O que você sabe de São Raimundo de Peñafort?
O que você conhece deste Santo para o qual a Igreja Católica reserva o dia 07 de janeiro para celebrar a memória dele?
Redação (07/01/2022 10:07, Gaudium Press) São Raimundo de Peñafort é considerado como sendo um homem para todas as missões. E, na verdade, deu mostras de sua capacidade em atividades as mais importantes e diversas: não havia campo de apostolado ao qual ele não se lançasse.
Ele foi diretor espiritual de rei, apóstolo das gentes, canonista célebre, professor, reformador dos costumes, protetor dos pobres, conciliador de litígios.
Uma vocação universal
A alguns santos a Providência dá uma missão restrita, bem delimitada. Outros são chamados para acudir às necessidades gerais da Igreja, nos mais diversos campos de apostolado. Eles sustentam a causa de Deus em toda parte, são, por assim dizer, factótuns (faz-de-tudo) de Deus.
Nessa perspectiva, a vida de São Raimundo se torna mais facilmente compreensível. Trata-se de um Santo com uma vocação universal. Chamado pela Providência para as missões mais diversas, ele, com uma versatilidade prodigiosa, “faz de tudo”, quase ao mesmo tempo.
Nasceu em 1175, no castelo de Peñafort, na Catalunha, Espanha. Seus pais eram de nobre estirpe de cavaleiros. Ainda leigo, com a idade de 20 anos, já ensinava filosofia em sua cidade, mais com o intuito de formar os corações do que de instruir os espíritos. O tempo que lhe sobrava, empregava-o em socorrer os infelizes e conciliar divergências entre seus concidadãos.
Aos 30 anos ingressou na Universidade de Bolonha, onde estudou Direito Canônico e Civil com tal êxito que não tardou em doutorar-se e passar de aluno a mestre. As qualidades e virtudes do piedoso doutor faziam dele um dos mais belos ornamentos da famosa Universidade. Em pouco tempo, sua reputação já alcançava países distantes.
Em 1219, o Bispo de Barcelona, Dom Berenger, foi a Bolonha, com o objetivo de levar consigo Raimundo para sua diocese. Bem sabia o Prelado quanto este lhe seria valioso instrumento para reforma dos costumes, reafervoramento do povo e até mesmo do clero da Catalunha. O famoso professor, entretanto, não se mostrava disposto a abandonar seu campo de trabalho, onde podia fazer tanto bem para a salvação das almas.
O Bispo, porém, sabia como tocar as cordas sensíveis do Santo. Após expor-lhe as prementes necessidades da Igreja em Barcelona, afirmou que ele tinha uma particular obrigação de atender primeiro seu país natal. Depois lhe mostrou o perigo de se afastar do caminho de Deus, ao qual ele ficaria mais exposto se seguisse apenas sua própria vontade. E encerrou com o seguinte argumento: em Bolonha, o brilho de sua reputação lhe atraía tão grandes aplausos que não poderia deixar de aumentar desmedidamente suas ocupações, com prejuízo da vida interior.
Por fim, Raimundo se deixou persuadir e transferiu-se para Barcelona, dedicando-se de corpo e alma ao serviço do Altar.
Modelo dos sacerdotes
Nomeado cônego, e pouco depois arqui-diácono, logo tornou-se o modelo dos sacerdotes na igreja de Barcelona, tanto pela inocência de sua vida quanto pela regularidade e exatidão no cumprimento de todos os ministérios.
Empenhou-se para que os atos litúrgicos fossem realizados com a maior dignidade e beleza. Autorizado pelo Bispo, promoveu pela primeira vez a celebração da festa da Assunção de Nossa Senhora, com ofício solene.
Raimundo estava sempre pronto a socorrer os indigentes e auxiliar a todos quantos iam consultá-lo. Em pouco tempo fez-se amado e respeitado por todos. O exemplo de suas virtudes contribuiu mais para a reforma dos costumes que toda a autoridade da qual fora revestido pelo Bispo.
Mas o desejo de levar uma vida mais perfeita, mais penitente e menos exposta aos olhos dos homens, cujos louvores temia, o impelia a procurar um estado de maior dedicação.
