Folia de Reis: uma tradição que sobrevive à modernidade
O Dia de Reis é uma celebração presente no calendário litúrgico da Igreja Católica, também conhecida como Solenidade da Epifania do Senhor e celebrada no dia 6 de janeiro. Essa festividade foi trazida para o Brasil pelos portugueses e é conhecida por celebrar a primeira manifestação de Jesus como Messias.
Grupo de Folia de Reis (Foto: Ludmila Saharovsky)
Redação (05/01/2023 13:43, Gaudium Press) A celebração do Dia de Reis encerra o período da Epifania, marcando o fim do ciclo natalino e o momento em que as decorações de Natal são desmontadas. Essa data comemorativa relembra os Reis Magos, que partiram do Oriente, guiados por uma estrela, conhecida como estrela de Belém, a fim de homenagear e prestar culto ao Menino Jesus, que acabara de nascer.
A Folia de Reis nasceu dessa celebração, tornando-se uma festa da tradição popular católica, celebrada principalmente nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo, Ceará e Goiás. Também conhecida como Festa de Santos Reis ou Reisada, a festa ocorre entre os dias 24 de dezembro e 6 de janeiro, numa referência à caminhada dos Reis Magos até encontrarem o Menino Jesus. A festividade engloba músicas, orações, danças, roupas estilizadas, acessórios e comidas típicas.
A história da origem da Folia de Reis está associada a uma tradição cristã, vinda de Portugal e Espanha e trazida ao Brasil no século XIX, embora alguns historiadores defendam a hipótese de que ela tenha chegado ao país ainda durante o período da colonização.
Não há registro preciso sobre o início dessa tradição, que remete à visita dos reis magos ao Menino Jesus. De acordo as Sagradas Escrituras, na visita, cada rei levou um presente: ouro, incenso e mirra. Esses presentes possuem uma grande simbologia. O ouro representa a realeza de Jesus; o incenso, a sua divindade e a mirra, a sua imortalidade.
Como é celebrada a Folia de Reis?
O grupo que faz parte da Folia de Reis é constituído por um mestre ou embaixador, um contramestre, os três reis magos, palhaços, alferes, um bandeireiro e os foliões (coro). Eles costumam desfilar pelas ruas e fazer visitas às casas que desejem recebê-los.
Nas visitas e no desfile do dia 6 de janeiro, há danças, bênçãos e cantorias. É comum que os grupos de folia façam viagens durante o período da tradição, percorrendo toda a cidade, zonas rurais ou até realizando um trajeto entre cidades. Nesse caso, a tradição também inclui os “pousos”, que são a hospedagem dos grupos em casas ou fazendas.
Cada grupo possui sua própria bandeira, que é levada durante toda a festa. Em alguns locais, é comum as pessoas demonstrarem respeito pela bandeira, tocando-a e beijando-a. Normalmente elas levam a estampa de Nossa Senhora, Nosso Senhor Jesus Cristo, os Reis Magos ou Sagrada Família. Quando os foliões entram nas casas, o bandeireiro leva a bandeira a todos os cômodos, abençoando o recinto.
Companhia de Reis Estrela Guia, de Vicentina. (Foto: Rubens Valente)
As roupas usadas pelos foliões sempre são coloridas e os palhaços usam máscaras – às vezes, um tanto amedrontadoras. A justificativa dos foliões é que as máscaras servem para ‘assustar” o mal e “defender” o Menino Jesus. Os instrumentos musicais mais utilizados são a viola, o reco-reco, o pandeiro, o bumbo, a gaita e a sanfona.
Como se trata de uma festividade religiosa, os fiéis costumam fazer doações de alimentos e de dinheiro para a refeição ou até mesmo se disponibilizam para cozinhar para o grupo. Em alguns locais, no dia 6 de janeiro, ocorre um encontro de Folias de Reis, com grupos vindos de várias regiões.
Muitos foliões são pessoas de idade avançada e existe entre os praticantes dessa tradição o receio de que ela não continue, por isso, eles tentam incluir jovens e crianças ao festejo, ensinando a eles os detalhes da tradição.
A fim de preservar a existência da Folia de Reis, em 2017, o Conselho Estadual de Patrimônio de Minas Gerais declarou a festividade patrimônio imaterial do estado.
A Folia de Reis pelo mundo
Outros lugares no mundo também celebram a Folia de Reis. Na Europa, alguns países consideram a festividade mais relevante que o próprio Natal. Nesses locais, as trocas de presentes e a montagem do presépio acontecem no dia 6 de janeiro e não no dia 25 de dezembro.
Na Espanha, há o tradicional desfile Cabalgata de los Reyes Magos, que acontece em 5 de janeiro, com carros alegóricos que desfilam com pessoas fantasiadas e jogam balas para as crianças. E no dia 6 de janeiro, é feriado nacional no país. Na Itália, a festa é conhecida como Befana.
Quem eram os Reis Magos?
