo o interior de seu “irmãozinho” ainda seminarista, fê-lo caminhar sob os ditames de sua pequena via.

…um tesouro de bons conselhos!

Certa vez, esse futuro sacerdote, já ciente de que sua irmã espiritual apanhara uma grave doença e partiria em breve para o Céu, expôs a ela uma dificuldade que o assaltava: sem o contato que mantinha com ela, ver-se-ia desprovido de apoio para perseverar no áspero caminho da cruz… Santa Teresinha respondeu: “Quando eu estiver no porto, hei de ensinar-lhe, querido irmãozinho de minha alma, como deve navegar no mar tempestuoso do mundo com o abandono e amor de uma criança que sabe que seu Pai a adora e que não a deixaria sozinha na hora do perigo”.

Transcendendo os limites do tempo, essas palavras de Santa Teresinha ensinam também a nós quão necessário é ter uma confiança filial e quase pueril em nosso Divino Redentor. Dessa confiança nasce aquela serenidade de que nossa alma tanto necessita para vencer as agruras da vida, e se a tivermos, ainda que isentos de socorros humanos, nada haveremos de temer.

Em outra ocasião, o seminarista Bellière confidenciou à santa religiosa que ele havia desperdiçado “os belos anos” de sua juventude, “aqueles que Jesus ama sobretudo”, dedicando ao mundo e às suas loucuras os talentos que Deus lhe emprestara. Apenas aos dezoito anos recebera a graça da conversão. Devido a essas faltas passadas, o futuro sacerdote possuía certa dificuldade em acreditar no amor misericordioso do Sagrado Coração de Jesus, que O faz perdoar e se esquecer de nossos pecados.

Este sentimento transparece em várias de suas cartas. Em uma delas, ao realizar um ato de fé de que, desde a glória celeste, Santa Teresinha estaria a seu lado, fez a seguinte ressalva: “A não ser que Jesus, irritado com minhas queixas, não o queira”. Em correspondência posterior, ademais, manifestou o medo de que no Céu Nosso Senhor contasse a Teresa todas as suas misérias e os desgostos que Lhe causara, diminuindo assim a ternura da Bem-Aventurada por ele.

A falta de confiança na misericórdia de Deus atormentava a vida espiritual do jovem seminarista. Ora, esse desastroso defeito com ­frequência atinge também as nossas almas. Quantas vezes não nos demoramos em lamentações pelos pecados que cometemos na vida passada, ou até mesmo por nossas faltas atuais, entregando-nos ao desespero ou ao desânimo… Se tais tentações estão a nos assaltar, talvez possam nos consolar as mesmas palavras que animaram o Pe. Bellière:

“Suponho que um pai tenha dois filhos travessos e desobedientes e que, vindo a castigá-los, veja um que treme e se afasta dele com pavor, tendo, no entanto, no fundo do coração, o sentimento de que merece ser punido; e que seu irmão, pelo contrário, se atira nos braços do pai dizendo que lamenta tê-lo entristecido, que gosta muito dele e que, como prova, será de agora em diante bem comportado. Em seguida, se esta criança pede com um beijo para ser castigada, não creio que o coração do feliz pai possa resistir à confiança filial de seu filho, do qual conhece a sinceridade e o amor. […] [Ele] não ignora que o filho mais de uma vez recairá nas mesmas faltas; contudo, está disposto a perdoar-lhe sempre, se o filho sempre cativar o seu coração…”

Do mesmo modo age o Bom Jesus com a alma miserável, mas sinceramente contrita, confiante e abandonada em seus braços paternais. “Ele não está sempre a repreender, nem eterno é o seu ressentimento. Não nos trata segundo os nossos pecados, nem nos castiga em proporção de nossas faltas, porque tanto os céus distam da terra quanto sua misericórdia é grande para os que O temem; tanto o oriente dista do ocidente quanto Ele afasta de nós nossos pecados. Como um pai tem piedade de seus filhos, assim o Senhor tem compaixão dos que O temem” (Sl 102, 9-13).

E se o pavor de nossas culpas ainda persiste, lembremo-nos de que Maria Santíssima é nossa Mãe. Mesmo que tenhamos a desgraça de cair em pecado grave, tornando-nos desprezados por todos, a ponto de até as criaturas insensíveis, como o fogo, o ar e a terra, quererem nos castigar em desafronta à honra de seu Criador, se recorrermos a Nossa Senhora encontraremos o mais acolhedor, seguro e maternal refúgio e o caminho certo para a reconciliação com Deus.

Em luta pelas almas, eternamente!

As edificantes cartas de Teresa cessaram de ser escritas a mão no dia 30 de setembro de 1897, para serem ditadas diretamente ao coração de seus devotos, desde o mais alto dos Céus. Ali, bem junto de seu Divino Jesus, ela continua para sempre a missão de conquistar almas, favorecida com especial poder impetratório concedido pela Santa Igreja, que a proclamou Padroeira das Missões e dos Missionários.

Quanto a nós, não hesitemos em nos colocar sob a proteção da grande Santa Teresinha do Menino Jesus. Roguemos-lhe com afinco que conquiste por inteiro as nossas almas para Nosso Senhor, e nos ensine a ser como crianças em suas mãos, verdadeiros herdeiros do Reino Celeste (cf. Mt 19, 14)!

Texto extraído, com adaptações, da Revista Arautos do Evangelho n. 246, junho 2022. Por Ir. Fernanda Cordeiro da Fonseca, EP.

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