A Santidade considerada através do prisma da estética
Bogotá (Quarta-feira, 29-02-2012, Gaudium Press) A santidade é uma configuração com a pessoa sublime de Jesus, segundo nos recorda o Papa na audiência geral de 13 de abril passado. A santidade “é uma união e uma configuração com Cristo, que funde suas raízes na graça batismal e no mistério pascal”, expressou o Pontífice na ocasião.
Santidade também pode ser definida como a prática da virtude em grau heróico. Por isso, a comprovação das virtudes heróicas é um dos processos existentes em todas as causas de beatificação.
Entretanto, São Tomás realiza uma afirmação sobre a virtude extrema que tem seu lado um tanto misterioso, e que não se vê muito comentada nos livros comuns de piedade ou espiritualidade.
Para São Tomás de Aquino, segundo expressado em ‘De Veritate’, “a última perfeição a que se pode chegar a alma consiste em reproduzir nela toda a ordem do universo e suas causas”, tal como recorda Monsenhor João Scognamiglio Clá Dias E.P., em sua magnífica obra “A Fidelidade ao Primeiro Olhar – Um périplo da apreenssão do Ser até a contemplação do Absoluto”.
Sem embargo: Como reproduz uma alma a ordem do universo? E, antes, qual é a ordem do universo?
Primeiro olhemos a afirmação do Santo Doutor da Igreja em todo seu contexto. Diz o Aquinate em ‘De Veritate’ (q. 2, a. 2) que as coisas são perfeitas enquanto tem o ser, mas são imperfeitas quando são comparadas com outros seres mais perfeitos. Uma pedrinha do rio é perfeita enquanto existe, mas é imperfeita se é colocada junto a uma grande esmeralda talhada. E todos os seres são imperfeitos quando são comparados com Deus, que é a Perfeição. Entretanto, o conjunto dos seres criados, a Criação, “é formada de seres imperfeitos, cuja soma resulta em um universo perfeito”, segundo a interpretação que faz Monsenhor João Clá desse texto de ‘De Veritate’.
O universo, a Criação em seu conjunto, é uma obra perfeita de Deus. Então quando São Tomás fala de “ordem do universo”, se refere a perfeição do conjunto dos seres criados considerados em sua unidade, em sua simetria, em seus processos, enfim, em toda a disposição estática e dinâmica na qual Deus os criou e colocou, e na que Ele é refletido de forma perfeita.
Bom, e como é que essa ordem pode ‘entrar’ na alma?
Primeiro digamos algo. É que entre os seres visíveis, o único que não está ‘tranquilo’ com o que é, é o homem. O homem quer sempre algo mais, tem sempre sede de outra coisa que não possui, busca constantemente algo novo para sua alma. Busca o Absoluto, anseia por Deus. E é justamente o homem, segundo afirma Monsenhor Clá, quem “enquanto criatura racional, pela contemplação da ordem do Universo, pode e deve resumir em si essa ordem e perfeição”, de acordo com a via que assinala São Tomás de Aquino:
“Para remediar essa imperfeição [do homem] de algum modo, se encontra outro tipo de perfeição nas coisas criadas. Ela consiste nisto: que a perfeição de uma coisa se encontre em outra. Esta é a perfeição do cognoscente, o conhecido se faz presente nele de algum modo. Por isso, como é dito em ‘De Anima III’, a alma é, de certo modo, todas as coisas, pois sua natureza é tal que pode conhecer todas as coisas.
Neste sentido é possível que a perfeição do universo exista em uma só coisa. Assim, a mais elevada perfeição alcançável por uma alma, de acordo com os filósofos, consiste em ter reproduzida nela toda a ordem do Universo e suas causas” (De Veritate, q. 2, a. 2).
Então, São Tomás convida a um exercício de conhecimento do universo, não a um mero treinamento de conhecimento conceitual, mas de todo o tipo de conhecimento, sensível, existencial, e intelectual também, um exercício de conhecimento completo que podemos resumir na palavra contemplação. Para ser super-santo tem que ser super-contemplativo, de toda a Ordem do universo, que assim ‘penetra’ na alma. As leis que se manifestam no universo, as leis de Deus, se fazem um com a alma contemplativa.
E é este um exercício não meramente natural mas também sobrenatural.
É o que afirmou Plinio Corrêa de Oliveira no que chamou seu Simpósio do Sagrado Coração: A Bondade resulta desse exercício contemplativo flexível –diferente de certos ‘reumatismos’ ‘monoprismáticos’ de algumas almas– que vê o grande e o admira e se expande em sua visão; vê o mediano e se congratula com aquela acolhida serena que o mediano dispensa; e vê o pequeno e se encanta com a delicadeza de um Deus que criou até o ínfimo, e no ínfimo também expressa sua finura, e lhe outorga também ao pequeno um lugar em seu universo.
E quando o homem admira desinteressado a união harmônica do grande, o mediano e o pequeno, aí sua alma exala um júbilo de exclamação, que diz: “Oh Deus!, como manifestação magnífica de sua Beleza, na beleza do conjunto dos seres, como sois bom ao criar o grande, o mediano e o pequeno, ao criar o conjunto, eu te amo no conjunto, e te amo na grandeza, na mediania e na pequenez”.
“Como é imponente a águia, como é simpática a gaivota, como é pitoresco e até terno um pintainho: como é harmonioso o ‘reino’ aviário”.
Aí o homem é bom.
Aí o homem é santo, na contemplação constante e admirativa de Deus na estética da Ordem do Universo.
Por Saúl Castiblanco.
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