Desenvolver o hábito de refletir
Simplesmente memorizar informações e acumular dados com vistas a um exame de seleção não pode ser o objetivo de um verdadeiro ensino. É preciso criar no jovem o hábito da reflexão e do julgamento.
Redação (13/01/2021 15:57, Gaudium Press) Nunca uma época dispôs de tanta informação como a nossa. A internet, as redes sociais, a mídia digital, a todo o momento, nos fornecem dados tão díspares como, por exemplo, a descoberta de que os tremores marcianos emitem um “zumbido” constante – mais alto do que os encontrados aqui na Terra – que parece pulsar ao ritmo dos “martemotos”; planeta do tamanho da Terra é visto vagando na Via Láctea; um computador quântico, desenvolvido na China, capaz de efetuar algumas operações em velocidade 100 bilhões de vezes mais rápido do que os existentes.
Dados informativos não faltam ao homem de hoje. Saberá ele, entretanto, aproveitá-los convenientemente? Estará apto a utilizar os recursos postos à sua disposição pelas novas descobertas?
A este propósito, convido o leitor a analisar o texto abaixo.
“O regime escolar atual é mal apropriado à formação do homem, pois — longe de tornar os alunos suficientemente preparados para fazer face, pelos seus valores e aptidões pessoais, às dificuldades movediças e inovadoras da existência — comprime, desde sua primeira idade, a iniciativa livre e espontânea, assim como a originalidade, fundindo desta maneira todas as inteligências num só molde uniforme, e formando instrumentos prontos a obedecer ao impulso que, em sua vida de adulto, lhe será transmitido.
“Tal sistema parece, assim, inapto a preparar homens capazes de criar soluções independentes, ou seja, de poder resolver situações por si mesmos, o que exige iniciativa, força de vontade e o costume de apelar às próprias capacidades.
“Para poder enfrentar os inúmeros candidatos a um determinado cargo, as instituições costumam efetuar concursos. Ora, para se poder estar apto a passar num exame, a solução adotada é, em geral, a do estudo intensivo de certos temas, mais provavelmente necessários. Procedimento ‘bárbaro’ este, que consiste tão-só em fornecer, no menor tempo possível, um conhecimento superficial das matérias de um exame, em que os estudos são necessariamente sem profundidade.
“Por outro lado, quanto maior o número de candidatos a uma certa vaga, mais se procurará aumentar a dificuldade das questões, chegando-se a estabelecer verdadeiros programas enciclopédicos que nenhuma inteligência humana consegue abarcar.
“Se este sistema de ensino tivesse como objetivo inculcar conhecimentos reais e aprofundados, além de desenvolver o exercício das faculdades superiores do espírito, o resultado seria duradouro”.
Mas, consistindo principalmente num esforço de memória, seu efeito é apenas de superfície e passa como o frescor das lembranças.
“O regime dos exames não desenvolveu o hábito da reflexão e do julgamento.”
* * *
Caro leitor, qual sua impressão a respeito deste trecho?
Segundo seu autor, uma das principais falhas do regime escolar consiste em não incentivar o costume de refletir. O artigo pareceu-lhe apontar com objetividade essa deficiência?
Pois bem, deixe-me revelar-lhe algo. Os problemas educacionais não são de agora. O artigo acima transcrito foi publicado originariamente em… 1897![1]
Seu autor visava alertar os responsáveis pelo ensino na França sobre o engano primário de julgar que uma educação baseada no simples acúmulo de informações resolveria o problema do aprendizado.
Claro está que, nesta matéria, a informação também tem seu papel. Mas o elemento principal consiste em desenvolver nos jovens alunos “o hábito da reflexão e do julgamento”.
Quem sabe estas observações, feitas por um articulista francês há mais de cem anos, possam nos ajudar a refletir de maneira proveitosa a respeito da questão.
Artigo extraído da Revista Arautos do Evangelho n.92, fevereiro 2004. Por Ir Guy de Ridder, EP.
[1] Cf. “La France Pittoresque”, Paris, Out-Dez/2003.
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