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Sobre a verdade

Cada vez mais as “verdades” se multiplicam em nossa sociedade. Mas, na medida em que crescem em número, revelam-se carentes de autenticidade. O que será, pois, verdade?

Jesus com os Apostolos

 Redação (10/03/2023 10:26, Gaudium Press) O relativismo vai ganhando campo na sociedade de nossos dias. Vemo-lo triunfar nos debates acerca das leis civis, vencer no campo da moral e, com quanto pesar, galopar até mesmo nos assuntos concernentes à fé.

Como não o ver, por exemplo, na tendência tão difundida nos meios católicos que pretende negar verdades já seculares, sob o pretexto do surgimento de outras tantas mais atuais?

Assim, há muitos que afirmam ser necessária uma adaptação das verdades, mesmo em detrimento de valores que, até ontem, eram tidos por absolutos.

Para estes, a verdade não se apresenta como um princípio metafísico, mas sim, como o conjunto de concepções individuais subjetivas, ainda que possam ser contraditórias entre si.

Eis porque, com frequência, se ouve: “Para mim isto é verdade, mas para outros pode não ser!” Seria assertiva, esta afirmação?

Se tudo é verdade…

Esta afirmação reflete o pensamento (errado) de inúmeros homens da sociedade atual, imiscuídos no relativismo. E o simples fato de estar ela tão difundida não pode ser motivo de sua veracidade; muito pelo contrário, patenteia a carência de uma básica fundamentação lógica e filosófica.

Em primeiro lugar, consoante à máxima Aristotélica – “é impossível ser e não ser, ao mesmo tempo, e sob o mesmo aspecto” –, está ela condenada. Pretender que algo verdadeiro para mim se apresente como um erro para meu próximo não seria negar este basilar princípio de não-contradição?

Ademais, se a verdade não é absoluta – como querem afirmar – como poderia alguém “absolutizar” essa teoria da subjetividade? O contrassenso é frisante!…

Esconder para não ofender?

Diante de uma tal enxurrada de disparates, mencionemos algumas dessas “verdades” que se revestem de dogmas na atualidade:

1º) A sobrevalorização dos bichos: o zelo pelos animais parece excluir aqueles que, além de pertencerem a este mesmo gênero, são dotados do precioso dom da inteligência, visto que, por ora, menos horror tem causado o elevadíssimo número de abortos do que o maltrato a um quadrúpede.

2º) O ferrenho domínio sobre o fruto do matrimônio: o controle da natalidade, que vai mar alto, como poderia deixar de ser preocupante? França, Japão e Argentina começam a sentir as inevitáveis consequências de uma sociedade sem jovens, ainda que sob a ótica financeira.[1]

3º) A fiabilidade cega nos meios tecnológicos: enquanto a tecnologia avança, ao mesmo tempo promove “bens” que, no parecer da psicóloga Sbine Duflo,[2] produzem “consequências nefastas”: o TikTok perturba o sono, torna as relações sociais confusas e provoca uma baixa capacidade de concentração…

Acerca do acima exposto, há, porém, espíritos menos imponderados que não se arriscam em afirmar tão paradoxal teoria. Contentam-se em apresentar escusas de que ofender a opinião alheia não é de bom alvitre; e preferem “engolir o sapo”…

Acaso devemos considerar os médicos como detratores, pelo simples fato de apontarem as doenças dos seus pacientes? Se alertar a existência de uma disfunção no organismo não é um mal, mas um bem, por que não o seria advertir o próximo dos desvios intelectuais, doutrinários e morais em que pode vir a se encontrar?

“Eu sou o Caminho a Verdade e a Vida”

Como poderia, pois, um verdadeiro católico se esquecer das comoventes palavras de Nosso Senhor: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida?” (Jo 14,6) Se ele é A Verdade, esta só pode ser uma (e una).

Notemos ainda que Cristo afirma primeiramente ser o Caminho, depois a Verdade e, por último, a Vida. Assim, podemos dizer que, para todos os cristãos, seguir a Cristo é seguir a Verdade que nos conduzirá à Vida.

Deste modo, não advertir quem erra, não seria o mesmo que obstruir as vias que conduzem ao bom porto? Ou então, propor atalhos que não findam no almejado ponto de chegada?

Sanha em abolir a noção de verdade e erro

Neste sentido, esclarecedora é a afirmação de Dr. Plinio Corrêa de Oliveira em sua obra Revolução e Contra-Revolução,[3] ao explicar como a Revolução[4] – movimento que há cinco séculos vem demolindo a Cristandade – possui uma especial sanha em abolir a noção de verdade e erro das consciências humanas, sendo um dos meios mais eficazes para que este processo atinja seus objetivos, e conduza a humanidade rumo aos desregramentos que deseja.[5]

Cabe a nós, como católicos, apontar os caminhos da verdade, desmascarar os erros encobertos de supostas verdades, a fim de que aqueles que andam à deriva, à busca de atalhos – sempre mais cômodos, é verdade! – possam reencontrar a trilha apropriada a ser seguida.

Quiçá, endireitados em seus rumos, nossa sociedade possa dar tanto aos homens – quanto aos animais – seu devido valor; não privar o nascimento daqueles que hoje representam o amanhã bem como promover uma educação tão avançada que seja capaz de concluir que, em matéria de formação, as coisas simples – um lápis, uma folha de papel e uma borracha – são mais úteis do que muitos TikToks…

Por Aloísio de Carvalho


[1] Cf. https://www.lefigaro.fr/vox/monde/en-france-comme-au-japon-et-en-argentine-l-inquietante-chute-de-la-natalite-20230309

[2] Cf. https://www.lefigaro.fr/vox/societe/tiktok-affecte-les-capacites-cognitives-de-nombre-de-jeunes-20230309

[3] Empregamos neste artigo a grafia da palavra como estava em vigor no período em que Autor escreveu sua obra (1959).

[4] Dr. Plinio Corrêa de Oliveira entendia por Revolução o movimento que há cinco séculos vem demolindo a Cristandade, e cujos momentos pinaculares foram as quatro grandes crises do Ocidente cristão: o protestantismo, a Revolução Francesa, o comunismo e a revolta anarquista da Sorbonne em 1968. Suas molas propulsoras são o orgulho e a sensualidade. Da exacerbação dessas duas paixões resulta a tendência a abolir toda legítima desigualdade e todo freio moral.

[5] Cf. CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Revolução e Contra-Revolução. 4. ed. São Paulo: Artpress, 1998, p. 26.

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