Embora sejam chamados de reis, na verdade, os três personagens eram magos (sábios) que viajaram das suas terras com o intuito de visitar o Menino Jesus e adorá-lo. A história desses magos está registrada no capítulo 2 do Evangelho de São Mateus:
“Tendo, pois, Jesus nascido em Belém de Judá, no tempo do rei Herodes, eis que magos vieram do Oriente a Jerusalém. Perguntaram eles: ‘Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer? Vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo’. A essa notícia, o rei Herodes ficou perturbado e toda Jerusalém com ele. Convocou os príncipes dos sacerdotes e os escribas do povo e indagou deles onde havia de nascer o Cristo. Disseram-lhe: ‘Em Belém, na Judeia’, porque assim foi escrito pelo profeta: ‘E tu, Belém, terra de Judá, não és de modo algum a menor entre as cidades de Judá, porque de ti sairá o chefe que governará Israel, meu povo’ (Mq 5,1).
Herodes, então, chamou secretamente os magos e perguntou-lhes sobre a época exata em que o astro lhes tinha aparecido. E, enviando-os a Belém, disse: ‘Ide e informai-vos bem a respeito do menino. Quando o tiverdes encontrado, comunicai-me, para que eu também vá adorá-lo’. Tendo eles ouvido as palavras do rei, partiram. E eis que a estrela, que tinham visto no Oriente, os foi precedendo até chegar sobre o lugar onde estava o menino e ali parou. A aparição daquela estrela os encheu de profunda alegria. Entrando na casa, acharam o menino com Maria, sua mãe. Prostrando-se diante dele, o adoraram. Depois, abrindo seus tesouros, ofereceram-lhe como presentes: ouro, incenso e mirra. Avisados em sonhos de não tornarem a Herodes, voltaram para sua terra por outro caminho” (Mateus 2, 1-12).
O fenômeno do aparecimento da estrela que se movia, apesar de muito investigado, nunca foi desvendado pelos astrônomos, e alguns continuam a estudar a sua origem até os dias atuais.
Com o passar do tempo, o termo “mago” adquiriu uma conotação perniciosa, ligada à feitiçaria, porém, na Antiguidade, era usado para representar os homens sábios e estudiosos, inclusive, os homens que estudavam as estrelas, o que corresponderia, hoje, aos nossos astrônomos.
Supõe-se que esses sábios passaram a ser chamados de reis entre o fim da Idade Antiga e o início da Idade Média. A primeira menção teria sido feita por Tertuliano, bispo que viveu no norte da África, nos séculos II e III. A referência aos magos como reis ocorreu por meio de interpretações das passagens bíblicas que aludem à vinda do Messias e afirmam que reis se ajoelhariam perante o Filho de Deus.
Como os nomes dos Reis Magos foram descobertos?
A menção aos nomes dos Reis Magos foi encontrada em um texto do ano 500, chamado Excerpta Latina Barbari, cujo autor é desconhecido. Os nomes constariam como Gathaspa, Bithisarea e Melichior, depois traduzidos como Gaspar, Baltazar e Melchior.
Na Bíblia, é narrado que os magos vinham do Oriente, e os estudiosos acreditavam que eles tivessem vindo de regiões à leste da Palestina. O documento Excerpta et Colletanea, escrito por São Beda, o Venerável, presbítero e doutor da Igreja, em meados do século VII, menciona os locais de origem dos magos. Melchior (também conhecido como Belchior) seria originário de Ur, na terra dos Caldeus; Gaspar viria das regiões próximas do Mar Cáspio e Baltasar, das proximidades do Golfo Pérsico. Mais exatamente da Babilônia, Pérsia e Arábia.
Isso significa que é muito provável que esses três homens sequer se conhecessem. Eles teriam recebido o mesmo chamado, para visitar e reverenciar o Filho Deus, logo após o seu nascimento e, neste caso, poderiam ter se encontrado no meio do caminho e descoberto que tinham um destino comum.
Catedral de Colônia guarda os restos mortais dos reis magos
Restos mortais dos Reis Magos, Catedral de Colônia, Alemanha (Foto: Mikhail Markovskiy)
Um fato curioso é que os restos mortais dos Reis Magos foram encontrados, e estão preservados na Catedral de Colônia, na Alemanha, sendo uma das relíquias mais importantes do mundo cristão. Estudos realizados no século XXI sugerem que as ossadas presentes no relicário pertenceram a três homens, um jovem, um de meia-idade e um idoso.
A preciosa relíquia foi encontrada por Santa Helena, mãe do imperador romano Constantino, nas explorações que ela realizou pela Terra Santa. De acordo com o site da Catedral de Colônia, Santa Helena encontrou as relíquias dos Reis Magos na cidade de Saba, localizada na Península Arábica, e as levou até Constantinopla (hoje Istambul), que na época era a capital do Império Romano. Anos mais tarde, as relíquias foram presenteadas a Santo Eustórgio, Bispo de Milão, Itália, mas, no século XII, o imperador Frederico Barbarossa as levou para a Catedral de Colônia, onde permanecem até hoje.
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