Quando professor em Bolonha, testemunhara as grandes virtudes de São Domingos e os milagres que Deus realizava por meio desse Santo. Era grande admirador da vida angélica dos primeiros dominicanos estabelecidos em Barcelona. Dócil à voz de Deus que o chamava a ser como eles, recebeu o hábito religioso de São Domingos na Sexta-Feira Santa de 1222, na idade de 47 anos.
Seu exemplo atraiu para a Ordem Dominicana vários personagens ilustres, como Pedro Ruber, Raimundo de Rosannes e outros piedosos eclesiásticos, cuja vocação e talento deram novo brilho à Ordem em toda a Catalunha.
Homem de grande ciência
Esse novo estado de vida foi para ele um acréscimo de fervor e uma escola de perfeição. As graças que recebia na oração aumentavam-lhe sempre o desejo de se mortificar e tornar-se útil no serviço da Igreja e do próximo.
Os superiores valeram-se sabiamente de tais disposições para fazer frutificar suas qualidades. Tendo ele rogado que lhe impusessem uma severa penitência para expiar, segundo dizia, as vãs complacências que tivera ensinando no mundo, ordenaram-lhe que compusesse um compêndio dos casos de consciência, para facilitar a delicada missão dos confessores.
Frei Raimundo executou esse trabalho com admirável exatidão, apresentando de forma ordenada os “casos de consciência” e dando a solução para cada um deles, com base nos ensinamentos das Sagradas Escrituras, nos cânones das leis eclesiásticas, na doutrina dos Padres da Igreja e nos decretos pontifícios. O Papa Clemente VIII fez grandes elogios a essa obra, afirmando ser ela igualmente útil aos penitentes e necessária aos confessores.
Conhecedor da grande ciência de São Raimundo, o Papa Gregório IX chamou-o a Roma como Penitenciário Papal e lhe deu a incumbência de realizar um trabalho de proporções universais, a compilação da vasta legislação canônica então em vigor.
Dela se desincumbiu o insigne canonista dominicano com o zelo e a competência de costume. Em 1234 apresentou ao Pontífice a obra concluída. Sob o título de Decretais, essa codificação vigorou na Igreja até 1918, quando foi publicado o primeiro Código de Direito Canônico.
Insaciável zelo pelas almas
Em 1238 foi eleito Superior Geral dos Dominicanos. Desejoso, porém, de dedicar-se por inteiro ao apostolado de conquista de almas para Jesus Cristo, pediu e obteve dispensa desse cargo. O zelo da salvação das almas o devorava. Seus pensamentos estavam voltados para fazer novas conquistas para a Igreja, sobretudo entre os infiéis.
Com o objetivo de facilitar a conversão de judeus e muçulmanos, criou centros para o ensino de suas línguas e pediu a São Tomás de Aquino para escrever a Suma Contra Gentiles.
Servindo-se deste poderoso instrumento de apostolado, o Santo pôs-se a campo, e os bons resultados não se fizeram esperar: em uma carta sua ao Superior Geral, datada de 1256, pode-se ler que obteve a conversão de mais de dez mil árabes na Espanha. Esse célebre canonista organizou também missões para a conversão dos judeus e dos muçulmanos.
Não havia, por assim dizer, campo de apostolado ao qual não se lançasse: trabalhar sem esmorecimento para converter os pagãos, ou pelo menos impedir que corrompessem os cristãos; atrair os pecadores à penitência e reconciliá-los no tribunal do confessionário; instruir os fiéis pelo ministério da palavra; apoiar os bons, consolá-los nos seus sofrimentos; obter para os pobres as esmolas e os auxílios dos ricos – nada era demasiado para o desejo de salvar almas, que nele crescia mais e mais.
Navegando sobre um escapulário de lã
São Raimundo é um dos mais esplendorosos exemplos de confirmação das palavras de Cristo: “Aquele que crê em Mim fará também as obras que Eu faço, e fará ainda maiores do que estas” (Jo 14,12).
