Jejum do Quênia: o que leva as pessoas a se matarem por uma falsa religião?
Uma centena de corpos foram encontrados em uma vala comum, no Quênia. Autoridades do país confirmam que essas pessoas, inclusive crianças, morreram de inanição após se submeterem a um rigoroso jejum incentivado pelo líder de uma seita conhecida como Igreja Internacional das Boas Novas.
Redação (06/05/2023 09:52, Gaudium Press) Embora inevitável, a morte sempre nos causa certo mal-estar. A morte coletiva, porém, tem o poder de nos abalar profundamente. Guerras, como a que acontece há mais de um ano na Ucrânia, atentados a bomba, terremotos, enchentes, desabamentos são ocorrências que resultam em grande número de vítimas e provocam muita comoção. Todavia um suicídio coletivo, como o descoberto no Quênia, nos deixa estarrecidos e cobertos de indignação.
Segundo autoridades daquele país, foram encontrados 89 corpos – dentre os quais, muitas crianças – enterrados em uma vala comum. Segundo relatos da imprensa, os membros da seita foram convencidos a fazerem um severo jejum com a finalidade de irem para o céu.
O pastor Paul Mackenzie Nthenge, fundador e líder da Igreja Internacional das Boas Novas, se entregou à polícia no dia 14 de abril passado e está preso, juntamente com outros seis membros da seita. Ele já havia sido detido em duas ocasiões – a última delas em março deste ano, após um caso em que duas crianças morreram de fome, sendo liberado depois de pagar uma fiança de US$ 700.
As valas estão localizadas em uma floresta de 325 hectares, próxima à cidade costeira de Malindi. A polícia registrou o desaparecimento de 212 pessoas e acredita-se que muitas ainda estejam escondidas em diferentes pontos da floresta, dando sequência ao jejum que coloca suas vidas em risco.
Este não é o primeiro caso
Não se trata do primeiro caso de situações desse tipo. Um dos mais conhecidos foi o suicídio de 918 pessoas, que se envenenaram ingerindo cianureto em Georgetown, capital da Guiana, em novembro de 1978. Os mortos eram membros da seita Templo dos Povos, fundada nos Estados Unidos pelo pastor Jim Jones, que estimulou o suicídio em massa e o assassinato de mais de 300 crianças da comunidade. Ele se matou com um tiro na cabeça.
Há outros registros de suicídios coletivos, incentivados por ideologias pseudorreligiosas, sobretudo em datas que supostamente ocorreria o fim do mundo, como os anos de 2000 e 2012. Um deles ocorreu na Uganda, em março de 2000, quando cerca de 500 membros da seita Movimento pela Restauração dos Dez Mandamentos de Deus atearam fogo aos próprios corpos, dentro de uma igreja.
Mas, afinal, o que leva as pessoas a tomarem essa atitude extrema, dando fim à própria vida, de maneira coletiva, e permitindo a morte de crianças, muitas vezes, os seus próprios filhos?
Falsos ídolos e falsos profetas
Podemos afirmar que esses acontecimentos nefastos estão, de certa forma, previstos nas Sagradas Escrituras e foram comunicados pelo próprio Jesus que advertiu: “Irão levantar-se muitos falsos profetas e seduzirão a muitos.” (Mt 24, 11). E, bem antes do nascimento de Cristo, o profeta Jeremias já havia dito que “maldito é o homem que confia no homem, e faz da carne o seu braço, e aparta o seu coração do Senhor!” (Jr 17,5).
Conhecendo a nossa natureza e a medida exata de nossa maldade e de nossa fraqueza, Deus determinou que o seu Filho nascesse entre nós, vivendo a vida de um homem para nos ensinar tudo o que precisávamos saber, não deixando de nos advertir sobre o cuidado que deveríamos ter com os falsos profetas, “que vêm até nós vestidos como ovelhas, mas, interiormente, são lobos devoradores” (Mt 7:15).
Sobre Pedro, Jesus fundou a sua Igreja, mas, por discordarem dela, das suas verdades e dos seus ensinamentos, homens dissidentes fundaram outras religiões, e isso foi crescendo exponencialmente, com o surgimento das dissidências das dissidências.
Para se ter uma ideia, estudos apontam que, no Brasil, onde há 178.511 templos, 21 igrejas evangélicas foram abertas por dia — quase uma por hora — ao longo da última década.
Por que as pessoas se afastam da Igreja?
Muitas pessoas se afastam da Igreja para buscarem novas formas de culto e uma boa parte delas, infelizmente, acaba caindo nas mãos de pessoas desequilibradas que provocam tragédias como essas que relatamos. Mas, o que faz com que as pessoas deixem a Igreja fundada por Nosso Senhor Jesus Cristo? O que elas procuram, afinal?
Para não sermos injustos e usando um conceito moderno, precisamos nos posicionar a partir do nosso lugar de fala, e o meu lugar de fala, como católico, é dentro da Igreja. Portanto, não posso falar com propriedade do que não conheço, do que se passa no coração de uma pessoa que renuncia ao seu Batismo e deixa a Igreja que Jesus Cristo instituiu e parte em busca dele nos lugares em que Ele afirmou que não estaria.
O que leva as pessoas a deixarem a Igreja e mudarem de religião? O que leva os seres humanos a terem essa necessidade de serem conduzidos pelo carisma de líderes que os afastam cada vez mais da verdade pregada por Jesus?
São perguntas para as quais não temos respostas. O que sabemos é que esse “separatismo” entre os cristãos resulta no enfraquecimento da fé e na desesperança de muitos, o que pode culminar em atos extremos como o suicídio coletivo.
O problema não está na Igreja
Muitos tentam atribuir essa evasão de fiéis a um problema da própria Igreja Católica, mas, se o problema estivesse na Igreja, o nascimento do protestantismo, sob a alegação de que a Igreja tinha muitas falhas, teria resultado numa segunda igreja apenas, para acertar onde a Igreja original estivesse falhando. No entanto, o que acontece – e estão aí as estatísticas que não nos permitem mentir – é que de uma se cria outra; de outra, outra e outra e mais outra, de uma forma que não acontecia nem na época da adoração a Baal.
Como incentiva o próprio papa, devemos ter respeito pelos cristãos que comungam de ideias diferentes das nossas, contudo este respeito é em relação às pessoas, nunca aos equívocos por elas cometidos.
Da mesma forma, não podemos nivelar as igrejas e atribuir a todas a mesma espécie de faltas. No entanto, dados os exemplos que trouxemos, nunca se sabe onde e quando surgirá uma que direcionará os seus adeptos para o delírio coletivo e a morte, vendendo-lhes a falsa ideia de que seus atos extremos as levará ao céu, porque, como disse Jesus: “Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor, entrará no Reino dos Céus, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não pregamos nós em vosso nome e não foi em vosso nome que expulsamos os demônios e fizemos muitos milagres? E, no entanto, eu lhes direi: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade” (Mt 7, 21-23).
Por Afonso Pessoa
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