“Muito obrigado”, “Por favor”: expressões que vão desaparecendo do vocabulário humano
Redação (Segunda-feira, 16-04-2018, Gaudium Press) Muito amável, muito obrigado, estou agradecendo, me faria o favor, são frases que cada vez menos se escutam ao nosso redor. Está se perdendo o sentido da cortesia, do agradecimento no relacionamento humano. É lamentável dizê-lo, mas quando alguém faz um ato de cavalheirismo -digamos de urbanidade- deixando passagem a outro no trânsito, por consideração lhe concede a prioridade, poucos agradecem com um toque de buzina, um gesto de braço, um acender de luzes. Ante essa atitude, uns ficam surpreendidos, outros pensarão: “de que serve ter dado passagem a este indivíduo se nem teve a educação de agradecer”.
Mesmo ocorrendo isto, importa estar bem disposto, perseverar, ir educando sobre a cortesia. O início de nossa rotina diária rumo ao nosso trabalho, colégio, universidade, é um dos primeiros entrechoques, apesar de não ser o único.
É penoso ver que, concretamente, vai desaparecendo do vocabulário humano a expressão, “muito obrigado”. Mas não é apenas esta, mas também o “por favor” de outros tempos. Hoje em dia seria estranho que um jovem ou uma jovem, dissessem a um companheiro que lhe fizesse o favor de fazer tal coisa, ou de ajudar em outra. Não me estenderei em comentar o que é o trato entre os jovens nos colégios; poderá cada pai, cada mãe, perguntar aos seus filhos e ficarão espantados. Como se saúdam? Como pedem coisas entre si? Como brincam? Se apoiam nos estudos mutuamente? Averiguem e verão.
Isto é consequência de um fenômeno mais profundo -que bem poderemos chamar de “revolução cultural”- que vai nos arrastando até a barbárie no convívio entre os seres humanos. Uma das pichações escritas durante a chamada Revolução da Sorbonne de 1968 em Paris era: “Mudar a vida, transformar a sociedade”. Com uma radicalidade insuspeita, este fenômeno foi penetrando aos extremos que hoje estamos vendo e vivendo, o que alguns qualificam de “civilização dos instintos”. Mudanças nas maneiras de sentir, atuar e pensar. Dizia o escritor francês Pierre Fougeyrollas (1922-2008), “uma revolução da civilização”. O ativista revolucionário ateu italiano Gramsci (1891-1937) a propunha para: “mudar a forma de pensar do Ocidente. Sua forma de viver, de relacionar-se, até de divertir-se”.
Tudo foi repercutindo nas atitudes do convívio humano, preparando o caminho para o que se poderia considerar como da libertação dos apetites inatos, dos instintos. Penetrando principalmente na instituição da família, tocando no relacionamento humano. A cortesia, o bom trato, a distinção, a educação, tudo vai agonizando! Vai se transformando o conviver dos homens em um mundo anárquico, caótico, e agressivo. O vulgar toma o lugar do cerimonioso, a educação é uma coisa do passado que tira a liberdade. Por isso São João Paulo II dizia sobre as modernas tecnologias: “não favorecem do mesmo modo o frágil intercâmbio entre mente e mente, entre coração e coração, que hoje em dia deve caracterizar toda comunicação a serviço da solidariedade e do amor” (24-1-2005). São as consequências de um modo que caminha cada vez mais até a selvageria, na qual a cortesia se evapora das relações entre os homens, com as consequências que estamos vivendo: violência familiar, social e política.
A comunicação mútua, o estar juntos, o querer-se bem, em concreto o respeito e o afeto recíproco, tudo aqui que encurta as distâncias entre pessoa e pessoa, que faz que vivam em harmonia, primordialmente familiar -pois todo bem e todo mal nasce nesse âmbito-, dá lugar a um bem estar todo especial. No que outrora se chamou Civilização Cristã, da qual ainda estamos sentindo apenas o calor de umas brasas que estão apagando, a vida de sociedade estava caracterizada por uma relação de pessoa a pessoa; todos considerando-se uns aos outros, respeitando o que lhes era afim, e mais ainda as diferenças. Pois isso é… civilização. O contrário é uma vida pagã, cheia de agressividades, sem nenhuma caridade fraterna.
Plinio Corrêa de Oliveira qualificava a cortesia, em uma conferência para jovens no ano de 1974, como: “a musicalidade da convivência humana”. Comentava que a perfeita relação entre os homens passa por cima deste como que “abismo” que há entre si. Se ultrapassam os entrechoques com o amor fraterno. Com sua especial sabedoria a definia como: “o laço cheio de respeito, distinção e afeto que une as pessoas diferentes e as coloca em uma relação, como se fosse uma música, na qual as notas convivem harmoniosamente”. Pois, não se trata de que as personalidades diferentes entre os homens, principal característica da desigualdade entre eles, deixem de crescer e brilhar com sua própria luminosidade. “A cortesia nasce da harmonia de coisas diferentes”, terminava dizendo o professor Plinio.
O igualitarismo de hoje arrasa com a cortesia. Em tempos idos, as pessoas mais velhas, as senhoras, nem se fale das grávidas, ou que tinham alguma dificuldade física, recebiam cortesmente o assento em um ônibus, trem ou metrô. Hoje, é preciso que exista um assento para este tipo de situações, pois… ninguém mais, ou muito poucos, cedem e, se o fazem, serão vistos com estranheza.
O ser cortês vai se extinguindo. Este, me permito dizer, é um dos fatores mais profundos -como o é também, a falta de perdão- da crise de relacionamento humano que estamos vivendo. Crise que dá… no que lemos todos os dias nos jornais: mortes incompreensíveis, assaltos, sequestros, massacres em colégios (especialmente nos EUA), chegando aos extremos das guerras internas e entre países.
Quanto mudaria nossa sociedade se praticássemos a cortesia na íntima vida familiar, principalmente entre os esposos, depois com os filhos, e assim, através de círculos concêntricos, irmos perfumando com o belo aroma da caridade fraterna, os ambientes que nos rodeiam.
Pensemos no relacionamento virginal e castíssimo da Sagrada Família. São José e Maria Santíssima, na presença do Deus feito homem, o Menino Deus: mútua entrega, a mais perfeita harmonia, rejeitando qualquer forma de egoísmo, marcados pela santidade.
Comecemos por aí queridos irmãos!
(Publicado originalmente em La Prensa Gráfica em 15-04-2018)
Por Padre Fernando Gioia, EP
www.reflexionando.org
Traduzido por Emílio Portugal Coutinho
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