O Rei Jaime de Aragão era senhor da Ilha de Maiorca, localizada no mar Mediterrâneo a 360 quilômetros de Barcelona. Numa de suas viagens a essa ilha, convidou para acompanhá-lo Frei Raimundo, que na época exercia as funções de capelão da corte. Durante o percurso, o monarca – cujo procedimento moral muito deixava a desejar – tentou forçar a consciência do Santo, exigindo que ele complacentemente fizesse vistas grossas a esse mau proceder.
O homem de Deus resistiu com vigor, chegando a ponto de pedir licença para descer do navio, em pleno mar, e retornar a Barcelona. O Rei negou autorização para essa “loucura” que para o Santo, entretanto, parecia coisa simples, uma vez que Jesus veio até seus discípulos “caminhando sobre as águas do mar” (Mt 14,25). Confiante em Deus, ele respondeu ao monarca:
– Um rei da terra me fecha a passagem, mas o Rei do Céu há de me abrir caminho melhor; ou por outra, Ele próprio é meu caminho!
Porém o Rei, à negativa de autorização, acrescentou uma ameaça de pena de morte, caso o Santo tentasse fugir.
E ao desembarcar na ilha, Frei Raimundo notou que uma escolta armada havia sido incumbida de guardá-lo para impedir sua fuga.
Após, com sua acolhedora bondade, conquistar a confiança dos guardas, manifestou-lhes o desejo de rezar andando pela praia. Eles consentiram. Afinal, pensavam, o que poderia fazer esse bom frade, desarmado, para escapar de nossa vigilância?
Tal raciocínio, inteiramente válido para outros homens, revelou-se ilusório para o indomável Santo.
Sob o olhar estupefato dos soldados, ele estendeu seu escapulário de lã sobre as águas do mar, e nele “embarcou”. Após agasalhar-se com parte de seu manto, içou a outra ponta ao seu bastão, constituindo uma vela. O resto… foi só invocar o santo nome de Maria, a Senhora dos ventos, de quem era fiel devoto. Um sopro suave, mas veloz, impulsionou o veleiro de Deus e em menos de seis horas ele chegava ao porto de Barcelona, vencendo milagrosamente a distância de 360 km que separam a Ilha de Maiorca dessa cidade espanhola.
Era alta madrugada quando chegou a seu convento, onde a grande porta abriu-se por si mesma, como braços maternos a acolher um filho que há tempos não a transpunha. Ele dirigiu-se à sua cela conventual, onde até as paredes pareciam exultar de alegria.
Ao amanhecer, com a despretensão característica dos santos, ele foi tomar a bênção do Superior e comunicar que sua missão na corte real estava cumprida.
Do portentoso milagre, só muito depois os irmãos tomaram conhecimento, e por outras vias.
E o Rei, como reagiu?
Caindo em si, ante essa manifestação de um poder sem comparação maior que o seu, passou a seguir fielmente as advertências de Frei Raimundo, tanto no que dizia respeito à direção de sua consciência, quanto no que concernia ao governo do Reino.
Cem anos de vida inocente
Recolhido no convento de Barcelona, São Raimundo cuidou de preparar-se para sua última viagem. Com redobrado fervor, consagrava dias e noites à oração e à penitência.
Chegou afinal o almejado e temido dia do encontro com Deus, 6 de janeiro de 1275. Justamente nesse dia, ele completava 100 anos de idade! Após receber os sacramentos da Igreja, sua grande alma retornou às mãos do Criador, tão inocente quanto delas havia saído. Antes de sua partida para a eternidade, os reis de Castela e Aragão o visitaram com suas respectivas cortes, para receber pela última vez sua bênção.
São Raimundo foi canonizado em 1601, pelo Papa Clemente VIII. Em seu túmulo, operaram-se numerosos milagres, muitos dos quais são mencionados na bula de sua canonização. Sendo o dia 6 de janeiro dedicado à festa dos Reis Magos, a Igreja celebra no dia 7 a entrada gloriosa de sua alma no Céu.
Texto extraído da Revista Arautos do Evangelho, janeiro 2005.
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